EQUIPA DA ADF
A violência entre comunidades rivais tem uma longa história no Sudão do Sul, mas no ano passado registou-se um aumento preocupante de ataques que os observadores temem que se possa tornar numa crise mais alargada.
Mais de 150 pessoas morreram e 165 ficaram feridas numa série de confrontos mortíferos que varreram o Sudão do Sul entre 28 de Janeiro e 6 de Fevereiro.
O último trimestre de 2023 registou um aumento de 35% no número de civis afectados pela violência em comparação com o trimestre anterior, quando a Missão das Nações Unidas no Sudão do Sul (UNMISS) informou que 862 pessoas foram mortas, feridas, raptadas ou “sujeitas à violência relacionada com o conflito.”
“O conflito intercomunitário continua a causar danos imensos às comunidades em todo o país,” disse o chefe da UNMISS, Nicholas Haysom, num comunicado aquando da publicação do relatório trimestral, no dia 18 de Março.
A violência intercomunitária perpetrada por grupos de defesa civil e milícias comunitárias foi responsável por 86% de todos os civis afectados, de acordo com o relatório.
Mais de metade das vítimas — 263 mortos e 186 feridos — foram vítimas de ataques de retaliação relacionados com um conflito fronteiriço entre facções rivais do grupo étnico Dinka. Os Twic Dinka, do Estado de Warrap, que é o principal foco de conflito, e os Ngok Dinka, da região de Abyei, rica em petróleo, lutam há décadas por terras e recursos.
A vaga de violência registada no final de Janeiro e no início de Fevereiro de 2024 consistiu em conflitos separados que opuseram jovens armados do Estado de Warrap a rivais dos Estados vizinhos de Lakes e Bar El Ghazal Ocidental, bem como do território disputado de Abyei, uma área administrativa gerida conjuntamente pelo Sudão do Sul e pelo Sudão.
A Organização de Capacitação Comunitária para o Progresso (CEPO), sediada na capital do Sudão do Sul, Juba, disse que a situação é grave.
“Está a tomar uma forma perturbadora que pode ser descrita como um crime contra a humanidade ou genocídio,” o Director-Executivo da CEPO, Edmund Yakani, disse num comunicado, de acordo com o jornal Sudan’s Post.
“A violência comunitária armada, que não se limita ao conflito entre Twic e Ngok Dinka, é mortífera, com elevados registos de atrocidades humanas entre as comunidades em conflito.”
O Presidente do Sudão do Sul, Salva Kiir, e o Primeiro Vice-Presidente, Riek Machar, reuniram-se a 6 de Fevereiro e apelaram ao fim da violência subnacional. Os dois são membros dos grupos pastoris rivais Dinka e Nuer, respectivamente, e lutaram entre si durante a guerra civil de 2013 a 2018.
“[A reunião de Kiir e Machar] é uma resposta positiva à acção de sensibilização e pressão da CEPO,” afirmou Yakani. “É encorajador que os principais líderes políticos do país se reúnam para procurar soluções.”
Meressa K. Dessu, investigadora sénior e coordenadora de formação do Instituto de Estudos de Segurança (ISS), sediado na África do Sul, disse que a violência está a contribuir para a crescente incerteza no Sudão do Sul, uma vez que o complicado e frágil processo de paz do país continua incompleto e se aproxima um importante ciclo eleitoral.
“O país está numa encruzilhada,” Dessu escreveu num artigo de 12 de Março para o ISS. “As eleições estão previstas para Dezembro de 2024, num contexto de violência intercomunitária, lutas políticas internas e mobilização de grupos armados.
“A maioria dos sul-sudaneses quer eleições em Dezembro para escolher os seus líderes e evitar o aumento das despesas do governo devido ao grande e pesado governo de coligação.”
Dessu disse que o risco de violência eleitoral é elevado devido à lenta implementação do acordo de paz de 2018. “Dadas estas dificuldades, o mandato da UNMISS deve ser renovado e a missão reforçada,” escreveu. “O Conselho de Segurança da ONU deve também rever os actuais objectivos, capacidades e recursos da missão, para que esta possa apoiar a transição do país, nomeadamente as eleições.”
Yakani apelou Kiir, Machar e outros para que façam da protecção e segurança dos civis uma prioridade.
“A insegurança em várias partes do país está a minar muito o crescimento humano e o desenvolvimento da sociedade,” afirmou.