EQUIPA DA ADF
Se o conflito no Sudão continuar a intensificar-se, os especialistas dizem que os combates poderão se alastrar pela porosa fronteira do Chade para o oeste.
Mucahid Durmaz, analista sénior da empresa de informação sobre riscos Verisk Maplecroft, considera que os rebeldes chadianos envolvidos no conflito sudanês podem levar a região a uma maior instabilidade.
“O que acontece no Sudão não vai ficar no Sudão,” disse ao jornal The Financial Times. “Todos os vizinhos do Sudão estão a lutar contra instabilidade política, guerras civis e insurgência.
“Quanto mais tempo a luta se arrastar, mais provável é que transborde.”
No dia 15 de Abril, eclodiram combates no Sudão entre as Forças Armadas do Sudão, do General Abdel Fattah al-Burhan, e o seu adjunto, conhecido por Hemedti, que lidera o grupo paramilitar das Forças de Apoio Rápido (RSF).
A família de Hemedti é originária do Chade.
O investigador de segurança, Alexandre Bish, caracterizou a crise no Sudão como uma oportunidade para os rebeldes chadianos.
“Enquanto estes rebeldes debatem sobre a melhor forma de beneficiar da agitação do Sudão, o Sahel enfrenta o potencial de uma instabilidade ainda maior,” escreveu para o site War on the Rocks. “Quanto mais o conflito se prolongar, mais provável é que estes actores consigam tirar partido dele.”
O marechal líbio, Khalifa Haftar, tem dado refúgio e recursos aos combatentes rebeldes do Chade, mas Bish acredita que os rebeldes poderão ver no conflito do Sudão uma oportunidade para deslocarem a sua base para a volátil região de Darfur.
Segundo ele, tal medida poderia permitir que os rebeldes explorassem “a instabilidade regional para forjar novas alianças, explorar mercados ilícitos lucrativos e potencialmente intensificar a dinâmica do conflito, prejudicando assim a frágil paz entre o Sudão e o Chade que se mantém desde 2010.”
Existem numerosas facções rebeldes no Chade, todas com a intenção declarada de derrubar o governo.
Dois grandes grupos estão separados por linhas tribais.
Liderada pelo seu fundador, Mahamat Mahadi Ali, a Frente de Mudança e Concórdia no Chade (FACT) recebe grande parte do seu apoio da tribo Goran.
“Mahadi também estava a combater na região de Tibesti, no Chade, ao lado dos rebeldes Tubu, e isso valeu-lhe o apoio dos Tubu,” disse o investigador Jerome Tubiana à Al-Jazeera.
O grupo de Mahadi lutou como mercenários com Haftar durante a sua campanha em Trípoli, em 2019 e 2020. Um relatório das Nações Unidas de 2021 disse que os rebeldes da FACT estavam estacionados na base aérea de Al Jufra, no centro da Líbia, que também foi usada pelos mercenários do Grupo Wagner, apoiados pelo Kremlin da Rússia.
Um outro grupo rebelde chadiano, a União das Forças de Resistência (UFR), é composto maioritariamente pelo povo Zaghawa. Tem também ligações com o Grupo Wagner.
Em Fevereiro de 2022, o Conselho Militar de Transição do Chade acusou o líder da UFR, Timane Erdimi, de tentar alistar o Grupo Wagner, utilizando um conselheiro do Presidente da República Centro-Africana, Faustin-Archange Touadéra, como intermediário para negociar o apoio.
Os mercenários russos também estão activos no Sudão, onde treinaram membros das RSF, de acordo com Hemedti. O grupo terá também conduzido campanhas de desinformação em Cartum, em nome da junta militar sudanesa.
A influência maligna do Grupo Wagner aumenta o potencial de caos e agitação no Chade.
De acordo com o The Wall Street Journal, relatórios recentes dos serviços secretos sugerem que o líder do Grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin, planeia fornecer aos grupos rebeldes chadianos material suficiente e apoio operacional para derrubar o governo do Chade liderado pelo presidente de transição, Mahamat Idriss Déby.
Em Abril, Déby afirmou ter falado com Burhan e Hemedti. Apelou a uma “solução pacífica para esta crise que está a abalar o Sudão e tem consequências nefastas para a estabilidade da região.”
A fronteira porosa entre os dois países representa, no entanto, um desafio difícil.
Apesar de o Chade ter fechado a sua fronteira de 1.500 quilómetros com o Sudão, os intensos combates em Darfur obrigaram cerca de 20.000 refugiados a fugir para os campos fronteiriços nos primeiros dias do conflito.
O Ministro da Comunicação do Chade, Aziz Mahamat Saleh, disse à Deutsche Welle que o país já acolhe mais de 500.000 refugiados sudaneses deslocados por conflitos anteriores.
Durmaz, da Verisk Maplecroft, alertou para o facto de as deslocações em massa na volátil região fronteiriça poderem conduzir à instabilidade no Chade.
“O Chade está em risco imediato devido aos laços étnicos, ao número crescente de refugiados sudaneses e ao historial de ataques das milícias Janjaweed aos refugiados de Darfur e às aldeias chadianas,” afirmou.
Daniel Eizenga, investigador do Centro de Estudos Estratégicos de África, concordou com a avaliação de Durmaz e chamou o Chade uma “panela de pressão.”
“Se forem deixadas durante muito tempo, as panelas de pressão podem explodir porque lá dentro há muita agitação,” disse ao The Financial Times. “Há muitos grupos e milícias diferentes.
“O Chade é um lugar fracturante — não muito diferente do Sudão.”