‘Não Conseguimos Descrever o Horror’: Violência no Mali Aumenta com a Retirada da MINUSMA

EQUIPA DA ADF

Gritos e tiros preencheram o ar numa noite de Agosto na aldeia agrícola de Bujo, no centro do Mali. Maioritariamente desarmados, os habitantes de Bujo tiveram de fugir para sobreviver ao ataque súbito.

De manhã, 17 aldeões estavam mortos. Os terroristas incendiaram as suas casas, roubaram o seu gado e saquearam as suas lojas. Os sobreviventes enterraram as vítimas num cemitério comunitário e depois caminharam 15 quilómetros até à cidade de Bandiagara.

O ataque terrorista foi um dos mais de uma dúzia de ataques que mataram pelo menos 100 pessoas e desalojaram dezenas de milhares no centro do Mali em Agosto.

 

“Estamos completamente perdidos,” Wilas Bujo, um agricultor que fugiu de Bujo com 13 familiares, disse ao The Guardian. “Precisamos de comida, abrigo, tudo. Queremos ir para casa, para a nossa aldeia, mas lá não há ninguém que nos proteja.”

A violência aumentou no Mali desde que a Missão Multidimensional Integrada de Estabilização das Nações Unidas no Mali (MINUSMA) começou a retirar as suas tropas do país.

Segundo o Projecto de Localização de Conflitos Armados e Dados de Eventos (ACLED), mais de 650 pessoas morreram no Mali entre Julho, quando começou a primeira fase da retirada da MINUSMA, e Agosto, o que representa um aumento de mais de 40% em relação aos dois meses anteriores.

Militantes ligados à al-Qaeda estão activos no centro do Mali, enquanto o exército do Mali luta para reprimir os rebeldes Tuaregues no norte, onde os ataques se espalharam para novos locais entre operações conjuntas conduzidas pelos militares e pelo Grupo Wagner da Rússia.

Os insurgentes ligados ao grupo do Estado Islâmico (EI) causam estragos no Leste. Em Agosto, as Nações Unidas informaram que o EI quase duplicou o seu território no Mali em menos de um ano.

Grande parte da violência envolve batalhas entre as forças malianas, incluindo membros do Grupo Wagner e organizações terroristas, enquanto grupos ligados ao EI e à al-Qaeda também lutam entre si. Os ataques contra civis também estão a aumentar.

Os residentes do centro de Tombuctu, que foi ocupado pelos extremistas há uma década, encontram-se novamente num campo de batalha. Em Agosto, a organização Jama’at Nusrat al-Islam wal Muslimin (JNIM), ligada à al-Qaeda, fechou as rotas fluviais e aéreas.

Em Setembro, um atentado bombista atingiu um hospital, matando duas crianças, e aterrou perto de uma escola onde se abrigavam os sobreviventes de um ataque de barco que matou mais de 100 pessoas.

A JNIM levou a cabo seis ataques bombistas entre meados de Agosto e finais de Setembro, incluindo um ataque a 11 de Setembro que provocou a suspensão de voos de e para o centro de Tombuctu, informou o ACLED.

“A nossa preocupação são os bombardeamentos,” Sory Touré, um homem de negócios de Tombuctu, disse à Reuters. “Criam uma verdadeira psicose e deixam uma impressão duradoura. Tenho este medo dentro de mim.”

Aicha Sababou sobreviveu ao ataque a um barco de passageiros, perpetrado pela JNIM no rio Níger, no norte do Mali. O ataque matou 49 civis, 15 soldados malianos e dezenas de combatentes da JNIM. No mesmo dia, os terroristas atacaram uma base militar no norte do Mali.

“Não conseguimos descrever o horror,” disse Sababou à Reuters. “Ver dezenas de pessoas morrerem e enterrá-las juntas é assustador. Estamos felizes por nos juntarmos às nossas famílias, mesmo que ainda haja feridas que temos de sarar.”

O ataque ao barco fluvial ocorreu num momento em que a violência contra civis estava a aumentar. O Mali registou um aumento de 38% nos ataques a civis, entre Janeiro e finais de Setembro, em comparação com o mesmo período de 2022, informou o ACLED.

O Grupo Wagner, que entrou no país em 2021, é responsável por grande parte da violência contra civis. De acordo com o ACLED, 71% do envolvimento do Grupo Wagner na violência política no Mali assumiu a forma de ataques dirigidos a civis.

Prevê-se que as forças da MINUSMA, num total de cerca de 13.000 pessoas, partam até 31 de Dezembro. No início de Outubro, a retirada de 116 soldados de manutenção da paz senegaleses significou que 3.200 soldados de manutenção da paz deixaram a missão, informou a defenceWeb.

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