EQUIPA DA ADF
Numa conferência de imprensa no mês de Janeiro, a Zâmbia anunciou que iria ser um dos primeiros países a oferecer rede de telefonia móvel 5G como parte de um projecto-piloto.
A tecnologia, que significa “quinta geração de rede de telefonia móvel,” promete ligações rápidas e baixa latência de modo que os usuários possam trocar informações e baixar dados em alta velocidade. Isso faz parte de um projecto da gigante de telecomunicações chinesa, Huawei, em parceria com a operadora sul-africana MTN.
“Irá transformar a forma como vivemos e trabalhamos e irá oferecer novas e animadoras oportunidades para os empreendedores e os jovens do nosso país,” afirmou o ministro zambiano de Ciência e Tecnologia, Felix Mutati, durante o evento.
E embora a Huawei já seja líder na tecnologia de telefonia móvel no continente, tendo fabricado 70% das estações de base 4G, a Zâmbia demonstra o quão tensa a parceria pode ser. Em 2019, a empresa foi o centro de um escândalo quando foi divulgado que os técnicos da Huawei envolvidos na unidade de vigilância cibernética da Zâmbia estavam a interceptar comunicações criptografadas de figuras políticas da oposição e a utilizar dados de telemóveis para rastrear e apreendê-los.
“Técnicos da central eléctrica ajudaram pessoalmente, em pelo menos dois casos, governantes africanos a espiar os seus oponentes políticos,” noticiou o Lusaka Times.
Por volta da mesma altura, a Huawei alegadamente ajudou as autoridades ugandesas a rastrearem e a apreenderem a figura da oposição, Bobi Wine. No Burundi, equipamento da Huawei foi utilizado para bloquear o site da internet de canais de notícias que criticavam o governo.
Em 2020, a empresa estava no meio de um escândalo de proporções globais quando se descobriu que a rede construída pela Huawei, na sede da União Africana em Adis Abeba, Etiópia, estava a fazer cópias de segurança e a enviar informação confidencial do governo para servidores que se encontravam em Shangai.
Os incidentes estão a fazer com que os críticos alertem que, quando se lida com a Huawei, as redes de telefonia móvel podem acarretar custos escondidos: vigilância e perda de autonomia.
“A questão da interferência digital estrangeira é um fenómeno novo que muitos … não compreendem muito bem, porque a esfera digital é algo que não é tangível,” Arthur Gwagwa, especialista em matéria de inteligência artificial no Instituto de Ética, da Universidade de Utrecht, disse à Deutsche Welle (DW). Algumas das vulnerabilidades no equipamento chinês são intencionais, são introduzidos para efeitos maliciosos.”
A Huawei veio pela primeira vez para África em 1998 com um acordo no Quénia e cresceu exponencialmente desde então com operações em 40 países. Para além de redes de telefonia móvel, a empresa é líder em sistemas de vigilância e de reconhecimento facial. A Huawei e outras empresas chinesas construíram sistemas de tecnologias de informação em pelo menos 186 edifícios governamentais em África, incluindo palácios presidenciais, ministérios de defesa e edifícios do parlamento.
Mas os países estão preocupados com o facto de que as ligações próximas da Huawei com o Partido Comunista Chinês e as suas obrigações legais de apoiar a recolha de inteligência da China e os seus objectivos políticos estrangeiros. Uma Lei de Inteligência Nacional de 2017 exige que todas as empresas e cidadãos devem “apoiar, ajudar e cooperar com o trabalho de inteligência do Estado.”
Gwagwa disse que as suas obrigações de ajudar podem significar a instalação intencional de brechas de segurança designadas “backdoors” nos sistemas para facilitar os invasores e o envio de informações para o governo chinês. O seu equipamento, disse, “permite que haja vulnerabilidades a ataques cibernéticos para espionagem militar e industrial,” Gwagwa disse à DW.
A recentemente divulgada tecnologia 5G ainda se encontra muito distante para a maior parte do continente africano. Apenas cerca de um terço dos utilizadores das telecomunicações na África Subsaariana têm acesso à banda larga 4G. Até 2025, a penetração da rede 5G irá alcançar apenas cerca de 3% do continente, de acordo com uma estimativa de um grupo da indústria.
Mas os especialistas em matéria de tecnologia afirmam que conceder muito poder a um fornecedor é perigoso. Se a Huawei controla a rede 5G de um país, ela possui o poder de desligá-la ou introduzir canais escondidos para roubar informações. “Isso dá o controlo sobre infra-estruturas de informação de grande importância a um poder externo que pode teoricamente desligar essa infra-estrutura ou introduzir façanhas difíceis de detectar assim como outras vulnerabilidades pela cadeia de fornecimento,” escreveram os investigadores do Centro de Estudos Estratégicos de África e Noëlle van der Waag-Cowling, da Universidade de Stellenbosch, África do Sul.
Para evitar esta situação, alguns apelaram os países africanos a trabalhar com um grupo diversificado de fornecedores enquanto outros recomendaram que se encontrassem soluções internas. “Este provavelmente seja o tempo de África pensar na hipótese de desenvolver as suas próprias tecnologias relevantes para o seu mercado em vez de permanecer como consumidor passivo,” Harriet Kariuki, um especialista em matérias sino-africanas e co-fundador da Afrijob, que ajuda empresas em fase de arranque, disse à BBC. “Eu quero ver os países africanos se unam para responder à pressão.