EQUIPA DA ADF
Quando a Coreia do Sul enfrentou uma incursão comunista vinda do Norte, em 1950, pediu apoio ao mundo. Um país em África respondeu ao chamamento: a Etiópia.
O Imperador Haile Selassie formou um batalhão dentre os seus Guarda-costas Imperiais e destacou-o para lutar sob a bandeira das Nações Unidas.
Na altura em que o conflito terminou, o Batalhão Kagnew da Etiópia tinha ganhado o respeito dos seus aliados e inimigos. O heroísmo dos soldados durante uma batalha em que estavam em desvantagem numérica, em “Pork Chop Hill”, tornou-se uma lenda. Na verdade, dizia-se que a Etiópia era o único contingente que nunca perdeu um prisioneiro ou deixou um camarada morto no campo de batalha.
“Éramos os melhores soldados. Os três batalhões etíopes lutaram em 253 batalhas, e nenhum soldado etíope foi levado como prisioneiro na Guerra Coreana”, o veterano de combate Mamo Hebtewold disse à BBC. “Esse era o nosso lema etíope: ‘Nunca seja capturado no campo de guerra’”.
Foi o começo de uma longa tradição. Desde essa altura, a Etiópia já participou em 13 missões das Nações Unidas, em países que vão desde o Haiti ao Iémen. Hoje, com mais de 6.600 tropas a servirem em quatro missões de manutenção de paz da ONU, a Etiópia é o que mais contribui com pessoal para as missões da ONU no mundo.
Quase todos os seus elementos da força de manutenção da paz da ONU estão distribuídos em três missões no Sudão e Sudão do Sul e mais 4.000 tropas servem na Missão da União Africana na Somália.
O foco da Etiópia sobre as nações vizinhas é algo planificado. O Coronel Elias Seyoum Abrha, comandante do Centro de Treinamento de Apoio à Paz da Etiópia, disse que vem de uma antiga crença nacional na “interdependência da segurança”.
“A segurança deles está interligada com a nossa segurança”, disse Elias. “Se acontecer algo de errado com os nossos vizinhos, isso nos afecta”.
Centro de Treinamento Promete Nova Era
Apesar deste compromisso profundo com a manutenção da paz, até bem pouco tempo os elementos etíopes da força de manutenção da paz tinham acesso limitado a treinos de preparação e treinos específicos para missões.
Isto mudou em Junho de 2015 com a abertura do Centro Etíope de Apoio à Paz, em Adis Abeba. As instalações de 6,2 milhões de dólares foram parcialmente financiadas pelo Reino Unido e pelo Japão. O montante destina-se a oferecer formação que eleva a manutenção da paz para uma verdadeira especialidade militar e para preparar o pessoal para as complexidades e os perigos das missões modernas.
O centro oferece 28 cursos funcionais e temáticos numa variedade de tópicos que incluem a protecção de civis, gestão de conflitos, coordenação e mediação civil-militar. Desde que iniciou, já formou mais de 6.300 pessoas incluindo cerca de 32% que vêm de outros países de África.
“Estamos abertos para todos os africanos, para compartilhar a nossa experiência”, convidou Elias.
Os formadores do centro também gerem o Centro de Formação de Contingentes de Hurso, numa zona rural de Etiópia, a cerca de 400 quilómetros a este da capital. Neste acampamento acidentado, os soldados da manutenção da paz passam por aulas de preparação pré-destacamento e treinos de campo que, em geral, duram cerca de três meses.
Hurso oferece três módulos: um curso genérico que cumpre com os requisitos das missões da União Africana ou da ONU; cursos especiais para habilidades como logística ou medicina de combate; e cursos específicos para missões que visam responder aos desafios de ambientes como a Somália, o Sudão do Sul e Darfur. Cerca de 11.500 soldados são formados em Hurso anualmente.
“Em todas as missões, temos um pacote diferente para os seus treinos”, revelou Elias. “Quando falamos sobre uma formação dinâmica, é isto que significa: sempre acrescentando e melhorando com base nas lições aprendidas”.
Criar Impacto
A capacidade doméstica da Etiópia para treinos de manutenção de paz é rara em África. Recentemente, os países que contribuem com tropas tiveram de competir para espaços limitados em salas de aula em todo o continente. Aumentar a capacidade de formação em África tem sido um ponto enfatizado pela ONU, que quer aumentar a avaliação do desempenho das tropas durante as missões e oferecer ensino contínuo.
“Conforme se sabe, a melhoria do desempenho reduz as fatalidades”, disse o Secretário-Geral da ONU, António Guterres. “Sendo assim, a formação é um investimento necessário e estratégico de manutenção de paz — e é uma responsabilidade partilhada entre os Estados-membros e o secretariado”.
A Etiópia acredita que o seu investimento na formação está a criar um impacto. Em Darfur, o contingente etíope foi destacado pelo comandante da força que o elogiou por ir “além das tarefas da missão” e ajudar a população local abrindo furos e mediando conflitos. Em Abyei, uma zona disputada e reclamada pelo Sudão e pelo Sudão do Sul, 1.900 elementos etíopes da força de manutenção da paz receberam medalhas da ONU pelos ganhos tidos na região de conflito durante um destacamento de oito meses.
A Etiópia também aumentou o número de elementos da força de manutenção da paz femininos para mais de 600, um ponto enfatizado no centro de formação. O governo etíope comprometeu-se em aumentar ainda mais estes números. Em 2016, a Brigadeiro-General Zewdu Kiros Gebrekidan foi nomeada comandante-adjunta da Força de Segurança Interina das Nações Unidas para Abyei, fazendo com que ela fosse uma das poucas mulheres a ser nomeada para esse cargo.
Os líderes militares e civis da Etiópia dizem que pretendem continuar esta dedicação para com a manutenção da paz por muitas e longas décadas.
“Quaisquer que sejam os problemas que enfrentamos, alcançaremos a paz e a segurança, mesmo se tivermos que sacrificar a nossa própria vida”, disse o Capitão Gabrhiwot Gebru, comandante-adjunto do Batalhão Etíope da Missão da ONU no Sudão do Sul.