Em meados de Fevereiro, a União Africana desferiu um golpe duro na indústria chinesa de ejiao ao proibir o abate de burros para a venda de pele em todos os 54 países, o que mereceu elogios das organizações de defesa dos direitos dos animais.
O colagénio extraído da pele de burro produz ejiao, um remédio tradicional chinês utilizado por pessoas com anemia, hemoglobina baixa ou problemas reprodutivos, apesar de não haver provas científicas de que funcione. Também é utilizado em lanchinhos e produtos de beleza como cremes faciais. O colagénio é extraído através da cozedura de peles de burro que são misturadas com ervas e outros ingredientes para produzir barras, comprimidos e líquidos.Comercializado para os ricos, o ejiao é vendido por cerca de 780 dólares o quilograma na China, com a elevada procura a impulsionar um aumento de 160% na produção desde 2016, segundo o jornal dos Emirados, The National News.
A China foi forçada a procurar burros em África, porque a sua própria população de burros entrou em colapso devido à procura de ejiao. O mercado chinês para este produto aumentou de
cerca de 3,2 bilhões de dólares em 2013 para cerca de 7,8 bilhões de dólares em 2020, informou o The Conversation. Em África vivem 60% dos burros do mundo.A proibição da UA é um “momento fantástico para as comunidades em África que têm beneficiado dos burros desde tempos imemoriais,” Raphael Kinoti, director regional da instituição de caridade para o bem-estar dos animais Brooke East Africa, disse à BBC.
Um Recurso Crítico
Inúmeros africanos dependem dos burros para o seu transporte e também para transportar alimentos e outros bens.
Na Etiópia, onde vivem 8,8 milhões de burros, um estudo recente do Instituto Firoz Lalji para África mostrou que possuir um burro pode significar a diferença entre a miséria e uma vida modesta.
Mas o roubo de burros, impulsionado em grande parte pela procura de ejiao, tem vindo a aumentar em todo o continente desde há anos.
Para Steve, que vende água em Nairobi, no Quénia, os burros fazem o trabalho árduo de puxar uma carroça carregada com latas de água de 20 litros. Steve, um pseudónimo, foi ao campo buscar os seus animais numa manhã recente, mas eles tinham desaparecido.
“Não os pude ver,” disse à BBC. “Procurei durante todo o dia, toda a noite e no dia seguinte.”
Um amigo telefonou-lhe três dias depois para lhe dizer que tinha encontrado os esqueletos dos animais. “Tinham sido mortos, abatidos; a sua pele não estava lá,” disse Steve.
A população continental de burros caiu a pique nos últimos anos, devido à procura chinesa de
ejiao, que é responsável pelo abate de mais de 5 milhões de animais por ano em todo o mundo.
“Entre 2016 e 2019, estimamos que cerca de metade dos burros do Quénia tenham sido abatidos” para abastecer o comércio de peles, Solomon Onyango, que trabalha para o The Donkey Sanctuary, em Nairobi, disse à BBC.Aplicação da Proibição
Jennifer Croes, cientista da conservação nos Emirados Árabes Unidos e conselheira estratégica do Grupo de Trabalho sobre Crimes contra a Vida Selvagem da Interpol, elogiou os líderes africanos por mostrarem liderança na luta contra o comércio ilegal de animais selvagens.
“A questão agora é saber como é que esta proibição vai ser implementada e qual o calendário para a sua aplicação,” Croes disse ao The National. “Estou a trabalhar com os sectores marítimo e da aviação para os encorajar a comprometerem-se com uma política de transporte ‘sem peles de burro.’
“Esta proibição do comércio facilita aos intervenientes no sector dos transportes a adopção de medidas ou de processos operacionais que lhes permitam efectivamente dizer não ao transporte de peles de burro,” acrescentou Croes.
Otieno Mtula, director regional de campanhas e advocacia do The Donkey Sanctuary, exortou cada país africano a implementar e a fazer cumprir a proibição.
“Trabalharemos em estreita colaboração com os nossos colegas e parceiros em toda a África para fornecer todo o apoio e recursos que pudermos para ver este compromisso com a proibição do abate de burros para a sua pele tornar-se uma realidade em toda a África e o início de uma nova era para o bem-estar dos burros,” disse Mtula na página da internet da organização.