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No dia 16 de Janeiro, o governo da Somália anunciou uma grande vitória. O seu exército tinha libertado Harardhere, uma fortaleza do al-Shabaab na costa do Oceano Índico que o grupo terrorista tinha capturado há uma década.
Anteriormente, uma base para piratas que sequestravam navios no mar e exigiam resgate, Harardhere foi uma fonte significativa de rendimentos para o al-Shabaab, que esteve a utilizar o porto desde 2011 para gerar receitas através da cobrança de impostos sobre bens importados.
Depois de ser eleito, em 2022, o presidente da Somália, Hassan Sheikh Mohamud, declarou uma “guerra total” contra o grupo terrorista e comprometeu-se em estancar os financiamentos do grupo.
“O al-Shabaab não será derrotado apenas pela arma,” escreveu num artigo publicado em Outubro, num site de notícias da Somália. “Devemos utilizar a força militar, o ensino ideológico correctivo e impedir que tenham acesso aos seus financiamentos ilícitos.
“Reitero o meu apelo para que o povo da Somália tenha fé nos nossos esforços colectivos e resistam com bravura de cooperar com o al-Shabaab em qualquer que seja o modo ou a forma, independentemente do custo.”
Com as suas fortes ligações com a liderança sénior da al-Qaeda, o al-Shabaab já financiou ataques sem fim contra o povo da Somália. Existem também algumas provas de que forneceu dinheiro a grupos extremistas na Nigéria e em Moçambique, de acordo com Mohamud.
A Somália realizou uma ofensiva militar contra o al-Shabaab desde Julho de 2022. Nos últimos meses, esta ofensiva expandiu-se para incluir ataques contra o centro das vastas correntes de financiamento do al-Shabaab.
Especialistas afirmam que será muito difícil desmantelar, tendo em conta que o grupo controla cerca de um terço do país, incluindo aproximadamente 70% das regiões sul e centro da Somália. Os seus 5.000 a 7.000 combatentes controlam a maior parte da região rural de uma forma sufocante.
Um relatório do Instituto Hiraal, um grupo de reflexão sediado em Mogadíscio, estimou que o al-Shabaab arrecada 15 milhões de dólares por mês, essencialmente através de extorsão e cobrança de impostos.
Utilizando intimidação, violência e tácticas semelhantes às da máfia, o al-Shabaab arrecada tantas receitas quanto o fazem as autoridades da Somália.
Todas as principais empresas da Somália dão dinheiro ao al-Shabaab em pagamentos mensais e no “zakat” anual, ou imposto, de 2,5% dos lucros anuais, afirma o relatório.
“O medo e as ameaças credíveis contra as suas vidas são a única motivação que impulsiona os contribuintes do al-Shabaab,” afirma o relatório.
A temida Amniyat, o braço de segurança e inteligência secreta do al-Shabaab compreende cerca de 500 a 1.000 operativos, recolhe e rege as finanças do grupo.
As autoridades impuseram sanções internacionais numa rede de mais de uma dezena de membros do departamento financeiro do al-Shabaab, em Outubro de 2022, por utilizar fundos para contrabando, tráfico de armas e recrutamento.
O al-Shabaab cobra impostos de empresas grandes e pequenas, hotéis, locais de construção, empreendimentos imobiliários e no porto, em Mogadíscio, onde leva os manifestos da carga dos navios das autoridades portuárias.
O grupo pratica extorsão em milhares de dólares por dia, através de um sistema de pontos de controlo ao longo das estradas principais para o comércio. A estrada que leva a Baidoa é particularmente lucrativa, porque os mercadores e os grupos de ajuda humanitária transportam produtos alimentares e suprimentos para vender num acampamento para pessoas deslocadas internamente.
As Nações Unidas estimaram que um único posto de controlo gerava cerca de 5.000 dólares por dia, na estrada que leva a Baidoa.
O investigador independente Jay Bahadur, cujo relatório sobre a máquina de cobrança de imposto do al-Shabaab foi publicado pela Iniciativa Global Contra o Crime Organizado Transnacional, em Dezembro de 2022, chamou o grupo de “um problema estrutural profundamente enraizado na Somália.”
“É uma organização enraizada, semelhante às máfia, integrada em quase todas as facetas da sociedade, da economia e do governo nas regiões do sul do país,” escreveu. “Fornece serviços básicos, essencialmente relacionados com a segurança e com a justiça e goza de legitimidade em algumas áreas.”
Em finais de Setembro, o governo da Somália anunciou novas medidas que visam estancar a capacidade do al-Shabaab angariar fundos.
Num discurso do dia 11 de Janeiro, o Primeiro-Ministro, Hamza Abdi Barre, disse que o governo fechou todas as contas bancárias conhecidas que possuem ligação com o al-Shabaab — aproximadamente 250 contas em quatro bancos — e desligou serviços de telefonia e de dados para cerca de 70 telemóveis que os militantes estavam a utilizar para transferir dinheiro.
“Esta foi uma grande vitória e apenas foi possível graças à colaboração dos cidadãos da Somália,” disse. “Estamos no processo de investigar a quantidade do dinheiro congelado nas contas encerradas.”
Não levou muito tempo até que o al-Shabaab respondesse com ameaças contra os bancos.
O porta-voz, Sheikh Ali Dheere, disse, no dia 28 de Janeiro, que o grupo não iria aceitar que os bancos fornecessem informação dos clientes a “estranhos” e considerou as acções “puníveis.”
Omar Mahmood, analista sénior do Grupo Internacional da Crise para África Oriental, disse que a ofensiva militar e financeira da Somália está a fazer uma diferença, mas o maior desafio continua a ser manter os ganhos.
“O fazer ou quebrar não está na fase ofensiva, mas em tudo que vem depois disso,” disse à Reuters. “O al-Shabaab definitivamente está sob pressão, mas eles vão resistir por muito tempo.”