EQUIPA DA ADF
Aproximadamente 18 meses depois do surgimento da COVID-19 em Wuhan, China, a origem do vírus continua sob investigação. Embora um surgimento de fontes naturais seja uma teoria, cientistas de todo o mundo estão a exigir um olhar mais profundo sobre um outro potencial ponto de origem: uma fuga do laboratório.
O Instituto de Virologia de Wuhan tornou-se o foco da investigação da fuga, em parte, por ser o laboratório da cidade natal de Shi Zhengli, também conhecida como “mulher morcego,” pela sua pesquisa em vírus ligados a morcegos. Shi disse à revista Scientific American que ela quis saber se o laboratório dela podia ter sido a fonte da COVID-19 depois que ela ficou a saber sobre o surto do ano passado.
O Instituto de Wuhan continua a atrair a atenção por outros motivos:
- Informação divulgada recentemente demonstra que vários trabalhadores do laboratório ficaram doentes com sintomas semelhantes aos da COVID-19 em Novembro de 2019, mais de um mês antes de a China alertar a Organização Mundial de Saúde (OMS) sobre o vírus que em breve se tornaria numa pandemia global.
- Fica a uma pequena distância do Mercado Grossista de Mariscos de Huanan, em Wuhan, do outro lado do Rio Yangtze, onde o primeiro grupo do surto da COVID-19 surgiu.
- O laboratório estuda os coronavírus transmitidos por morcegos, especialmente o tipo de morcegos provenientes do sul da China, que causou o surto de SARS de 2003. O vírus da COVID-19 é quase idêntico aos outros coronavírus transmitidos por morcegos.
Já houve outros casos de trabalhadores do laboratório que propagaram acidentalmente o vírus que estavam a estudar. Em 2004, um pesquisador do Instituto Nacional de Virologia da China foi infectado acidentalmente com SARS e transmitiu à sua mãe e a uma enfermeira. No final, 1.000 pessoas foram colocadas em quarentena pela exposição.
Alguns pesquisadores comunicaram que o Instituto de Wuhan manuseou amostras do coronavírus com precaução de biossegurança de nível 2, em vez do nível 3 ou superior, recomendado para tais amostras. O nível 2 exige equipamento de protecção individual e cabines que filtram o ar. O nível 3 e superiores exigem maior segurança, incluindo o uso de câmaras de vácuo e fatos de risco biológico.
“As pessoas não devem estar a analisar vírus de morcegos em laboratórios BSL-2 [nível-2 de biossegurança],” virologista da Universidade Columbia, W. Ian Lapkin, disse numa entrevista com o jornalista Donald McNeil Jr., em Maio.
Lapkin foi um proponente inicial da ideia de que a COVID-19 era transmitida de morcegos para pessoas através de um mecanismo natural. Com nova informação relacionada com uma possível fuga do Instituto de Wuhan, Lapkin disse: “O meu ponto de vista mudou.”
Desde que surgiu em Wuhan, em finais de 2019, a COVID-19 propagou-se para todos os cantos do mundo e matou 3,5 milhões de pessoas no mundo inteiro, incluindo mais de 132.700 em África.
Os investigadores da OMS visitaram o Instituto de Virologia de Wuhan durante a sua viagem à busca de factos na China, no início deste ano. O seu relatório final de 313 páginas, emitido em finais de Março, depois que os cientistas chineses o aprovaram, incluiu apenas quatro páginas acerca do laboratório de Wuhan e considerou ser “extremamente improvável” que a pandemia tenha começado com uma fuga naquele lugar.
A conclusão foi recebida com cepticismo por muitos outros cientistas de elevada reputação, que exigiram uma investigação mais directa do laboratório de Wuhan. O Director-Geral da OMS, Dr. Tedros Adhanom Ghebreyesus, apelou que fosse feita uma investigação sobre a possibilidade de uma fuga do laboratório.
Numa carta publicada em Maio, no jornal Science, um grupo de cientistas repetiu o apelo, feito primeiramente em Março, para que fossem feitas mais pesquisas relacionadas com a fuga do laboratório do Instituto de Wuhan.
“Saber como a COVID-19 surgiu é de grande importância para informar as estratégias globais com vista a mitigar os riscos de futuros surtos,” disseram os autores.
Marc Lipsitch, que assinou a carta e é professor de epidemiologia na Escola de Saúde Pública, da Universidade de Harvard, disse que uma possível fuga do laboratório merece maior escrutínio, porque a China reteve informação relacionada com o vírus. As autoridades chinesas ordenaram que as amostras do laboratório fossem destruídas e censuraram os relatos iniciais sobre o surto da COVID-19, disse.
A China também impediu a investigação da OMS, atrasando o início da missão por vários meses, depois recusou-se a entregar alguns dos dados que os investigadores solicitaram.
Pouco antes do relatório da OMS sair, em Março, Lipsitch disse, numa publicação do Twitter, que existem motivos científicos sólidos para investigar o laboratório.
“Perguntar se terá havido um acidente em Wuhan não é equivalente a falar de uma conspiração, entre outros motivos, porque um trabalhador do laboratório contaminado por uma amostra de morcego e transmitindo de forma assintomática para outras pessoas é um cenário possível, sendo que em tal hipótese, talvez, ninguém saberia.”