EQUIPA DA ADF
A Rússia enviou 1.800 combatentes para o leste da Líbia, no que espera vir a ser uma base de poder para exercer influência noutras partes do continente. Alguns dos destacados eram soldados russos e outros eram mercenários do Africa Corps da Rússia, ainda amplamente identificado pelo seu antigo nome, Grupo Wagner.
O destacamento ocorreu depois de um grupo de navios russos ter entregado milhares de toneladas de armas e equipamento militar no porto oriental de Tobruk, em Abril. Ambos os acontecimentos ocorreram após reuniões entre o Vice-Ministro da Defesa da Rússia, Yunus-Bek Yevkurov, o novo chefe do Grupo Wagner, o General Andrei Averyanov, e o Marechal Khalifa Haftar, líder do Exército Nacional Líbio, sediado a leste.
Antes do recente afluxo de mercenários, os analistas calculavam que o Grupo Wagner tinha cerca de 2.000 combatentes no terreno na Líbia. O Grupo Wagner entrou na Líbia em 2018 para apoiar Haftar na guerra civil que se seguiu à queda do ditador Moammar Gadhafi em 2011. O Grupo foi pago pelos seus serviços com petróleo líbio.
De acordo com o Arabic Post, os novos mercenários são a vanguarda das 45.000 forças russas que deverão ser enviadas para a Líbia, numa altura em que a Rússia pretende alargar a sua presença no continente.
“A evolução do Grupo Wagner, de operações secretas para um papel militar pronunciado, está em sintonia com os objectivos mais amplos da Rússia de controlar recursos estratégicos e áreas geográficas importantes,” a analista Victoria Maldonado escreveu recentemente na Georgetown Security Studies Review.
Os analistas dizem que a Líbia proporciona à Rússia uma ponte crucial entre as suas operações mediterrânicas baseadas na Síria e as forças do Grupo Wagner que operam no Burquina Faso, na República Centro-Africana (RCA), no Mali, no Níger e no Sudão. Entre outras coisas, as operações do Grupo Wagner em África fornecem à Rússia diamantes, ouro e petróleo que esta utiliza para financiar a sua guerra com a Ucrânia.
Em Abril, aviões russos transportaram combatentes da Líbia para o Níger, onde a junta no poder fez um acordo com o Grupo Wagner.
As forças do Grupo Wagner e russas controlam as bases aéreas líbias perto de Sirte, al-Jufra e Brak al-Shati, a partir das quais transportam os abastecimentos entre os aliados no Sudão e noutras regiões subsarianas. Estão a tentar obter direitos de ancoragem em Tobruk, a partir dos quais podem expandir a sua presença naval no Mediterrâneo.
Através de publicações nas redes sociais, a página da internet All Eyes on Wagner conseguiu seguir o percurso de um trabalhador de uma das empresas mineiras associadas ao Grupo Wagner, desde a base aérea de al-Kadim, na Líbia, controlada pelo Grupo, até à mina de ouro de Ndassima, na RCA, também por este controlada.
“Al-Khadim parece ser um elemento-chave na cadeia de abastecimento e de recursos humanos do Grupo Wagner entre a Líbia e a República Centro-Africana,” escreveram recentemente os analistas da All Eyes on Wagner.
Um complexo na base aérea parece também albergar combatentes recrutados na Rússia e na Síria, observou o grupo.
Os combatentes do Grupo Wagner utilizaram al-Khadim como centro de abastecimento de armas aos aliados de Haftar nas Forças de Apoio Rápido (RSF) do Sudão, pouco depois do início da guerra entre as RSF e as Forças Armadas do Sudão em 2023.
A Rússia está a reforçar a sua presença na Líbia, ao mesmo tempo que a liderança dividida do país se esforça por encontrar uma forma de o unir novamente.
De 2011 a 2021, a Líbia esteve dividida entre o Governo de Acordo Nacional, reconhecido internacionalmente, na capital, Trípoli, e um governo rival baseado em Tobruk. Desde 2021, um Governo de Unidade Nacional tem procurado reunificar e estabilizar o país.
A presença contínua do Grupo Wagner torna isso provavelmente impossível, dizem os especialistas.
“A estratégia de Averyanov envolve a orquestração de esforços de desestabilização para criar o caos entre as forças anti-Haftar, facilitando assim a conquista de terreno pelo Exército Nacional Líbio (LNA),” escreveu Maldonado.
De acordo com o analista Hager Ali, há poucas esperanças de que a Líbia possa enveredar pelo caminho da democracia enquanto o Grupo Wagner estiver presente nas suas fronteiras. A Rússia é susceptível de intimidar os eleitores e interferir ou mesmo manipular as eleições, afirmou.
“O Grupo Wagner realiza campanhas de desinformação online,” disse Ali. “Quando ainda temos partidos políticos que precisam de estabelecer uma base de eleitores e tomar decisões sobre o próprio processo eleitoral, a desinformação é extremamente prejudicial para a integridade de qualquer processo eleitoral.”