EQUIPA DA ADF
O grupo do Estado Islâmico, que já deteve cerca de um terço do território sírio e ainda mais espaço no Iraque, agora supervisiona uma rede de afiliados de vários tamanhos em toda a África.
Cada afiliado surgiu em regiões distintas, com histórias e ressentimentos singulares. Os grupos que exploram estes ressentimentos através da extorsão e da violência acabaram por tomar a marca conhecida a nível global como ISIS. Agora a comunidade internacional está a juntar-se aos países africanos na procura de formas de combater a propagação.
A influência do Estado Islâmico em África tem estado a crescer anualmente desde 2014, de acordo com uma reportagem da Sky News, de 2021. Até 2019, pelo menos 22 países africanos tinham registado actividade suspeita ligada ao Estado Islâmico, embora nenhum afiliado estivesse lá instalado. Até 2020, oito países registaram um aumento de violência daquela natureza. Estes oito representam o Sahel da África Ocidental, o actual epicentro da violência do grupo do Estado Islâmico no continente, e a República Democrática do Congo (RDC) e Moçambique.
Observadores afirmam que as afiliações ao grupo do Estado Islâmico oferecem vantagens para grupos militantes baseados em África e para a organização coordenadora. Os grupos locais de jihadistas ganham o selo “da marca do Estado Islâmico, assim como recursos, tais como financiamento, treinos e uma plataforma para propaganda baseada em redes sociais a nível mundial,” escreveu Jacob Zenn, da Fundação Jamestown, e Colin P. Clarke, do Grupo Soufan, para a revista Foreign Policy. Por sua vez, o grupo do Estado Islâmico pode apontar para alguns sucessos em África enquanto luta para recuperar das derrotas sofridas no Médio Oriente.
De facto, os afiliados africanos agora são apresentados na primeira página da publicação semanal do grupo do Estado Islâmico, al-Naba, mais do que os grupos centrais do Iraque e da Síria, escreveram Zenn e Clarke.
Existem seis afiliados africanos, ou províncias, do grupo do Estado Islâmico em África. Os primeiros três começaram em 2014 numa Líbia assolada pela guerra, na Argélia e na região problemática do Sinai, Egipto. Um ano depois, a Província da África Ocidental do Estado Islâmico (ISWAP) foi formada e possui ramificações na Bacia do Lago Chade e no Sahel. Uma ramificação emergiu da insurgência do Boko Haram da Nigéria e o outro dos grupos militantes em activo no norte do Mali.
Um pequeno grupo da Somália jurou fidelidade ao grupo do Estado Islâmico em 2018, e um ano depois foi formada a Província da África Central do Estado Islâmico. Possui ramificações na insurgência da província de Cabo Delgado, em Moçambique, e uma facção do grupo de militantes das Forças Democráticas Aliadas, da região leste da RDC.
“Sublinhando o quanto a África passou a ser uma importante área de operações do Estado Islâmico, uma estimativa de 41% de todas as mortes infligidas por militantes do Estado Islâmico, em 2019, ocorreram em África,” escreveram os pesquisadores Tricia Bacon e Jason Warner, para o Centro de Combate ao Terrorismo de West Point.
Os grupos africanos variam em termos de história, tamanho e motivação. Especialistas descobriram que discernir as verdadeiras relações entre eles e o famoso Núcleo do ISIS pode ser difícil. Em última instância, o grupo do Estado Islâmico tem de designar um grupo como uma província para que este possa ser considerado um afiliado.
Os pesquisadores Haroro J. Ingram e Lorenzo Vidino escreveram num ensaio de Maio de 2021, para a Lawfare, um blog do Instituto Lawfare, que o grupo do Estado Islâmico fornece aos afiliados o seu aqeeda (credo) e o seu manhaj (método) para a criação de um Estado Islâmico e uma marca para promover a sua propaganda.
“Em suma, espera-se que os seus afiliados adoptem e apliquem a ideologia e a estratégia político-militar do Estado Islâmico no seu canto do mundo,” escreveram.
Por exemplo, na RDC, a facção Seka Musa Baluku, do grupo de militantes das Forças Democráticas Aliadas, adoptou as técnicas de propaganda do ISIS Central e os objectos de discussão. Por sua vez, Ingram e Vidino escreveram que o grupo do Estado Islâmico reconheceu as operações dos militantes da RDC e reivindicou os seus sucessos. O ISIS Central não parece estar a fazer muita coisa no sentido de comandar e controlar, mas existem comprovativos de financiamento que é trazido para o grupo da RDC.
Um tema que une os afiliados é o seu “compromisso mútuo com os ideais, pelo menos de forma ostensiva, de um califado global,” de acordo com Bacon e Warner.
Em forma de ajuda ao grupo líbio, o ISIS Central enviou emissários do Iraque, mandou regressar combatentes estrangeiros para fortalecer as forças locais, ofereceu dinheiro e forneceu conselhos tácticos, estratégicos e sobre governação.
O ISIS Central também enviou dinheiro para a ISWAP do Lago Chade e para grupos da Somália. O grupo do Sinai recebeu dinheiro e armamento, escreveram Bacon e Warner. Mesmo assim, a ajuda aos afiliados foi “ad hoc e irregular.”
A afiliação acontece em três graus, argumentam Zenn e Clarke. As províncias líbias, mais ou menos extintas agora, representavam uma ligação de primeiro grau, porque juraram fidelidade, receberam combatentes da Síria para se estabelecerem e “mantiveram comunicações frequentes e directas com o núcleo do grupo.” Eles também receberam financiamento, treinos e aconselhamento até que forças internacionais e líbias os desalojaram.
A ISWAP representaria a ligação de segundo grau. Jurou fidelidade, mas teve pouco envolvimento com combatentes e formadores do grupo central do ISIS. O ISIS, contudo, promove ataques e faz consultas com líderes da ISWAP.
Moçambique pode ser descrito como tendo uma ligação de terceiro grau. Os militantes daquele ponto juraram fidelidade, mas o ISIS Central não divulgou formalmente tais juramentos. “Embora uma afiliação de terceiro grau possa não ter levado a mesma harmonização que a ISWAP tem com o Estado Islâmico, os benefícios do seu patrocínio foram vistos em Moçambique, incluindo estratégias e tácticas, comunicação social assim como a estética do uniforme,” escreveram Zenn e Clarke.
O mundo está a tomar nota do crescimento do grupo do Estado Islâmico em África. Em finais de Junho de 2021, líderes da Coligação Global para Derrotar o ISIS, composta por 83 países, reuniram-se em Roma e aprovaram uma força-tarefa para lidar com a propagação de grupos militantes em África.
Luigi Di Maio, Ministro dos Negócios Estrangeiros da Itália, não partilhou pormenores sobre como a força-tarefa iria trabalhar, mas disse que seria necessária uma “abordagem holística” para lidar com questões como a pobreza e outros causadores do extremismo.
A coligação anunciou que a República Centro-Africana, a RDC e a Mauritânia se encontram entre os mais novos membros do grupo. Burkina Faso, Gana e Moçambique participaram como observadores.
“Embora seja bom que a coligação esteja a falar sobre África e a trazer países relevantes para o debate, qualquer coordenação parece ainda estar nos estágios iniciais, enquanto as condições no terreno estão a deteriorar-se de forma muito rápida,” Emily Estelle, pesquisadora do American Enterprise Institute, disse à Voz da América.
“A força-tarefa proposta devia centrar as suas energias no apoio dos sucessos militares com os sucessos da governação,” disse. “Esta é a lacuna que permite que o EI e outros grupos continuem a retornar depois de perdas militares.”