Embaixadores Do Deserto

Guardas Montados em Camelos na Mauritânia Garantem Mais do Que Apenas Segurança

EQUIPA DA ADF

Afunção primária dos 300 membros da Guarda Nacional Mehari da Mauritânia, montados em camelos, é fazer a patrulha das zonas remotas do Sahara, ao longo da fronteira com o Mali, procurando por células terroristas. Mas eles fazem muito mais do que garantir a segurança das aldeias e dos postos avançados nómadas.

Os montadores de camelos, vestidos de trajes tradicionais, fornecem informação vital, transportes públicos e ajudam com o acesso à água limpa. Eles podem oferecer cuidados de saúde sofisticados, como diagnosticar doenças e providenciar medicamento adequado. Muitos descrevem o trabalho como um chamado superior. 

“O dia mais bonito para mim é quando recebo uma missão, independentemente de qual seja,” um membro da guarda disse à Radio France Internacionale (RFI). “Pode ser uma missão de segurança ou uma missão de sensibilização, como ensinar sobre doenças, os perigos da imigração ilegal ou do tráfico de drogas. Qualquer que seja a missão, eu cumpro-a a todo o custo.”  

Eles também colhem inteligência sobre terroristas e servem como embaixadores da boa vontade a favor do governo. Um guarda disse à DW News que alguns dos montadores vão para os mercados à paisana, procurando por grandes aquisições de combustível e suprimentos fora do comum. Em alguns casos, a informação é enviada ao governo, que envia unidades de combate ao terrorismo.

Os montadores vão para o deserto e ficam lá durante meses, acampando à noite. São conhecidos como Meharistas, derivado das palavras francesa e árabe para camelos do deserto.

A resposta aos montadores de camelo tem sido calorosamente positiva. Os montadores são conhecidos e confiados pelas comunidades que servem e são uma fonte de orgulho cívico. As comunidades remotas que há muito reclamavam que os países as ignoravam, estão gratas por ver provas de autoridades federais a chegarem para ajudá-las.

“O agrupamento nómada da Guarda Nacional faz muito por nós,” disse um residente à Africanews. “Antes de nós termos uma rede de distribuição de água, eram eles que nos forneciam água. Desde que eles vieram para aqui, sentimo-nos seguros. Eles oferecem consultas e medicamentos gratuitamente para (a comunidade de) Achemine.”

300 membros, montadores de Camelo, da Guarda Nacional de Mehari, da Mauritânia, fazem a patrulha das zonas remotas ao longo da fronteira com o Mali, em busca de células terroristas. AFP/GETTY IMAGES

Agentes da polícia montados em camelos não são algo novo na região, a prática tem 100 anos de existência. Os membros deste “corpo de camelos” moderno, foram recrutados dentre nómadas locais, e as autoridades afirmam que têm planos para acrescentar mais 200.

Esta força pode ser relativamente pequena, mas lida com dois problemas que a Mauritânia e muitos outros países africanos enfrentam: como incluir os grupos étnicos minoritários na provisão de serviços e como garantir a segurança e oferecer serviços a pessoas em zonas remotas.

“Os Meharistas fazem parte de uma tradição da Mauritânia como país. Eles são um dos emblemas do nosso país,” um membro do corpo disse à RFI. “Eu alistei-me porque a nossa missão é nobre. Ir ter com a população de nómadas para sensibilizar, para informá-los e oferecer educação à população que não sabe ler nem escrever. Existem também operações armadas para trazer segurança.” 

ISOLADOS E MARGINALIZADOS

O enorme tamanho do continente africano fez com que houvesse um problema que, muitas vezes, é descrito como a “tirania da distância.” Muitos países possuem comunidades rurais étnicas que vivem muito longe dos centros populacionais. Elas, muitas vezes, ficam isoladas por falta de estradas. Estas comunidades e aldeias das zonas recônditas, muitas vezes, recebem muito pouco, em forma de benefícios e ajuda proveniente do governo central. Por sua vez, estas comunidades chegam a ressentir-se da falta de apoio e protecção, fazendo com que esteja susceptível ao recrutamento por grupos extremistas.

Num estudo de 1997, a Brookings Institution afirmou que virtualmente todos os conflitos africanos tiveram algum tipo de dimensão étnica ou regional ligada a eles. 

“Mesmo aqueles conflitos que podem parecer livres de preocupações étnicas envolvem facções e alianças criadas à volta de lealdades étnicas,” noticiou a Brookings. “Os analistas tendem a ter um de dois pontos de vista sobre o papel de etnias nestes conflitos. Alguns consideram as etnias como uma fonte de conflito; outros consideram-nas como uma ferramenta utilizada por actores políticos para promover as suas ambições. Na realidade, são ambos.”

As disputas étnicas até levaram a guerras civis em países como a República Democrática do Congo, Libéria, Ruanda, Somália e Uganda.

Um Meharista da Guarda Nacional da Mauritânia faz patrulha em Nema.
AFP/GETTY IMAGES

ALCANÇANDO OS GRUPOS ÉTNICOS

O corpo de camelos é apenas uma resposta para o problema de como alcançar os grupos marginalizados. Os países que se esforçaram acreditam que leva a uma maior segurança e prosperidade nas regiões afectadas. Uma vez que estas comunidades geralmente se encontram perto das fronteiras, o alcance produz resultados de uma outra forma, transformando grupos hostis em aliados. Estas comunidades fronteiriças podem servir como uma primeira linha de defesa para alertar o governo sobre incursões de extremistas ou de traficantes.

Na Mauritânia, o governo deu um passo adiante, ajudando as comunidades nómadas a criarem novas cidades na parte leste do país, onde podem receber serviços e estabilidade enquanto preservam uma forma de vida tradicional.

A intenção não é abolir o nomadismo — os homens continuam a viver em ambientes seminómadas próximo de seus rebanhos, enquanto as suas famílias estão estabelecidas num lugar, beneficiando de serviços de educação e outras regalias básicas — mas para criar pontos focais e posições possíveis de defender nas imediações da fronteira do Mali,” especialista em combate ao terrorismo saheliano, Anouar Boukhars, escreveu para o Centro de Estudos Estratégicos de África (ACSS).

Boukhars disse que esses compromissos estão a trazer resultados. “Esta estratégia de envolvimento comunitário em zonas remotas do deserto tem sido uma componente de extrema importância da abordagem de combate ao terrorismo,” escreveu. 

Os embaixadores que montam em camelos naquele país têm planos de continuar a expandir o seu programa para satisfazer as necessidades de mais pessoas que se encontram em risco. 

“Onde o Estado não tem qualquer infra-estrutura nas zonas recônditas e isoladas, nós vamos para ajudar em termos de saneamento e educação,” comandante do corpo de camelos, Coronel Abderrahamane El Khalil, disse ao ACSS.  


‘Navios do Deserto’ Criados Para Ambientes Mais Difíceis

EQUIPA DA ADF

Existem aproximadamente 40 milhões de camelos no mundo.

Apesar da sua aparência estranha, um camelo pode correr a uma velocidade de até 65 quilómetros por hora — quase tão rápido como um cavalo de corrida.

Os camelos possuem três conjuntos de pálpebras e duas linhas de pestanas para manter a areia fora dos seus olhos. Eles podem fechar completamente as narinas durante as tempestades de areia.

Histórias sobre estes navios do deserto a sobreviverem sem água são verdadeiras. As corcundas dos camelos permitem que eles armazenem mais de 36 quilogramas de gordura a partir da qual podem viver durante semanas ou meses. Quando um camelo finalmente encontra água, ele pode beber até 150 litros de uma só vez.

Os camelos podem sobreviver a temperaturas que rapidamente matariam um cavalo ou uma pessoa.

Diz-se que a língua árabe possui 100 palavras diferentes para camelos, mas isso não é verdade. Cada uma das cerca de 100 variações da palavra acrescenta um elemento descritivo, como macho ou fêmea, sedento, paciente, grande ou jovem.

Os camelos produzem um dos leites mais saudáveis do mundo, famoso para o consumo humano em muitos países.

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