Milícias Étnicas do Níger Geram Ciclos Brutais de Violência

EQUIPA DA ADF
 

A ascensão de milícias étnicas nos últimos anos ameaça a região ocidental do Níger, dominada por conflitos, perto da zona da tríplice fronteira com o Burquina Faso e o Mali.

Dois grupos em particular, a garde nomade, um grupo de antigos rebeldes Tuaregues integrados nas forças nigerinas na região de Tahoua, e o Zarma zankai, um grupo de autodefesa que opera na região de Tillabéri, representam problemas de segurança significativos.

É o que afirma Delina Goxho, investigadora principal do departamento de África do Instituto Egmont, em Bruxelas, autora de um relatório sobre o assunto em Outubro.

Tanto o governo anterior ao golpe como a actual junta no poder confiaram nos grupos para combater as organizações extremistas ligadas ao grupo do Estado Islâmico (EI) e à organização afiliada à al-Qaeda Jama’at Nasr al-Islam wal Muslimin (JNIM). No entanto, as autoridades nigerinas tratam os grupos de forma diferente.

Os membros da garde nomade são vistos como combatentes experientes controlados pelo governo, enquanto os membros da zankai são considerados combatentes inexperientes das milícias que representam pouca ou nenhuma ameaça para o poder do Estado.

As sementes da garde nomade foram plantadas em 2021, quando os combatentes Tuaregues, armados com armas recolhidas na Líbia, regressaram às suas aldeias natais em Tahoua, onde o EI lança ataques frequentes.

“Cerca de metade dos combatentes não se preocupava muito com a integração [nas forças nigerinas]… só queriam proteger os seus e, nalguns casos, vingar-se da morte de membros da sua família,” uma pessoa próxima do grupo disse a Goxho.

As pessoas suspeitas pela garde nomade de terem liações com o Estado Islâmico no Grande Sahara são geralmente civis Peuhls, o que confere uma dimensão étnica às tensões regionais. A maior parte do trabalho actual da garde nomade consiste em persuadir as pessoas que vivem em aldeias perto do Mali a saírem quando há informação de um ataque terrorista iminente.

“No outro dia, pedimos às pessoas de Mihan que se aproximassem de Abala, deixassem as suas casas, pegassem nas suas famílias e nos seus animais e se aproximassem de um local onde os pudéssemos controlar, enquanto limpávamos a sua aldeia das infiltrações terroristas,” disse outra pessoa a Goxho.

Desde 2017, quando a violência transbordou do Burquina Faso e do Mali, a região de Tillabéri emergiu como o epicentro de ataques contra civis no país. De 2017 a 2023, 2.500 pessoas foram mortas por violência armada em Tillabéri, mais de metade do total nacional.

Em Tillabéri, os zankai não são controlados nem geridos pelo governo e o seu comportamento não é controlado.

A milícia foi formada depois de o EI ter matado um chefe de Zarma em 2019 por alegadamente se recusar a pagar o “zakat,” um imposto islâmico. Em retaliação pela criação do grupo, os insurgentes mataram, em 2020, mais de 100 civis, na sua maioria do grupo Zarma, na comunidade de Tondikiwindi.

Embora dificilmente reconhecidos pelas autoridades, os bem organizados zankai — cujos grupos incluem geralmente um presidente, um vice-presidente, um tesoureiro e um chefe militar — são respeitados nas comunidades que protegem. Devido à falta de controlo governamental, é impossível saber quantos combatentes zankai existem.

“Em suma, qualquer pessoa que tenha uma arma pode declarar a sua lealdade a um grupo de autodefesa, mas estes tendem a ter sempre alguma hierarquia, mesmo os pequenos grupos em pequenas aldeias,” disse um entrevistado a Goxho.

A falta de controlo sobre os zankai pode ter consequências imprevisíveis, como alimentar as tensões étnicas regionais, escreveu Goxho, fazendo eco de avisos anteriores de analistas do Grupo Internacional de Crise (ICG).

Os conflitos entre extremistas e grupos de autodefesa opõem, muitas vezes, as comunidades umas às outras. Os analistas do ICG escreveram num relatório de 2021 sobre a região de Tillabéri que esses confrontos poderiam inflamar as queixas locais, pôr em perigo a população civil e fornecer novos recrutas aos grupos terroristas.

A formação de milícias étnicas no Níger “parece já ter levado os jihadistas locais a atacar a população civil,” escrevem os analistas.

Goxho e o ICG observaram que a ascensão de milícias como a Dan Na Ambassagou no Mali e a Koglweogo e Voluntários para a Defesa da Pátria (VDP) no Burquina Faso — todas recrutando numa base étnica — conduziu a um ciclo brutal de assassinatos intercomunitários.

A Dan Na Ambassagou visa notoriamente as comunidades Dogon e os VDP estão frequentemente implicados em crimes contra as comunidades Fulani.

Goxho implorou ao governo nigerino que não subestime os zankai e invista mais recursos para colocar o grupo sob algum tipo de controlo estatal.

“Criar um programa que responsabilize os zankai pelas suas acções — e que possa apoiar uma futura profissionalização dessa milícia — permitiria um maior controlo por parte de Niamey,” escreveu Goxho.

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