EQUIPA DA ADF
Em 2020, o jornalista zimbabweano, Hopewell Chin’ono, publicou um artigo na internet que denunciava o mau uso pelo governo de fundos destinados a ajudar o país a combater a pandemia da COVID-19. Ele foi preso pouco tempo depois e acusado de incitar à violência.
Seria a primeira de várias prisões para Chin’ono, que, várias vezes, publicou comentários, criticando o governo nos seus canais das redes sociais.
A constituição do Zimbabwe garante liberdade de expressão, mas, nos últimos anos, as autoridades apertaram o cerco contra as publicações das redes sociais e outras actividades online consideradas críticas ao governo. Em Dezembro de 2021, o presidente Emmerson Mnangagwa assinou a lei de protecção de dados que criminaliza a publicação de informação falsa na internet.
Os críticos afirmam que a lei é muito ampla e não define claramente o que é informação falsa.
“A intenção da lei não tem a ver com notícias falsas, mais tem como objectivo atacar uma ou duas pessoas. Ainda existem debates sobre o que são falsas notícias pelo mundo,” o professor de comunicações, Wellington Gadzikwa, disse à conferência da Media Alliance do Zimbabwe pouco depois da lei ter entrado em vigor.
O Zimbabwe junta-se ao Marrocos, Sudão e Uganda como países que tem a fama de envolver-se naquilo que os defensores da liberdade de expressão chamam de “autoritarismo digital” para silenciar a discórdia e reprimir o uso da internet pelos seus cidadãos, de acordo com o projecto Unfreedom Monitor.
As repressões incluem licenciar os blogueiros, ter como alvo páginas específicas da internet e encerrar o acesso à internet em toda a região ou em todo o país.
Seis desligamentos de internet nos últimos três anos fizeram com que o Sudão fosse um dos países que maior repressão digital sofre no continente. Os desligamentos aconteceram em oposição directa às garantias de liberdades de expressão, privacidade e acesso à internet daquele país.
Os mesmos têm como alvo os protestantes, que utilizam as plataformas das redes sociais para organizar, primeiro contra o antigo ditador Omar al-Bashir e agora contra a junta, cujo golpe de Outubro de 2021 interrompeu a planificada transsição para o governo civil.
A junta desligou o acesso à internet do Sudão no primeiro aniversário do golpe de Estado e, antes disso, no terceiro aniversário da deposição de al-Bashir, em Junho. Em ambos casos, os apagões coincidiram com ataques violentos das forças de segurança contra os protestantes.
“Desligamentos frequentes de internet continuam a ser um lembrete constante de que o governo irá até grandes extremos para controlar o acesso e o uso das tecnologias digitais para a mobilização,” investigador sudanês da imprensa, Khattab Hamad, escreveu numa publicação de um blog, para a Collaboration on International ICT Policy for East and Southern Africa (CIPESA).
Os desligamentos não foram capazes de silenciar os protestos. Também não puderam impedir que provas de represálias violentas fossem divulgadas. Pelo contrário, os desligamentos destruíram significativamente a economia debilitada do Sudão, interrompendo os negócios online, de acordo com a Hamad.
No Sudão, a desinformação baseada na Rússia inundou o Facebook e outros sites das redes sociais. Actores russos e outros actores externos também utilizaram ataques coordenados para bloquear o uso do Facebook pelos comités de resistência do Sudão, de acordo com Hamad.
A lei do cibercrime de 2020, do Sudão, penaliza a publicação de mentiras e “notícias falsas” e tem sido utilizada pela junta para reprimir a oposição, observou Hamad.
Muitos países que se envolvem no autoritarismo digital o fazem exercendo o seu controlo sobre a internet, através da propriedade de infra-estruturas que a transportam.
“A posse e o controlo de sistemas de portais internacionais concedem ao governo maior influência em termos de restringir ou manipular o tráfico internacional como parte e parcela do autoritarismo digital,” um analista sul-africano, Admire Mare, escreveu na revista International Journal of Communication.
Isso oferece aos governos a habilidade de controlar a rapidez, a acessibilidade e a disponibilidade da internet, escreveu Mare.
Os países também emitem as licenças que os fornecedores de serviços de internet precisam para operar nas suas redes, concedendo aos mesmos uma outra forma para moldar o que os cidadãos vêm e ouvem na internet.
Enquanto trabalham para regular o uso da internet dos seus cidadãos, Sudão, Zimbabwe e outros autoritários digitais encontraram um aliado na gigante de telecomunicações chinesa, Huawei. Em 2021, o Zimbabwe lançou a expansão da sua rede de internet de banda larga, de propriedade do governo, construída pela Huawei, avaliada em 17 milhões de dólares e financiada pelo Eximbank, da China.
Através de subsidiárias, a Huawei controla 70% das redes móveis 4G de África. Juntamente com outras empresas chinesas, a Huawei domina o mercado de smartphones do continente.
Desde o Marrocos à África do Sul, a Huawei instalou a tecnologia conhecida como “middleboxes” em 20 países africanos. As middleboxes são pontos no sistema de internet em que a informação pode ser bloqueada, interpretada e até manipulada.
“Os governos autoritários africanos vêm benefício nos mecanismos de censura personalizados na infra-estrutura da Huawei,” advogado zimbabweano, Arthur Gwagwa, disse à agência de notícias alemã, Deutsche Welle. “Eles podem utilizar a vulnerabilidade do equipamento chinês para vigilância e outros fins maliciosos para continuarem no poder político.”