Cocaína e Golpes de Estado Assolam Guiné-Bissau

EQUIPA DA ADF

Desde a conquista da independência, em 1974, a Guiné-Bissau sofreu pelo menos nove tentativas diferentes de golpe de Estado.

O enredo mais recente, em Fevereiro, foi semelhante a outros, na medida em que envolveu membros das forças armadas ligados ao infame comércio de drogas do país.

Homens fortemente armados cercaram o palácio presidencial enquanto o Presidente Umaro Sissoco Embaló realizava uma reunião do Conselho de Ministros. Sete membros da sua equipa de segurança, três funcionários do governo e um insurgente foram mortos na batalha de cinco horas que se seguiu.

Mais tarde, Embaló disse que o “ataque falhado contra a democracia estava bem preparado e organizado e poderia também estar relacionado com pessoas envolvidas no tráfico de drogas.”

No dia seguinte, numa conferência de imprensa, afirmou que a tentativa de golpe foi uma retaliação pela posição que adoptou de reprimir o comércio de drogas.

“Ao comprometer-me com a luta contra a corrupção e contra o narcotráfico,” disse o presidente, “penso que assinei a minha sentença de morte.”

Não seria surpreendente se os narcóticos tivessem desempenhado um papel no ataque, num país que se tornou um ponto de passagem conhecido para as drogas traficadas a partir da América Latina.

As Nações Unidas descreveram a Guiné-Bissau como um “narcoestado” onde redes criminosas actuando no seio do governo têm vindo a financiar políticos para proteger o comércio ilícito de drogas.

Episódios violentos relacionados com droga têm vindo a entrelaçar-se com assuntos políticos ao longo da história do país.

Pensa-se que o assassinato do Presidente João Bernardo Vieira, em 2009, por membros das forças armadas esteja ligado a redes de tráfico. Seguiu-se o “golpe da cocaína” de 2012, quando oficiais do exército tomaram o controlo do governo e do comércio de drogas.

Quando Embaló ganhou as eleições, em 2019, prometeu que assumiria uma atitude de “tolerância zero” em relação ao tráfico de droga.

“Alguns dos que estavam anteriormente envolvidos parecem ter regressado,” disse à BBC Lucia Bird, da Iniciativa Global contra o Crime Organizado Transnacional (GI-TOC, sigla em inglês).

Por ordem de Embaló, a polícia reforçou o combate ao tráfico de drogas, mas tem sido difícil alcançar resultados.

O analista Henok Gabisa culpa os cartéis da droga pela “destruição” do país.

“Uma batalha feroz está a ser travada no seio das elites políticas da Guiné-Bissau para controlar o poder político,” disse à Rádio e Televisão Turca.

“Os traficantes de droga da América Latina podem ter escolhido a Guiné-Bissau devido à sua instabilidade política e ao fraco ou inexistente controlo da imigração na costa.”

A ONU estima que 27% da cocaína consumida na Europa passa pela África Ocidental.

Só em 2019, em duas operações, foram apreendidas quase 3 toneladas de cocaína na Guiné-Bissau. O governo revelou que a maior das duas apreensões, 1,8 toneladas, estava destinada a terroristas no Sahel, que a vendem para financiar as suas operações.

“O tráfico de drogas tem um impacto não só sobre o Estado de Direito, minando as instituições encarregues da aplicação da lei no país, mas também tem um impacto na própria população, a qual se torna cada vez mais habituada e viciada em droga,” afirmou a Chefe de Pesquisa e Análise do Escritório das Nações Unidas contra a Droga e o Crime (UNODC), Angela Me, num vídeo.

O UNODC está a trabalhar com a Guiné-Bissau e outros governos da região para melhorar a formação em matéria de aplicação da lei, bem como as políticas legislativas e judiciais em torno do tráfico de droga e do crime organizado.

Num relatório recente da GI-TOC intitulado “Política de Cocaína na África Ocidental: As redes de protecção da Guiné-Bissau”, Bird conclui que “estão em curso mudanças profundas.”

Os governos europeus e as organizações internacionais estão cada vez mais envolvidos. A relação das elites do país com a sociedade civil está a melhorar.

Mas, mais importante ainda, o equilíbrio de poder entre o governo e os militares está a mudar.

“Estas lutas pelo poder podem estar a perturbar as estruturas de longa data de protecção da cocaína do país de uma forma sem precedentes,” escreveu ela.

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