Líder da Eritreia Assinala Três Décadas no Poder com Punho de Ferro

EQUIPA DA ADF

Poucos países são tão fortemente controlados por um homem como a Eritreia.

Tendo recentemente celebrado 30 anos de independência, a Eritreia nunca realizou eleições nacionais e só conheceu um chefe de Estado. Classificado como um dos países mais repressivos do mundo, limita severamente a liberdade de expressão e de religião e exige décadas de serviço militar aos seus cidadãos.

No seu centro está o Presidente Isaias Afwerki, de 77 anos, antigo líder da guerrilha que lutou pela independência do país. Os críticos dizem que ele criou um “Estado pária.”

“O que a Coreia do Norte significa para o mundo… É o que a Eritreia significa para África,” disse à DW.com o analista de segurança ganês, Fidel Amakye Owusu. “É recluso, secreto e isolado.”

Após a independência da Etiópia – oficializada através de um referendo em 1993 – a Eritreia elaborou uma Constituição que protegia as liberdades civis e consagrava a democracia. Também tinha o início de uma imprensa livre e de uma sociedade civil dinâmica. Os membros da sua diáspora global regressaram aos milhares para ajudar a construir a nação.

Filmon Debru, actualmente com 37 anos, era uma criança na altura e descreveu o ambiente como de “euforia.”

“Houve uma verdadeira felicidade,” disse à Agence France-Presse. “Tudo parecia estar a correr pelo melhor.”

Essa esperança começou a desvanecer-se em 1998, quando o país voltou à guerra com a vizinha Etiópia. Ao longo de vários anos, Isaias reforçou o controlo, prendendo críticos e jornalistas, sem julgamento. A Constituição foi abandonada. Desenvolveu-se um sistema de serviço militar em que os jovens são recrutados para as forças armadas aos 17 anos e aí permanecem até, pelo menos, aos 40 anos, numa política que as Nações Unidas apelidaram de “escravatura.”

“Isaias varreu o projecto da Constituição e a sua vontade sempre inconstante tornou-se política nacional,” escreveu o académico sobre o Corno de África, Yohannes Woldemariam, num ensaio para a London School of Economics.

Ao longo dos anos, a Eritreia foi-se retirando cada vez mais para o seu interior. O seu sistema repressivo faz com que seja um dos principais produtores de refugiados do mundo. Muitos dos que fogem do país colocam as suas vidas nas mãos de traficantes brutais e embarcam em barcos inseguros e apinhados para atravessar o Mar Mediterrâneo. A política externa agressiva e militarizada da Eritreia tem resultado em confrontos com cada um dos seus vizinhos, incluindo, mais recentemente, o seu envolvimento na guerra civil da Etiópia, onde as tropas eritreias foram acusadas de crimes de guerra.

A nível interno, Isaias tem um poder absoluto. Não existe parlamento nem oposição interna. Segundo os analistas, as directrizes de Isaias são aplicadas por generais do exército que também controlam zonas do país e podem beneficiar de interesses comerciais lucrativos. Não existe um plano de sucessão e não está claro quem assumirá o poder depois de Isaias.

“[A Eritreia] é dirigida por um homem governado pelos seus próprios interesses, para quem os eritreus se tornaram um meio para atingir um fim: alargar o seu poder e influência,” escreveu Woldemariam.

Com poucos aliados na cena internacional, Isaias procurou recentemente aprofundar antigas alianças com a China e a Rússia. Em Maio, fez uma visita de Estado de quatro dias à China e foi recebido pelo Presidente Xi Jinping, no Grande Salão de Pequim, onde Xi brindou aos “profundos laços de amizade” entre os dois países. No dia 31 de Maio, encontrou-se com o Presidente Vladimir Putin na sua primeira visita de Estado à Rússia. A Eritreia foi um dos cinco países que votaram contra uma resolução da ONU que apela à retirada da Rússia da Ucrânia.

Owusu disse que Isaias gravita em torno de outros líderes autoritários que não o pressionam sobre o seu historial em matéria de direitos humanos nem apelam a reformas democráticas. “Esses serão os seus aliados naturais,” disse Owusu à DW.com. “Pode identificar-se com Putin, que deixou o cargo e regressou e, num futuro próximo, é provável que esteja no comando da Rússia.”

Muitos eritreus que vivem actualmente no estrangeiro perguntam-se como é que um país que começou com tantas promessas foi entregue ao controlo de um homem.

Bereket Habte Selassie, um académico de direito que presidiu à comissão que redigiu a Constituição da Eritreia, disse que ainda não sabe como é que tudo correu mal. “Isaias deixou claro que continuará a ser presidente enquanto puder até ser forçado a sair,” escreveu em 2020. “Uma pergunta que toda a gente faz — e para a qual não houve até agora uma resposta clara e inequívoca — é: Como é que Isaias conseguiu convencer toda a gente a deixá-lo fazer o que quisesse durante todos estes anos?”

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