EQUIPA DA ADF
Alguns chamaram-no o “Brexit” da África Ocidental. Outros referiram-se ao Burquina Faso, ao Mali e ao Níger como “os três rebeldes” após a sua decisão de abandonar a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO).
Seja qual for a designação, as dissidências revertem décadas de integração económica e representam um problema para a segurança regional e a governação civil, ameaçando desestabilizar ainda mais as regiões do Sahel e da África Ocidental.
“Se decidirem ir em frente e sair, isso tornar-se-á um problema muito grande, económica e politicamente,” Seidik Abba, presidente do grupo de reflexão CIRES, disse à Reuters. “O que está em jogo é o mais importante para as pessoas destes três países.”
Os peritos em segurança instaram os países da África Ocidental a colaborar e a partilhar informações para combater a expansão de insurgências extremistas violentas que se alimentam da corrupção, da negligência e dos abusos bem como da ideologia.
Se o Burquina Faso, o Mali e o Níger saírem da CEDEAO, doze países permanecerão no bloco: Benim, Cabo Verde, Costa do Marfim, Gâmbia, Gana, Guiné, Guiné-Bissau, Libéria, Nigéria, Senegal, Serra Leoa e Togo.
“A saída da CEDEAO terá consequências catastróficas para a capacidade de resposta aos muitos desafios de segurança que esta região enfrenta,” previu Abba.
A CEDEAO suspendeu e sancionou os três países após os seus golpes militares, numa tentativa de os pressionar a devolver o poder a líderes democraticamente eleitos.
Beverly Ochieng, analista da BBC África, disse que a CEDEAO foi criada como um bloco económico, mas que cada vez mais tem de responder a questões de governação.
“Tiveram de criar órgãos políticos que resolveriam as disputas políticas dentro dos países,” afirmou na edição de 2 de Fevereiro do podcast Africa Daily da BBC. “Ao longo dos anos, tiveram de alterar os seus estatutos para poderem incluir cláusulas de mediação política.
“Subjacente a tudo, não se pode ter uma economia sustentável se houver perturbações políticas, se houver insegurança.”
Apesar de as sanções económicas terem sido duras, os três países liderados por juntas militares estão agora a perder o acesso a um mercado de quase 702 mil milhões de dólares. Os peritos afirmam que as dissidências podem agravar a insegurança alimentar generalizada na região e afectar as economias já frágeis.
O Burquina Faso tinha um produto interno bruto anual per capita de 1.510 dólares em 2020, enquanto o do Níger era de 1.410 dólares em 2020 e o do Mali de 2.640 dólares em 2023.
A saída do bloco regional exporia os três países a um aumento dos direitos aduaneiros e a restrições aos fluxos financeiros e à circulação de mercadorias.
Edwin Yingi, pós-doutorando no departamento de ciências políticas da Universidade da África do Sul, disse que a saída das três nações representa um grande desafio para a CEDEAO, uma vez que põe em causa muitos dos princípios fundadores do bloco.
“Se a sua missão de se retirarem da CEDEAO for bem-sucedida, então vamos assistir ao impedimento da livre circulação de pessoas na região, o que afectará o comércio, o investimento directo estrangeiro e a cooperação económica,” disse à Agência Anadolu.
Milhões de pessoas das três nações sem litoral estabeleceram-se nos Estados vizinhos. Só na Costa do Marfim vivem mais de 5 milhões de burquinabês, malianos e nigerinos. Cerca de 80% do comércio do Níger é efectuado através da sua fronteira de 1.500 quilómetros com a Nigéria.
“Poderemos assistir a um dos maiores movimentos de pessoas a que assistimos nas últimas décadas — cidadãos de toda a sub-região a arrumar as suas coisas e a regressar a casa,” Kwesi Aning, um analista de segurança do Gana, disse à Reuters.
Na capital do Mali, Bamako, a profissional de saúde Nagnouma Keita disse à Reuters que estava apreensiva.
“Os nossos três Estados não podem sobreviver sozinhos, especialmente porque não têm acesso ao mar,” afirmou. “Creio que, na realidade, estamos a impor um embargo a nós próprios.”