Corrupção na Exploração de Madeira Dizima Florestas da RDC para Alimentar Mercados Estrangeiros

EQUIPA DA ADF

Uma nova investigação de quatro partes, da Rainforest Investigations Network, do Pulitzer Center, e do The Africa Report, mostra como as árvores abatidas na República Democrática do Congo atravessam as fronteiras com a ajuda da corrupção oficial e da falta de supervisão.

O relatório descreve em pormenor a forma como o mogno e outras espécies de árvores são transportados para o Quénia e o Uganda. Uma quantidade substancial da madeira da RDC chega aos fabricantes de mobiliário destes dois países. A investigação mostra como o sector prospera com a corrupção.

“Se quisermos estar no comércio da madeira, precisamos de conhecer um general, um político e grupos armados para fazer negócio ou seremos assediados demais,” disse Peer Schouten, investigador sénior do Instituto Dinamarquês de Estudos Internacionais e autor do livro de 2022 “Roadblock Politics”: Origem da violência na África Central.”

A chave, diz Schouten no relatório, é “encher os bolsos dos operadores dos postos de controlo.” Estes pagamentos são mais baratos do que os impostos oficiais e resultam num recibo falso para satisfazer os requisitos de manutenção de registos.

Abwoli Banana, professor da Escola de Ciências Florestais, Ambientais e Geográficas da Universidade de Makerere, em Kampala, Uganda, concorda. “Estes tipos são suficientemente fortes para garantir que a madeira passa sem quaisquer documentos,” disse. “Se fores um tipo pequeno, não consegues mover a madeira.”

A RDC está situada na floresta da Bacia do Congo, conhecida como os “pulmões de África.” Estas florestas ajudam a retirar o dióxido de carbono do ar, atenuando assim os efeitos negativos das alterações climáticas. Este facto torna as práticas responsáveis de exploração de madeira cruciais para a região.

De acordo com a nova investigação, uma quantidade substancial da madeira da RDC é encaminhada para fábricas locais, onde é fabricado mobiliário para uso doméstico. Um exemplo é o Serviço Prisional do Uganda, que fabricou secretárias, cadeiras e outros objectos para gabinetes de ministérios governamentais, para o parlamento e para o gabinete do presidente. O esforço faz parte de uma directiva presidencial para que as autoridades obtenham mobiliário das prisões. A directiva resultou mesmo em dinheiro para as prisões comprarem novo equipamento e melhorarem as oficinas.

No entanto, o entusiasmo pela produção e compra a nível local não se estendeu ao reforço da responsabilidade em toda a cadeia de abastecimento. “Quando o fornecedor faz a entrega nas nossas lojas e vemos que se trata de madeira, contamos o número de peças e pagamos ao fornecedor,” Benjamin Bunkwaitse Ngabwah, superintendente sénior das prisões, disse no relatório. “Desde que a madeira chegue às nossas lojas, é só isso [que nos interessa].”

A África Oriental não é o único local afectado pela exploração ilegal de madeira. As práticas de exploração obscuras de madeira são comuns em todo o continente, desde a Gâmbia e a região de Casamança, no Senegal, até à Namíbia e ao Zimbabwe, na África Austral. Nalguns casos, as empresas chinesas extraem madeira como o pau-rosa sem restrições e enviam-na para o estrangeiro para satisfazer os vorazes mercados asiáticos.

“O principal motor do abate ilegal de árvores em África é o mercado chinês de teca, pau-brasil e mogno,” de acordo com um documento de Agosto de 2022 para o Centro de Estudos Estratégicos de África (ACSS), elaborado por C. Browne, Catherine Lena Kelly e Carl Pilgram. Depois de esgotar as florestas da África Ocidental entre 1995 e 2010, a procura chinesa “alargou-se à África Central e Oriental, e países como os Camarões, a Guiné Equatorial, o Gabão e a República do Congo tornaram-se grandes exportadores.”

A exploração ilegal de madeira liga uma série de maus actores em todo o continente. Na República Centro-Africana, as autoridades atribuíram uma concessão de exploração de madeira por 30 anos a uma empresa afiliada ao Africa Corps da Rússia, anteriormente conhecido como o mercenário Grupo Wagner.

Os grupos rebeldes da RCA e doutros locais financiam as suas operações com a venda ilegal de madeira. Os grupos criminosos organizados fazem o mesmo, muitas vezes, contrabandeando a madeira para fora do país e para os mercados asiáticos de mobiliário com a ajuda da China.

O comércio ilícito de madeira, segundo o relatório do ACSS, é importante para a segurança porque pode perpetuar a corrupção e financiar extremistas violentos e outros actores mal-intencionados. O senhor da guerra, Charles Taylor, traficava madeira para financiar a sua facção na guerra civil da Libéria e para apoiar a Frente Revolucionária Unida na Serra Leoa. Anos mais tarde, as Forças Democráticas Aliadas e outros grupos militantes do leste da RDC apoiaram-se no comércio ilegal de madeira.

A exploração ilegal de madeira e a corrupção governamental “reforçam-se mutuamente,” afirma o relatório do ACSS. Os madeireiros e os funcionários corruptos entram em conluio e os ganhos financeiros daí resultantes “reforçam ainda mais estes funcionários superiores e fornecem incentivos contínuos para abusar do poder público para obter ganhos privados.” Além disso, resulta na perda de receitas fiscais que poderiam ter sido utilizadas para o bem público.

Por último, a exploração ilegal de madeira diminui os meios de subsistência dos cidadãos devido à desflorestação e aos danos ambientais. Quando isso acontece, as pessoas podem voltar-se para o próprio crime que causou os seus problemas, tornando-as vulneráveis ao tráfico de seres humanos, às violações do trabalho infantil e à servidão por dívidas, afirma o ACSS.

“Para fazer face à procura chinesa e a outras procuras internacionais de madeira ilegal, que é um factor significativo do tráfico transnacional, é necessário desmantelar não só as redes criminosas de alto nível que impulsionam a exploração ilegal de madeira, mas também os actores governamentais que a facilitam através dos seus poderes discricionários,” afirma o relatório do ACSS.

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