Investindo Na Inovação

Com a Planificação Estratégica, África Está Posicionada para Despoletar o seu Potencial Científico

EDWARD A. DURELL, ENGENHEIRO PROFISSIONAL E CONSELHEIRO NA ÁREA DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIAS, NO COMANDO DOS ESTADOS UNIDOS PARA ÁFRICA

Inovações tecnológicas Importantes geralmente não aparecem do nada. Criam-se as condições para que elas existam através da planificação e do apoio. Pelo menos 25 países africanos possuem estratégias de ciência, tecnologia e inovação (STI, em Inglês). Contudo, as Academias Africanas de Ciências notaram que estas políticas, muitas vezes, centram-se apenas no desenvolvimento de negócios e industrial, e “os objectivos sociais e ambientais não são adequadamente integrados.” 

Hoje, os pontos fortes da pesquisa de África estão na agricultura, medicina tropical e doenças contagiosas, de acordo com um relatório de implementação de STI. Alargar o âmbito da pesquisa em investimento poderia ajudar a despoletar o vasto potencial científico de África. 

O continente está no meio de uma explosão juvenil histórica, com quase 60% da população abaixo dos 25 anos de idade. De acordo com o Inquérito de Juventude Africana de 2020, 78% dos jovens estão interessados em seguir uma carreira em tecnologia. Os gigantes mundiais, como a Microsoft e a Google, estão ansiosos em tirar vantagens destes talentos e fizeram muito investimento em África, recentemente. Um exame cuidadoso das pesquisas e do panorama de desenvolvimento de África pode ajudar a mostrar onde o investimento estratégico pode trazer os maiores ganhos. 

FINANCIANDO PESQUISA E DESENVOLVIMENTO

Uma forma para medir a disponibilidade de um país em comprometer recursos para a ciência e tecnologia é examinando as despesas na área de pesquisa e desenvolvimento. GERD é um valor calculado com recurso às despesas domésticas brutas na área de pesquisa e desenvolvimento como uma percentagem do produto interno bruto. A União Africana estabeleceu uma meta de 1% de GERD para os seus Estados-membros; como forma de comparação, o GERD das despesas dos Estados Unidos é de 2,7%. A cada cinco anos a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura publica um relatório extensivo fazendo o acompanhamento da ciência, tecnologia, inovação e governação. O relatório inclui uma riqueza de estatísticas; um dos exemplos é o GERD. 

Não existem dados disponíveis para todos os países africanos, mas a Tabela 1 apresenta os 15 principais países que declararam o seu GERD. Sob o ponto de vista de comunidades económicas regionais, o desempenho de GERD mais forte veio da União Árabe do Magrebe, composta por cinco membros. Três dos seus Estados-membros aparecem nos 10 primeiros lugares: Argélia, Marrocos e Tunísia.

As despesas são um indicador, mas o que dizer sobre as realizações em termos de tecnologias? Um parâmetro quantificável de saúde científica e tecnológica é utilizar solicitações de patentes como um indicador de inovações. Mais uma vez, como forma de comparação, o número de patentes por 1 milhão de habitantes para os Estados Unidos é de 129. A Tabela 2 ilustra as solicitações de patentes de residentes por 1 milhão de habitantes. Não existem dados disponíveis para todos os países, e alguns países utilizam a Organização Africana de Propriedade Intelectual como o seu departamento de patentes; os seus dados de solicitação não podem ser separados por países. Mais uma vez, existe um desempenho forte por parte da União Árabe do Magrebe, composta por cinco membros. Três deles estão entre os primeiros oito: Tunísia, Marrocos e Argélia.

Alguns países têm bom desempenho na solicitação de patentes per capita embora as despesas GERD estejam fora do primeiro terço. Cabo Verde, Etiópia, Gana, Madagáscar, Ilhas Maurícias, Namíbia e Tanzânia são todos eles exemplos destes países. Exames mais aprofundados demonstram que a maior parte destes países possui despesas públicas saudáveis na educação — em termos gerais, acima de 4% do produto interno bruto. Um desempenho impressionante foi o de Madagáscar, da Namíbia e da Tanzânia; cada um possui despesas no GERD e ensino público, mas ainda assim conseguiram ter resultados satisfatórios de solicitação de patentes.

Uma observação pode ser feita quanto à Tabela 2: as amplas despesas no ensino e no GERD aumentam a probabilidade de desempenho respeitável na solicitação de patentes. A metade superior dos desempenhos de patente com média acima de 5% nas despesas do ensino e 0,5% no GERD. Os desempenhos da metade inferior com média de 4% no ensino e menos de 0,4% no GERD; enquanto estas despesas tendem a baixar, assim será com as solicitações de patentes. Isso confirma a crença de que investir no ensino, na pesquisa e no desenvolvimento leva-nos à inovação.

As patentes e a propriedade intelectual são componentes-chave para um ambiente favorável à inovação. Eles protegem o conhecimento através do fortalecimento dos direitos de propriedade intelectual e regimes regulamentares a todos os níveis. Contudo, o relatório de implementação de STI identifica que a falta de operacionalização da Organização Pan-Africana de Propriedade Intelectual resultou em falta de actividade na área de gestão da propriedade intelectual e transferência de tecnologia. Premiar a inovação prepara o caminho para futuras descobertas. 

PERSPECTIVAS PROMISSORAS

Existem muitas razões para se ser optimista quanto ao futuro da inovação do continente. Um exemplo disso é a Iniciativa Próximo Einstein, do Instituto Africano de Ciências Matemáticas, sediado na Cidade do Cabo. A AIMS, fundada em 2003, é uma instituição que concede graduações, com centros em seis países africanos. A Iniciativa Próximo Einstein chegou a estar no programa TED Talk, em 2008, quando o físico sul-africano, Dr. Neil Turok, falou sobre um sonho de que o próximo Einstein seria africano. A iniciativa organiza um evento bienal, o Encontro Global do Fórum do Próximo Einstein, para potencializar a ciência para o desenvolvimento humano. O evento é motivado pela crença de que as contribuições de África para a comunidade científica global são de grande importância para o progresso global. A escolha de vencedores para o “Desafio da Invenção para a Inovação” é feita em cada Encontro Global; os finalistas são conhecidos como “sciencepreneurs.” Uma invenção recente é uma plataforma analítica de dados, originária do Ruanda, que utiliza dispositivos de fraca potência para determinar níveis óptimos de fermentação para a indústria do processamento do chá. Uma outra invenção é uma caixa frigorífica móvel, recarregável, possível de rastrear, concebida e fabricada na Nigéria, que possibilita que as empresas armazenem e transportem produtos sensíveis à temperatura. Tal caixa pode desempenhar um papel fundamental na logística de cadeia civil e militar de frios; em particular para produtos sensíveis à temperatura, tais como medicamentos e vacinas.

Biologistas moleculares do Centro Africano de Excelência
em Genomas de Doenças
Infecciosas analisam amostras de COVID-19, em Ede, Nigéria. AFP/GETTY IMAGES

Em alguns casos, as inovações são possibilitadas por iniciativas do governo. Um excelente exemplo é o Conselho para a Pesquisa Científica e Industrial da África do Sul (CSIR). A instituição de 75 anos de existência apoia pesquisas, no domínio do sector público e privado, que visam melhorar a competitividade da África do Sul no plano mundial. A maior instituição de pesquisa do seu tipo em África emprega mais de 2.000 pessoas e obtém a maior parte do seu financiamento através de direitos autorais de patentes e outros mecanismos gerados por si própria. 

Com o passar dos anos, descobertas fundamentais possibilitadas pelo CSIR incluem componentes para baterias de lítio, culturas geneticamente modificadas para suportar condições ambientais severas, pesquisas sobre células fotovoltaicas para energia solar e avanços na nanotecnologia. O CSIR também é um líder reconhecido a nível global em pesquisas na área de HIV/SIDA e tuberculose. 

OLHANDO PARA O ESPAÇO

Em 2016, a União Africana divulgou dois documentos importantes relacionados com o espaço: A Política do Espaço Africano e A Estratégia do Espaço Africano. A Estratégia tem quarto áreas de foco temático: observação da terra, navegação e posicionamento, comunicações via satélite, e ciências do espaço e astronomia. Os países africanos possuíam satélites em órbita muito antes de este documento ter sido publicado. Na verdade, 10 países possuem satélites: Argélia, Angola, Egipto, Etiópia, Gana, Quénia, Marrocos, Nigéria, Ruanda e África do Sul. A maior parte destes países ajudou a desenvolver satélites. Nenhum dos satélites foi lançado a partir do solo africano — ainda. O Gabão não possui um satélite; contudo, possui um centro de sensoriamento remoto, baseado na terra, fora da capital, Librevile. Este centro, conhecido por AGEOS (Agence Gabonaise d’Etudes et d’Observations Spatiales), opera uma grande antena que colecta imagens a partir de satélites e as dissemina para um amplo segmento de sectores: operadores do sector mineiro, de petróleos, de florestas e marinho. A localização do Gabão é fundamental; encontra-se no centro da bacia do Congo, que possui a segunda maior floresta tropical do mundo. O raio de cobertura do centro é de 2.800 quilómetros e cobre 17 países e partes de outros seis. A AGEOS também trabalha no desenvolvimento de uma estação meteorológica.

A África do Sul está a entrar em parceria com a Austrália para construir o projecto de radiotelescópio em série num raio de um quilómetro quadrado. Quando estiver concluído, irá fornecer aos astrónomos melhor informação sobre o espaço profundo em menos tempo do que outros telescópios. 

O CAMINHO PELA FRENTE

África é um continente em ascensão para capacidades científicas e tecnológicas, e existe uma abundância de oportunidades por explorar. O momento é adequado. Existem talentos. A oportunidade é quase que sem limites. O que é necessário agora é investimento em termos de ensino, instalações de pesquisa e apoio governamental. Com a mistura correcta, a próxima grande descoberta científica do Séc. XXI pode ocorrer em solo africano.  

Edward Durell, Engenheiro Profissional, é um especialista internacional de programas no Comando Dos Estados Unidos Para África. Um engenheiro de formação, ele lidera esforços de alcance para África no Gabinete de Ciências, Tecnologia e Inovação, fazendo a gestão de numerosos programas e iniciativas. Antes do seu cargo actual, ele foi responsável por gerir um programa da agência federal para o desenvolvimento e aplicação de especificações técnicas e padrões.

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