EQUIPA DA ADF
Com um acesso sem precedentes às alavancas do poder governamental, as recentes actividades da Rússia na República Centro-Africana (RCA) demonstram a sua intenção de espalhar influência num país assolado por conflitos.
A RCA esteve envolvida em guerra civil desde 2012, quando aproximadamente três quartos do país estavam nas mãos dos rebeldes. Com um presidente que enfrentava uma eleição em 2020, que sofreu atrasos devido à pandemia da COVID-19, multiplicaram-se as oportunidades para que os mercenários do Grupo Wagner, da Rússia, fizessem o seu jogo de poder.
“Eles são baratos e vêm como parte de um pacote de serviços de apoio ao regime, incluindo tecnologias políticas,” Mark Galeotti, um especialista em assuntos de segurança da Rússia, disse, ao jornal independente, The Moscow Times, referindo-se ao Grupo Wagner.
O Grupo Wagner esteve na RCA desde 2018, supostamente como um provedor de segurança para treinar tropas, defender locais e proteger o presidente e outros oficiais de alta categoria. Mas o foco do grupo esteve em garantir concessões lucrativas de ouro, diamante e urânio em troca dos seus serviços.
Utilizando mercenários e empresas fictícias como representantes e fachadas, a Rússia utilizou vários métodos para promover a sua agenda na RCA: financiando a imprensa local, patrocinando influenciadores “anti-imperialistas,” produzindo propaganda multimédia e organizando campanhas de desinformação.
Tais representações são valiosas, porque ajudam a Rússia a recusar o envolvimento directo.
“A sua motivação é primariamente financeira,” Kevin Limonier, professor de geopolítica e especialista em ciberespaço de expressão russa, disse à revista The Africa Report. “Eles consideram África como um lugar para fazer dinheiro e explorar novos horizontes. Estes influenciadores estão a agir primariamente no seu próprio interesse, para fazer crescer o seu próprio capital, enquanto acompanham o regresso da Rússia para esta parte do mundo.
“O Estado russo não possui necessariamente os meios para cumprir com as suas ambições políticas em África. Sendo assim, depende destas redes em que utiliza métodos não convencionais e recusa o seu envolvimento em caso de problemas.”
Os problemas sempre seguem o famoso Grupo Wagner.
As Nações Unidas afirmam que “receberam vários relatos sobre instrutores russos que têm estado a matar civis desarmados de forma indiscriminada” na RCA, em particular nas regiões de exploração mineira.
O Gabinete do Alto Comissariado da Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUR) recebeu, em finais de Março de 2021, relatórios de execuções em massa, tortura, detenções arbitrárias, obrigatoriedade de retirada de civis e ataques contra trabalhadores de organizações humanitárias atribuídos às forças militares privadas que trabalham com militares da RCA, incluindo o Grupo Wagner.
A presença do Grupo Wagner, estimada em cerca de 2.100 membros, cresceu em tamanho e influência.
O presidente Faustin-Archange Touadéra venceu a reeleição em 2020, em grande parte, por causa da propaganda e das campanhas de desinformação da Rússia.
Yevgeny Prigozhin, da oligarquia ligada ao Kremlin, financiou a criação de uma estação de rádio chamada Lengo Songo (que significa “Construção de Solidariedade” em língua Sango) por 10.000 dólares, de acordo com a BBC. A estação possui uma forte tendência pró-Rússia, culpando a ONU e a França pelas crises do país.
O Facebook suspendeu centenas de contas falsas ligadas às autoridades da Rússia e da França, quando se estava próximo das eleições, depois de conteúdo das redes sociais difamar os vizinhos e os parceiros estrangeiros da RCA enquanto apoiavam a Rússia como um libertador.
Seguiram-se protestos coordenados nas ruas que tinham como alvo a França, a missão de manutenção da paz da ONU na RCA (MINUSCA) e a coligação regional da Comunidade Económica dos Estados da África Central.
Em Agosto de 2021, a MINUSCA também lidou com rumores falsos de que estava a fornecer minas terrestres aos rebeldes mesmo numa altura em que estava a enviar pessoal para remover estes dispositivos.
“A MINUSCA nunca utilizou minas,” porta-voz das forças da ONU, Major Ibrahim Atikou Amadou disse à BBC, observando que as operações de desminagem estavam a enfrentar um impasse por causa destas alegações.
Touadéra nomeou Valery Zakharov, que possui ligações com o Kremlin, como seu conselheiro nacional em matérias de segurança, em 2018.
Zakharov supostamente “apoiou activamente uma propaganda hostil a Paris,” de acordo com o The Africa Report.
Na verdade, as empresas russas ligadas ao Kremlin financiaram uma diversidade de iniciativas de poder de persuasão. Alegadamente construíram locais de jogos, criaram e exibiram filmes de propaganda russa na RCA e organizaram torneios de futebol e concursos de beleza.
Em troca do seu pacote de ajuda, a Rússia criou empresas fictícias que estão ocupadas na extracção das vastas riquezas minerais da RCA.
Uma delas, chamada Lobaye Global Invest, foi criada em Outubro de 2017, juntamente com uma firma de defesa subsidiária chamada Sewa Security Services.
Léopold Mboli Fatran, Ministro das Minas da RCA, concedeu licenças de exploração mineira a Lobaye em duas regiões, em Junho e Julho de 2018. Ele eventualmente concedeu licenças em seis outras regiões — Alindao, Birao, Bria, N’Délé, Pama e Yawa.
Ao longo da extracção de recursos pela Rússia, o seu golpe de poder de persuasão continuou.
Em Dezembro de 2021, o Twitter afirmou que tinha desactivado uma rede de 16 contas conectadas com a agência de pesquisa da internet da Rússia, que estava a levar a cabo uma operação de informação na RCA.
“A operação dependia de uma mistura de relatos não-autênticos e reais para introduzir pontos de vista pró-Rússia no discurso político da RCA,” comunicou o Twitter.