EQUIPA DA ADF
Quando a pandemia da COVID-19 se propagou para o Malawi, no início de Abril de 2020, o país conhecido como “o coração quente de África”, pela simpatia dos seus cidadãos, enfrentou uma potencial crise. A doença respiratória que se propaga rapidamente podia facilmente dominar o país de baixa renda, de mais de 20 milhões de habitantes.
“A COVID-19 podia ter um número desastrosamente elevado de vítimas no Malawi,” afirmou Maria José Torres Macho, coordenadora residente das Nações Unidas, no Malawi. “Mesmo um número razoavelmente baixo de casos podia colapsar o sistema de saúde, causar carência de produtos alimentares e reverter o caminho de progressos em que o país esteve nos últimos anos.”
Até princípios de 2021, o Malawi tinha registado 7.110 casos de COVID-19 e 199 mortes. Embora o Malawi e os seus vizinhos provavelmente tenham de lutar com a pandemia durante os próximos meses, o exército do país, denominado Forças de Defesa do Malawi (FDM), demonstrou que está pronto e disposto para ajudar os civis a reduzirem os efeitos do vírus através da garantia de assistência a vários níveis.
“Até agora, as FDM gozam de uma enorme confiança e apoio do público, não apenas por causa da ajuda logística que têm fornecido à Equipa Nacional de Resposta à COVID-19, mas também por causa da forma profissional com que tem lidado com as recentes questões de segurança do público em geral,” afirmou o Capitão Wilned Kalizgamangwere Chawinga, do Gabinete de Informação Pública das FDM.
Quando se trata de doenças contagiosas como a COVID-19, os médicos, os enfermeiros e as entidades de saúde pública são os que lutam na linha da frente. Eles usam equipamento de protecção individual e arriscam as suas vidas para salvar os pacientes dos efeitos precários e, muitas vezes, mortais do novo vírus.
Geralmente, as forças armadas e de segurança nacionais possuem um mandato diferente. São encarregues de proteger a soberania e as fronteiras nacionais. Mas podem desempenhar um papel vital na luta contra a COVID-19 e outros surtos de doenças.
Alguma ajuda vem na forma de logística, tal como transporte e distribuição de equipamento médico. Noutras alturas, as forças de segurança nacional protegem o pessoal de saúde, que, muitas vezes, enfrenta o perigo em condições desgastantes e tensas da pandemia.
Independentemente da ajuda prestada, os soldados e os oficiais de segurança em todo o continente — do Malawi ao Gana, do Quénia ao Lesotho — estão a fazer a sua parte para ajudar as autoridades de saúde civis a erradicarem a COVID-19.
FRONTEIRAS E LOGÍSTICA
Em tempos de paz, os exércitos africanos preocupam-se primariamente com a segurança das fronteiras nacionais e treinamento para destacamentos e missões de manutenção da paz. Numa situação de crise, como a da pandemia da COVID-19, as fronteiras tornam-se muito mais cruciais. Nalgumas regiões, as travessias informais são frequentes e rotineiras. A possibilidade de tais travessias trazerem novos casos do vírus faz com que a necessidade de agentes da lei e de supervisão seja vital.
Possivelmente, em nenhum lugar de África, isso foi tão importante do que em Lesotho, um pequeno reino sem saída para o mar, cercado pelo território sul-africano. A África do Sul registou o maior número de casos de COVID-19 no continente.
Muitos trabalhadores da classe operária vivem no Lesotho e trabalham na África do Sul, mas não possuem passaportes oficiais. Quando a África do Sul decretou um confinamento obrigatório, esses trabalhadores regressaram ao Lesotho através de vários pontos da sua conveniência, disse o Capitão Nolukhanyo Ndleleni, das Forças de Defesa do Lesotho (LDF).
Lesotho foi o último país do continente a registar um caso de COVID-19, tendo-o feito no dia 13 de Maio de 2020, meses depois de o vírus ter-se infiltrado noutros países africanos. O primeiro caso do Lesotho, que se acredita que tenha originado do Médio Oriente, foi detectado cerca de uma semana depois de o país ter começado a aliviar as medidas iniciais de confinamento obrigatório que tinham começado no final de Março.
As LDF começaram a apoiar os esforços civis na fronteira, no dia 1 de Abril de 2020, através da Operação Salvar Vidas, disse Ndleleni à ADF via e-mail. A operação contínua tem duas fases. Na primeira, os soldados faziam a patrulha das fronteiras para garantir que qualquer pessoa que entrasse no país fosse examinada e testada. Também ajudavam a fazer cumprir o confinamento obrigatório inicial do governo.
A fase dois começou depois que os casos de COVID-19 foram confirmados e depois que o confinamento terminou. Os soldados ajudaram a garantir que os civis aderissem às regras do distanciamento social, uso de máscaras e número máximo de pessoas em aglomerados. Também ajudaram com o rastreamento de contactos à medida que os casos foram aumentando.
“As LDF foram destacadas para estarem junto às fronteiras para prevenir travessias ilegais e para rastrearem e direccionarem todos aqueles que entrassem no país para estabelecer centros de saúde para testagem e quarentena,” KV Khoabane, jurista das LDF, disse à ADF via e-mail. “Apenas as LDF podiam ter cumprido com esta tarefa visto que possuíam o volume de forças que estava prontamente disponível e o Serviço Médico das nossas LDF foi capaz de dar-lhes informação ou orientação suficientes sobre como combater a pandemia.”
Este trabalho coloca o pessoal das LDF em contacto próximo com os civis basotho, que ajudaram a manter os soldados informados sobre travessias não autorizadas das fronteiras. Os soldados depois reuniam as pessoas e as transportavam para os centros de saúde para serem submetidas a testes e quarentena. “Isto beneficiou muito as LDF e os seus soldados, uma vez que foi uma das raras oportunidades onde os soldados e os civis tiveram de trabalhar juntos para lutarem contra um inimigo comum,” disse Khoabane. “Melhorou as relações entre militares e civis e ajudou os soldados a oferecerem à sociedade a melhor parte das Forças de Defesa.”
Os soldados das FDM também apoiaram as autoridades civis de várias formas, possivelmente a mais notável foi a oferta de apoio logístico de transporte. Chawinga disse à ADF que as FDM apoiam os socorristas civis através de transporte de malawianos afectados pela COVID-19 para instalações de testagens e quarentena no país. Isto inclui aqueles que chegaram por via aérea provenientes de outros lugares para o Aeroporto Internacional Kamuzu, que são posteriormente transportados em camiões com capacidade maior a favor da Equipa Nacional de Resposta à COVID.
As FDM também trabalharam lado a lado com o Serviço de Polícia do Malawi e com o Departamento de Imigração e Cidadania, na Operação Pewa. Nessa operação, as tropas foram destacadas ao longo das fronteiras do Malawi para controlarem as entradas e sensibilizarem sobre a prevenção da COVID-19.
Ter soldados a trabalharem em projectos de saúde pública não apenas ajudou a melhorar o ponto de vista do público sobre o seu exército. Os soldados também se beneficiaram. “Durante estas operações, os soldados desenvolvem um sentido de convicção, experiência, confiança e patriotismo,” disse Chawinga. “Esta confiança pessoal e experiência estão a criar carreiras na área de saúde para os soldados.”
Os praticantes da medicina nas FDM também estiveram ocupados com a formação e a preparação de tropas sobre como evitar a infecção pela COVID-19 e como interagir de forma segura com os pacientes da COVID-19, incluindo práticas correctas de higiene, distanciamento social e uso de máscaras.
SEGURANÇA E APOIO CÍVICO
Não nos surpreende o facto de que o surto desta doença pandémica leve a ameaças de segurança. A segurança dos funcionários da saúde era uma preocupação constante para aqueles que eram responsáveis por lidar com a pandemia do Ébola, na África Ocidental, entre 2014 e 2016. Os surtos frequentemente exigem que as autoridades governamentais e sanitárias interajam com a população e aldeias remotas que podem não estar familiarizadas com os serviços modernos de saúde e susceptíveis a boatos e desinformação. Medidas de segurança adicionais são bastante importantes no Sudão depois de anos de guerra e sanções terem enfraquecido o sistema de saúde do país.
Em Maio de 2020, as autoridades sudanesas anunciaram que iriam criar uma força policial para proteger as instalações hospitalares e os funcionários de saúde de ataques desencadeados durante a pandemia.
Os médicos ameaçaram fazer uma greve em protesto contra as crescentes preocupações com a segurança. Em Abril de 2020, manifestantes fizeram ameaças num hospital de Omdurman, do outro lado do rio a partir da capital, Cartum, depois de boatos terem sido espalhados de que os pacientes da COVID-19 seriam tratados naquele hospital, noticiou a The Associated Press.
Num certo dia, no mês de Maio, três ataques foram perpetrados contra funcionários da saúde e um hospital em Cartum, resultando em suspensão de actividades.
As Forças Armadas do Gana (GAF) também trabalharam com autoridades civis para mitigarem a propagação da COVID-19 através de medidas de segurança, entre outras realizações. No Outono de 2020, o pessoal do exército tinha estado a pulverizar e a limpar mercados públicos antes do confinamento da capital, Acra, e Kumasi assim como as regiões ao redor, de acordo com as GAF.
Quando começou o bloqueio, as GAF ajudaram a fazer cumpri-lo através da Operação Segurança da COVID. Este esforço contou com a mobilização de embarcações navais para prevenir a entrada ilegal a partir do mar. Pilotos realizaram missões de reconhecimento e efectuaram o transporte aéreo de equipamento médico assim como amostras para ajudar na testagem do vírus.
Em Julho de 2020, uma força-tarefa composta pelas GAF, a Assembleia Metropolitana de Acra e a Zoomlion Ghana Limited, uma empresa de gestão de resíduos sólidos e saneamento, começou uma campanha de sensibilização com duração de uma semana para abordar os regulamentos de saneamento de Acra e protocolos de COVID-19 em antecipação do cumprimento das medidas.
Os membros da força-tarefa difundiram mensagens públicas usando altifalantes para dizer que devem manter o ambiente ao seu redor limpo e usarem máscaras para evitar serem penalizados, de acordo com uma reportagem da Agência de Notícias do Gana.
A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO
No Quénia, os soldados passaram muito tempo a desinfectar espaços públicos, incluindo instalações militares, centros de saúde e outros lugares. Os membros das Forças de Defesa do Quénia (KDF) também trabalharam para sensibilizar a si próprios e aos outros.
Em Setembro de 2020, mais de 50 médicos das KDF provenientes de três serviços e do Hospital Memorial das Forças de Defesa passaram três dias numa conferência médica sobre a COVID-19, no Centro de Formação e Apoio da Paz, em Karen, Nairobi. O propósito da conferência era permitir que o pessoal de saúde partilhasse a sua experiência e obtivesse a mais recente informação sobre gestão e controlo de doenças contagiosas.
“É minha sincera esperança que entre as lições que a fraternidade médica das KDF aprendeu durante o recente surto da COVID-19 inclua planificação de emergência, preparação, formação, coordenação, uso de equipamentos de protecção, medidas de contenção, controlo e medicamentos,” Dr. Ibrahim Mohamed, secretário permanente do Ministério de Defesa, disse num comunicado de imprensa.
Soldados quenianos estão a educar civis como parte da Missão da União Africana na Somália. Os soldados das KDF que servem na região de Dhobley partilharam as medidas de prevenção da COVID-19 com as Forças de Segurança de Jubaland, uma força paramilitar a nível do Estado, baseada naquela região, e em outros lugares.
Os soldados das KDF ensinaram sobre higiene básica, como a lavagem frequente das mãos, o uso de máscara e como tossir e espirrar de forma a minimizar a propagação do vírus. Os esforços de sensibilização são conjugados com outros trabalhos para orientar as forças de segurança da Somália através de operações conjuntas contra o al-Shabaab.
TESTES E OUTRO TIPO DE APOIO
A testagem é uma das melhores formas de fazer a avaliação e o controlo da propagação da COVID-19. O poder logístico dos exércitos militares nacionais faz com que o envolvimento na testagem seja valioso.
As KDF levaram a cabo a testagem em massa do seu próprio pessoal para controlar a propagação da doença. Em Junho de 2020, a marinha de guerra do Quénia testou o seu pessoal e os seus familiares como parte de um esforço chamado Komesha Korona. Os funcionários também testaram os membros das KDF, no Quartel-General da Defesa e noutros quarteis de Nairobi. Oficiais, soldados, familiares de militares e pessoal civil do Ministério de Saúde têm acesso a testes em vários centros de saúde.
As Forças Armadas Tunisinas demonstraram a importância da logística militar durante a pandemia, em Abril de 2020, fazendo voos de ida e volta de Túnis para Hong Kong para transportar medicamentos e equipamento médico. A viagem de 22.000 quilómetros em 48 horas foi a mais longa que as Forças Aéreas da Tunísia já fizeram, de acordo com o sítio de notícias tunisino, Webdo. Em Outubro de 2020, a Direcção Geral de Saúde Militar da Tunísia também enviou equipas de saúde para Béjà e Ghannouch para apoiar as equipas locais na administração de testes rápidos.
As KDF apoiaram os civis de outras formas durante a pandemia. Ainda em Outubro de 2020, as KDF fizeram o transporte aéreo de professores para a região de Lamu, através de helicópteros. “Recursos aéreos sob a Operação Amani Boni transportaram professores para as Escolas Primárias de Milimani, Mangai, Basuba e Mararani durante a primeira semana de aulas após o encerramento das escolas a nível nacional devido à COVID-19,” de acordo com um comunicado das KDF. “Os professores estavam felizes de poder retomar as suas actividades porque as escolas acabavam de ser reabertas em Janeiro de 2020, depois de 6 anos de encerramento devido à insegurança.”