Relatório: Grupo Wagner Rapta Crianças para Trabalhar nas Minas da RCA
EQUIPA DA ADF
O filho de Christelle Youmbi, de 11 anos de idade, tomava banho atrás da sua casa, na comunidade de Boko-Boudeye, na República Centro-Africana, quando os mercenários do Grupo Wagner pegaram o rapaz sem roupa e o levaram com eles enquanto ele tentava escapar.
“Eu implorei para que me dissessem para onde estavam a levar o meu filho, mas eles recusaram-se de dizer qualquer coisa,” disse Youmbi no site de notícias The Daily Beast.
Ao todo, os mercenários do Grupo Wagner levaram sete rapazes com idades compreendidas entre 10 e 13 anos naquela comunidade naquele dia, de acordo com os relatos. Eles disseram a Youmbi que estavam a levar os rapazes da comunidade para mantê-los seguros em antecipação de um ataque que se avizinhava.
Os observadores afirmam que é provável que mais rapazes tenham sido colocados para trabalhar nas minas de ouro e de diamante operadas pelos afiliados do Grupo Wagner naquele país.
O Grupo Wagner está a expandir as suas operações em toda a África, centrando-se em países que têm dois factores em comum: líderes autoritários que procuram permanecer no poder; e recursos prontamente acessíveis como ouro, petróleo e diamantes, que podem ser vendidos rapidamente em troca de numerário.
Desde a chegada na República Centro-Africana, em 2018, o Grupo Wagner goza de liberdade de circulação naquele país. O Grupo Wagner foi acusado de atacar aldeias, matar mineiros artesanais e violar raparigas e mulheres jovens e ainda cometer outras violações de direitos humanos — tudo isso sob pretexto de estar a ajudar o governo a combater os grupos rebeldes.
Em 2021, os combatentes do Grupo Wagner fizeram parte de um assalto contra uma mesquita em Bambari, matando 21 pessoas.
Youmbi e seus vizinhos de Boko-Boudeye fugiram da sua comunidade de origem, em Bouar, depois de conflitos terem irrompido naquele ponto, no início de 2021, entre os rebeldes e as forças governamentais. O marido de Youmbi desapareceu durante os conflitos.
“Estávamos bem estabelecidos em Boko-Boudeye até que os soldados brancos vieram e levaram os nossos filhos,” disse Youmbi.
Em Janeiro deste ano, os combatentes do Grupo Wagner, acompanhados pelo pessoal do exército da RCA, mataram pelo menos 70 pessoas nas comunidades mineiras de Aïgbado e Yanga antes de incendiarem algumas das casas naquele ponto.
Os combatentes do Grupo Wagner mataram dezenas de mineiros entre Março e Maio e cerca de 100 pessoas em Julho, na região de Andahar, numa altura em que o grupo procura controlar as minas do país, de acordo com os relatos.
“Os mineiros que trabalharam na região de Andahar foram mortos ou obrigados a fugir,” mineiro artesanal, Patrice, disse ao The Daily Beast. “Muitos encontram-se desaparecidos.”
Em alguns casos, os mineiros estrangeiros regressaram para as suas casas no Chade, Níger ou no Sudão, onde o Grupo Wagner também possui operações de mineração do ouro, num acordo com a junta militar que controla aquele país.
Enquanto o número de mineiros adultos na RCA reduz, os mercenários do Grupo Wagner começam a raptar crianças para os substituir nas minas a céu aberto, Silvestre, um mineiro artesanal, de 27 anos de idade, disse ao The Daily Beast. A publicação identificou mineiros pelos seus primeiros nomes apenas para proteger as suas identidades.
Silvestre disse que contou cerca de 20 crianças que trabalhavam numa mina de ouro controlada pelos russos, próximo de Bambari.
Os operadores das minas preferem as crianças, porque elas são mais susceptíveis de seguir os comandos e menos propensos a resistir quando trabalham com pás e peneiras para encontrar diamantes ou extrair ouro, outras testemunhas disseram ao The Daily Beast.
“As crianças fazem tudo quanto são ditas para fazer e não são ambiciosas,” disse um chefe local da comunidade mineira de Kouki. Acrescentou que os mineiros adultos trabalham sob controlo russo apenas quando são obrigados a fazê-lo.
“E se isso tivesse de acontecer,” disse, “um dia esses mineiros encontrariam uma maneira de revoltar-se contra eles.”
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