EQUIPA DA ADF
Um estudo dos agregados familiares em África descobriu que mais de metade dos 1,3 bilhões de residentes não têm condições para prevenir a propagação da COVID-19 nas suas casas.
A pesquisa feita pelos pesquisadores da Universidade de Bristol, do Reino Unido, foi publicada em Julho. Os pesquisadores escreveram o seu relatório com base nos inquéritos dos agregados familiares realizados na última década, representando aproximadamente 3,5 milhões de africanos.
O estudo analisou a percentagem dos residentes cujas casas que tinham água para a lavagem das mãos, boa ventilação e baixa densidade residencial — condições que os ajudariam a evitar a infecção pela COVID-19 através de métodos de intervenção não farmacêuticos (NPI).
Desde o começo da pandemia da COVID-19, no início de 2020, os especialistas em matérias de saúde pública da Organização Mundial de Saúde e do Centro Africano de Controlo e Prevenção de Doenças (Africa CDC) promoveram técnicas de NPI como as máscaras, a lavagem das mãos e o distanciamento social como formas simples e eficazes para interromper a propagação da COVID-19.
As pessoas rapidamente adoptaram esses métodos no início da pandemia, mas a fadiga fez com que alguns deixassem de praticá-los. O Africa CDC e a empresa pan-africana de telecomunicações, MTN, recentemente lançaram uma campanha de relações públicas focalizada para a renovação da dedicação do público em relação ao uso da máscara e outros métodos NPI para reduzir a propagação da altamente contagiosa variante Delta da COVID-19.
“Se oferecermos ao vírus a possibilidade de propagar-se, ele irá propagar-se. Que não haja dúvidas,” Director do Africa CDC, Dr. John Nkengasong, disse durante uma recente conferência de imprensa.
O vírus que causa a COVID-19 viaja em gotículas microscópicas expelidas quando as pessoas tossem, expiram ou respiram fundo. Embora as máscaras impeçam que a maior parte destas partículas saia, os espaços pequenos e com pouca ventilação permitem que o vírus se propague. As pessoas podem transferir o vírus caso não mantenham as mãos limpas.
Para cerca de 900 milhões de africanos, evitar a COVID-19 é extremamente difícil, especialmente quando os confinamentos obrigatórios os forçaram a ficar abrigados em casa, de acordo com os pesquisadores.
“Centenas de milhares de pessoas em toda a África simplesmente não têm meios para implementar os métodos NPIs com vista prevenir a transmissão da SARS-CoV-2,” escreveram os autores do relatório.
O surto da pandemia levou a um aumento do fabrico de máscaras faciais de tecido, da instalação de estações comunitárias de lavagem das mãos e da mudança de actividades presenciais, como escola e igreja, para plataformas online.
Contudo, estes esforços fizeram pouco para alterar as condições das casas de milhares de pessoas que vivem em agregados com um grande número de pessoas de múltiplas gerações que não possuem canalização e refrigeração internas. De acordo com o relatório:
- Mais de 718 milhões de africanos — 54% da população — vive em agregados familiares com seis ou mais pessoas e cerca de 40% destes dormem no mesmo quarto com três ou mais pessoas. Estas duas situações fazem com que seja difícil aplicar os métodos NPIs, afirmam os pesquisadores.
- Mais de 70% dos agregados familiares não tinham acesso à água em casa — que varia de uma percentagem baixa de 0,6% nas Maurícias para uma percentagem elevada de 93% na República Centro-Africana. Os pesquisadores consideraram a falta de água no local como um obstáculo para a lavagem das mãos e outros métodos sanitários para evitar a propagação da COVID-19.
- Aproximadamente 80% dos agregados familiares inquiridos não tinham geleira, 45% partilhavam as instalações sanitárias com outros agregados familiares e 60% não tinham a sua própria cozinha — todos esses são indicadores de que o agregado familiar era incapaz de estar efectivamente numa quarentena, para evitar a propagação do vírus. Os países de toda a região do Sahel e a República Centro-Africana tendem a classificar-se nas mais elevadas posições destes indicadores.
Dadas aquelas condições, “as políticas de distanciamento físico — tais como os confinamentos obrigatórios — que dependem de pessoas permanecerem em suas casas por períodos prolongados de tempo, são menos prováveis de serem viáveis ou eficazes,” escreveram os autores.
Os pesquisadores estimam que cerca de 246 milhões de africanos vivem em agregados familiares de múltiplas gerações, com pelo menos uma pessoa de 60 ou mais anos de idade. As pessoas com 60 ou mais anos de idade estão em maior risco de morrer de COVID-19. Uma falta de opções de métodos NPIs faz com que seja mais provável que as crianças e outros membros da família transmitam o vírus aos membros mais velhos.
Os autores do estudo observaram que a prática de métodos NPIs em casa constitui apenas uma parte do desafio para as pessoas que procuram prevenir a propagação da COVID-19. Existem muitos outros desafios fora de casa que os pesquisadores não puderam quantificar, tais como visitar mercados superlotados para trabalhar e fazer compras e transportar crianças ou adultos para a escola e para o serviço.
Os resultados, escreveram os autores, aumentam a urgência de “abordar as condições subjacentes da pobreza que colocam as populações num risco crescente de morbidade e mortalidade por surto de vírus respiratórios e pandemias.”