Tensão Aumenta no Senegal, Pilar Democrático de África

EQUIPA DA ADF

O anúncio feito pelo Presidente do Senegal, Macky Sall, em Julho, de que não iria tentar um terceiro mandato foi recebido com um misto de alívio e orgulho num país conhecido pelas suas tradições democráticas.

“Uma bomba-relógio acabou de ser desactivada,” Alioune Tine, um proeminente defensor senegalês de direitos humanos, disse ao The New York Times. “É um grande alívio para o Senegal e para o continente africano.”

O Senegal, o único país da África Ocidental que nunca teve um golpe de Estado ou um ataque terrorista significativo, é há muito um pilar da estabilidade regional. Contudo, começaram a aparecer fissuras no pilar.

As tensões têm aumentado constantemente nos últimos anos com protestos contra o elevado custo de vida e acusações de corrupção sistémica do governo. O Senegal tornou-se um alvo privilegiado para a expansão de organizações extremistas violentas na região do Sahel.

As mesmas condições — agitação e insatisfação com o governo — contribuíram para uma série de golpes de Estado recentes que assolaram o Sahel e a África Ocidental.

“[O Senegal] sempre foi visto como uma ‘excepção africana,’ uma ‘montra da democracia,’ uma nação unida que pode contar com um Estado e instituições funcionais,” o sociólogo Aly Baba Faye disse à revista Focus on Africa. “No entanto, hoje parece ser objecto de debate sobre uma estabilidade que corre o risco de ruir.”

A pandemia da COVID-19 intensificou a inflação, a dívida e o desemprego. A invasão da Ucrânia pela Rússia provocou a escassez de alimentos, o aumento dos custos do combustível e da electricidade e um maior descontentamento com Sall e o seu governo.

Em 2022, a taxa da pobreza do Senegal era de 36,3%, segundo o Banco Mundial. O governo procurou limitar os preços de alguns alimentos, das propinas escolares e das rendas, mas os críticos não se demoveram.

“O desemprego maciço dos jovens e o esgotamento face aos escândalos de corrupção de Sall fizeram pender a balança para a hostilidade contra a liderança política do país,” escreveu a jornalista Elodie Toto para a revista Foreign Policy.

“A raiva é palpável. Bastaria uma faísca para que este barril de pólvora se explodisse e desse uma oportunidade aos terroristas.”

O Sahel é responsável por 43% das mortes causadas pelo terrorismo em todo o mundo, tendo o número de vítimas aumentado mais de 2.000% nos últimos 15 anos, de acordo com o Índice Global de Terrorismo de 2023.

O vizinho do Senegal a leste, o Mali, ficou em quarto lugar a nível mundial na lista de países mais afectados do índice. O Burquina Faso ficou em segundo lugar.

Os especialistas afirmam que os desafios complexos do país o tornam vulnerável a grupos terroristas, que podem capitalizar e ampliar o descontentamento através da radicalização de jovens descontentes.

“As crescentes frustrações no Senegal, incluindo a desilusão económica, a violência policial e as acusações de corrupção, têm servido como condições que os grupos terroristas têm aproveitado em toda a região,” escreveu o Centro Soufan, uma organização independente de investigação sem fins lucrativos, num relatório de Junho.

“A Jama’at Nusrat al-Islam wal Muslimin, afiliada à al-Qaeda, e o Estado Islâmico no Grande Sahara tiram partido das fronteiras porosas, da corrupção, do fraco Estado de direito e de outros desafios regionais multifacetados, como a degradação ambiental, a insegurança alimentar, a migração e a instabilidade económica.”

A tensão política e a violência também estão a aumentar. Receia-se que o governo desqualifique o líder da oposição, Ousmane Sonko, que liderou as sondagens pré-eleitorais para as eleições presidenciais de 2024 antes de ser acusado de fomentar a insurgência a 31 de Julho.

Em Junho, uma violenta repressão contra os apoiantes de Sonko resultou em 23 mortes, centenas de detenções e na destruição de propriedade pública e privada, incluindo bancos, autocarros e comboios.

O governo também bloqueou as redes sociais e as aplicações de mensagens, tendo depois encerrado a internet móvel em todo o país, o que custou muito caro à economia.

Faye acredita que estes factores combinaram para criar a tempestade perfeita de tensões no Senegal.

“É crucial que o governo e a liderança política resolvam estas questões com seriedade e encetem um diálogo significativo com todas as partes interessadas,” afirmou. “Isso inclui a implementação de políticas que abordem o desemprego juvenil, a promoção da transparência e da responsabilidade na governação e a garantia de igualdade de acesso às oportunidades para todos os cidadãos senegaleses.

“Só através de esforços genuínos para enfrentar estes desafios estruturais é que o Senegal poderá recuperar a sua estabilidade e estar à altura dos ideais do seu venerado modelo senegalês.”

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