EQUIPA DA ADF
Uma disputa com uma década de existência entre a Etiópia e o Sudão está a ameaçar transformar-se numa guerra fronteiriça. As partes entraram em confrontos em Dezembro de 2020 e desde essa altura posicionaram forças com armamento pesado na fértil região agrícola de al-Fashqa.
Os países partilham uma fronteira de 744 quilómetros, que tem sido disputada desde a era colonial do Sec. XIX.
Nestes últimos anos, al-Fashqa passou a ser o foco do conflito.
Localizada dentro das fronteiras internacionalmente reconhecidas do Sudão, al-Fashqa está isolado do resto do país por dois rios e não possui pontos de controlo ou barreiras na sua fronteira com a Etiópia. O Sudão reclamou os seus direitos ao território apesar de agricultores etíopes terem-se estabelecido e pagarem impostos às autoridades etíopes por mais de 25 anos.
“Esta questão foi arquivada já há algum tempo e, embora houvesse actividade agrícola etíope nestas zonas, parece que existe um entendimento de que isso não significava que era uma terra etíope,” William Davison, analista sénior etíope, no International Crisis Group (Grupo Internacional da Crise), disse à Deutsche Welle (DW).
“Não está claro o que exactamente causou a tensão desta disputa fronteiriça de longa data. Fontes sugerem que as forças de segurança sudanesas podem ter respondido à incursão de agricultores etíopes, que, por sua vez, trouxeram forças de segurança etíopes.”
Quatro soldados sudaneses morreram e 27 ficaram feridos próximo da fronteira, no dia 15 de Dezembro, naquilo que o Sudão afirma ter sido uma emboscada feita pelas milícias etíopes.
Desde essa altura, oficiais de ambos países têm acentuado a sua retórica.
Enquanto o exército da Etiópia estava ocupado com o feroz conflito interno na região de Tigré, o embaixador do país em Cartum, Yibeltal Aemero, acusou as Forças Armadas do Sudão de terem avançado para as terras fronteiriças disputadas.
“O exército sudanês aproveitou e avançou para dentro do território etíope, pilhou bens, incendiou acampamentos, deteve, atacou, matou etíopes e forçou a deslocação de milhares de pessoas,” disse num comunicado.
O Sudão e a Etiópia formaram um comité conjunto em Dezembro para resolver a disputa de longa data em torno de al-Fashqa, mas a tensão aumentou em Janeiro quando o Sudão acusou a Etiópia de enviar aviões de guerra para o seu espaço aéreo.
Mais tarde, em Janeiro, a Etiópia acusou o Sudão de levar a cabo ataques militares com colunas de veículos blindados, na sua fronteira. O Ministério dos Negócios Estrangeiros da Etiópia afirmou que aqueles ataques mataram “muitos civis.”
“A parte sudanesa parece estar a pressionar de modo a causar maior tensão no terreno,” porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Dina Mufti, disse à imprensa. “Por quanto tempo a Etiópia irá continuar a resolver a questão utilizando a diplomacia?
Bem, não existe nada que não tenha limites. Tudo tem um limite.”
O Ministro de Informação do Sudão, Faisal Mohamed Saleh, respondeu à ameaça dizendo que o seu país não deseja a guerra, mas irá responder a qualquer agressão.
“Tememos que estes comentários contenham uma posição de hostilidade contra o Sudão,” disse à Reuters. “Pedimos que a Etiópia pare de atacar o território sudanês e os agricultores sudaneses.”
O aumento da tensão na fronteira surge numa altura em que o Sudão, a Etiópia e o Egipto também estão a ter dificuldades com a negociação de direitos sobre as águas numa barragem de grande envergadura que a Etiópia construiu sobre o rio Nilo.
“Não parece que o incidente da fronteira tenha perturbado de forma significativa as negociações [da barragem],” Davison disse à DW.
Ele acrescentou que ainda existem tempo e oportunidade para a diplomacia.
“Chegamos a um ponto meio delicado,” disse. “Existem também muitas oportunidades para que as partes recuem e se afastem da possibilidade de conflito.”
Ele disse que um novo conflito é a última coisa que a frágil região precisa neste momento.
“A possibilidade de a Etiópia abrir uma outra grande frente militar é preocupante, porque o país já está muito frágil,” disse Davison. “E se fosse para ter mais instabilidade interna, isso também teria ramificações regionais.”