‘Coberto de Sangue’: Sobreviventes Descrevem o Massacre no Burquina Faso

EQUIPA DA ADF
 

O ataque brutal durou cerca de seis horas.

Quando terminou, pelo menos 156 pessoas tinham morrido. Algumas das vítimas tinham os olhos vendados, outras eram bebés com menos de um mês, mortos às costas das mães.

O ataque de finais de Abril em Karma, uma aldeia na província de Yatenga, no norte do Burquina Faso, foi perpetrado por mais de 100 pessoas vestidas com uniformes militares burquinabês, que se deslocavam em motorizadas, camionetas e carros blindados.

“Estávamos a caminho do poço com o meu burro quando os vimos a vir na nossa direcção,” Belem Lassane, uma criança sobrevivente, disse à Al-Jazeera. “Escondemo-nos nas nossas casas. O nosso pai saiu. Tiraram-nos as nossas identificações e começaram a disparar contra eles, matando-os a todos. Depois destruíram as casas e mataram as nossas mães. Eu estava escondido debaixo de pilhas de corpos enquanto eles continuavam a disparar contra nós.”

No mesmo dia, os assaltantes mataram mais 11 pessoas em aldeias vizinhas, segundo a organização burquinabê de defesa dos direitos humanos Colectivo Contra a Impunidade e Estigmatização das Comunidades. As zonas em torno de Karma são os principais locais de extracção mineira ilegal.

Os sobreviventes do ataque de Karma disseram que os soldados aparentemente burquinabês chegaram por volta das 7h30 da manhã. Andaram de porta em porta a revistar e a pilhar casas. Reuniram os aldeões e abriram fogo, mesmo sobre aqueles que imploravam pela sua vida.

“Os soldados disseram-nos para nos sentarmos,” disse um aldeão de 40 anos à Human Rights Watch (HRW). “No meu grupo éramos mais de 30. De repente, começaram a disparar.”

O homem disse que fingiu de morto para salvar a sua vida.

“Fiquei deitado de barriga para baixo depois do primeiro tiro. Fiquei coberto de sangue dos corpos dos outros,” disse o homem. “Fiquei quieto, aterrorizado, até os soldados se irem embora. Dois deles voltaram para acabar com os que se estavam a mexer e ainda estavam vivos.”

O massacre ocorreu uma semana depois de seis soldados e 34 Voluntários para a Defesa da Pátria, ou VDP, terem sido mortos num ataque de supostos terroristas, perto da aldeia de Aorema, a cerca de 40 quilómetros de Karma, perto da fronteira com o Mali. As forças de segurança do país lutam há anos para reprimir uma rebelião liderada por rebeldes ligados à al-Qaeda e ao grupo do Estado Islâmico.

Uma testemunha disse à HRW que viu membros da unidade de forças especiais do Batalhão de Intervenção Rápida 3 do país dirigirem-se para Karma naquela manhã. A unidade efectua normalmente operações antiterroristas contraos grupos rebeldes.

“Estas pessoas estavam vestidas com uniformes pretos, outras com fardas de combate esverdeadas,” disse um sobrevivente à Agence France-Presse (AFP). “Alguns tinham capacetes, outros usavam balaclavas, e estavam em várias carrinhas e motas.”

As matanças ilegais de civis por organizações extremistas violentas e pelas forças de segurança aumentaram desde 2022, ano em que o país sofreu dois golpes militares.

No início de Abril, o sistema de justiça militar do Burquina Faso anunciou que iria conduzir uma investigação sobre as mortes, em Fevereiro, de vários civis durante confrontos com soldados perto da cidade de Dori, no norte do país.

As testemunhas disseram à AFP que pelo menos 12 pessoas morreram depois de os soldados terem aberto fogo com armas automáticas. Os residentes afirmaram ainda que o ataque foi uma “expedição punitiva” levada a cabo pelos soldados após o assassinato de um dos seus membros.

O Burquina Faso tem sido apanhado em ondas de violência terrorista que se espalharam a partir do Mali desde 2012. Os combates já mataram mais de 10.000 pessoas e deslocaram cerca de 2 milhões.

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