EQUIPA DA ADF
Mais de um ano depois da eclosão da pandemia da COVID-19, o verdadeiro âmbito das infecções entre os países africanos pode ser maior do que os registos oficiais indicam.
Um estudo dirigido pela pesquisadora médica gambiana, Dra. Effua Usuf, em Julho de 2020, que foi publicado recentemente no jornal médico britânico The Lancet, descobriu 92 casos não categorizados de COVID-19 para cada um caso confirmado por meio de um teste laboratorial.
Cerca de 2% das pessoas que testaram positivo compreendeu que estava a transportar um vírus. Dentre as que possuíam anticorpos, cerca de 8% não sabia que tinha sido infectada, porque nunca tinha sido testada, de acordo com Usuf.
Usuf realizou o seu estudo na Zâmbia. Estudos anteriores, que analisaram os anticorpos do sangue em Moçambique e no Quénia, descobriram-nos em 5% da população — representando transmissões significativamente maiores do que os números de casos oficiais.
Os números oficiais do Centro Africano de Controlo e Prevenção de Doenças (África CDC) colocam o número total de casos no continente em aproximadamente 4,3 milhões até inícios de Abril de 2021, com cerca de 114.000 mortes. Na sua actualização semanal do dia 1 de Abril, o Dr. John Nkengasong observou que, desde o início do ano, a taxa de mortalidade dos casos de África de 2,7% excedem a média global de 2,3%, o que significa que o continente está a apresentar um número crescente de mortes causadas pela pandemia, em comparação com outras regiões.
Para além da transmissão não descoberta, os países africanos também têm a dificuldade de fornecer um número exacto de mortes pela COVID-19. Apenas oito países acompanham as mortes de uma forma que satisfaz os padrões internacionais, o que resulta numa grande lacuna entre o número registado de mortes pela COVID-19 e o real impacto.
Um estudo feito em Cartum, Sudão, por exemplo, determinou que mais de 16.000 pessoas tinham morrido de COVID-19 naquele país, entre Abril e Setembro de 2020, um período em que os registos oficiais colocam a contagem das mortes em menos de 500.
Usuf recomenda que se combinem os testes de sangue com as mortes em excesso para obter uma ideia verdadeira da presença da COVID-19 no continente.
Os registos oficiais do impacto da pandemia em Africa foram muito menores do que o inicialmente previsto. Possíveis explicações variam desde a população mais jovem do continente em geral, a reposta rápida à primeira vaga e até à sua população maioritariamente rural.
A pesquisa de Usuf sugere que os africanos não evitaram tanto prejuízo causado pela COVID-19 como pode parecer. Pelo contrário, pode haver transmissão generalizada do vírus por pessoas que foram expostas, mas nunca desenvolveram sintomas.
“Discrepâncias entre os números oficiais e as infecções medidas pela pesquisa podem também ser explicadas por esta alta prevalência de infecções assintomáticas, uma vez que a maior parte das estratégias de testagem focalizam-se em pacientes sintomáticos,” escreveu no The Lancet.
Como resultado disso, os zambianos afastaram-se das medidas de prevenção tais como o uso de máscaras, a lavagem das mãos e o distanciamento social, porque sentiram que o vírus representava um risco menor para eles, escreveu Usuf.
Essa é uma grande preocupação enquanto os países procuram eliminar as variantes que são a causa das infecções por todo o continente. As variantes B.1.351 e B.1.1.7 (também conhecidas como N501Y.V2 e N501Y.V1) são mais transmissíveis do que o vírus original. No início de Abril, 36 dos 54 países africanos registaram pelo menos uma variante. Alguns têm ambas.
As vacinas ainda são eficazes contra as variantes. Elas reduzem significativamente os sintomas, as hospitalizações e as mortes. Mas os pesquisadores estão preocupados, receando que a propagação contínua da COVID-19 possa vir a causar o surgimento de mais variantes que podem ser mais difíceis de controlar.
Nkengasong comunicou, no dia 1 de Abril, que as autoridades angolanas tinham descoberto uma variante com elevadas mutações num viajante oriundo da Tanzânia, onde o governo apenas começou a tomar medidas contra o vírus recentemente. Não está claro se as vacinas irão neutralizar a variante, disse Nkengasong.
Dr. Tedros Adhanom Ghebreyesus, director-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), continua a apelar para um aumento da distribuição de vacinas em toda a África de modo a reduzir o avanço do vírus.
“O tempo está a contar no que refere a equidade da vacina,” disse na actualização da OMS sobre a COVID-19, no dia 1 de Abril.
O África CDC apela aos países a manterem um acompanhamento próximo e sistemático do vírus dentro dos seus territórios de modo a terem conhecimento das alterações e das variantes potencialmente perigosas.
Sem uma vigilância atenta, a propagação sem diagnósticos aumenta os riscos de novas variantes ganharem espaço antes das autoridades de saúde as poderem apanhar, de acordo com o epidemiologista Richard Lessells, da Plataforma de Inovação e Sequenciamento de Pesquisa de KwaZulu-Natal, África do Sul.
“Se permitirem que continue a propagar-se, ele continuará a evoluir,” disse Lessells ao Scientific American.