EQUIPA DA ADF
O recente levantamento do embargo de armas imposto pelas Nações Unidas à República Centro-Africana, que dura há 11 anos, foi elogiado como uma vitória diplomática, mas também suscitou preocupações quanto ao seu potencial para agravar a insegurança na região.
“O problema da segurança na África Central não pode ser resolvido apenas com a importação de armas,” os redactores do Corbeau News Centrafrique escreveram recentemente.
A corrupção, a falta de disciplina nas Forças Armadas Centro-Africanas e a contínua dependência do governo em relação aos mercenários russos continuam a ser os principais obstáculos à paz, de acordo com os editores do Corbeau.
O Presidente Faustin-Archange Touadéra convidou o Africa Corps da Rússia, na altura a corporação militar privada conhecida como Grupo Wagner, a entrar na RCA em 2018. Os mercenários foram ostensivamente contratados para treinar as suas forças armadas para combater os rebeldes da Coligação dos Patriotas para a Mudança (CPC) que tentam reinstalar o antigo Presidente François Bozizé, que vive no exílio na Guiné-Bissau e está sujeito a um mandado de captura internacional.
Bozizé foi afastado do cargo em 2013. Nesse mesmo ano, a ONU impôs o seu embargo de armas. Desde então, o país tem estado em guerra.
“Durante anos, o regime de Touadéra culpa o embargo de armas pela sua incapacidade de restaurar a segurança,” escrevem os editores do Corbeau. “No entanto, o levantamento do embargo não pôs fim à violência.”
O antigo Grupo Wagner tornou-se um dos principais actores da violência na RCA. Desde Dezembro de 2020, os mercenários russos mataram mais de 900 civis, o que os torna o grupo mais mortífero do país, de acordo com o Projecto de Localização de Conflitos Armados e Dados de Eventos.
Os mercenários russos começaram por ser conselheiros desarmados. No entanto, ao longo do tempo, a Rússia explorou a falta de aplicação do embargo e introduziu ilegalmente armas no país, muitas vezes, sob o pretexto de defender as suas actividades mineiras.
O analista Dami Fakolujo, que escreve para o site Spheres of Influence, observou recentemente que o embargo e outras medidas destinadas a travar a venda de armas falharam, em parte, porque os outros países não conseguiram aplicá-las.
As lacunas que permitiam a aquisição de armas pelas forças armadas nacionais significavam que essas mesmas armas acabavam frequentemente nas mãos dos rebeldes. Os grupos rebeldes e os seus apoiantes contrabandeavam habitualmente armas e munições para a RCA a partir da República Democrática do Congo e do Sudão.
“Além disso, países como a Rússia desrespeitam descaradamente estes embargos, o que leva a uma incapacidade de resolver as complexas causas socioeconómicas do comércio de armas,” escreveu Fakolujo.
Apesar do embargo, em 2017, verificou-se que a RCA possuía a segunda maior quantidade de armas ligeiras e de pequeno calibre ilegais entre nove países africanos estudados. Algumas dessas armas provinham do Chade e da RDC, de acordo com o Small Arms Survey, que monitoriza o tráfico deste tipo de armas.
As autoridades da RCA e os seus apoiantes na ONU argumentaram durante muitos anos que o embargo de armas os colocava em desvantagem contra os grupos rebeldes. Ao levantar o embargo de armas, a ONU continua a proibir a venda de armas a grupos armados até Julho de 2025. Manteve igualmente em vigor, até essa altura, sanções específicas contra determinados grupos e indivíduos.
O levantamento do embargo da ONU coincide com o actual colapso da CPC. Nos últimos meses, o grupo fracturou-se e enfraqueceu. Pelo menos uma facção contactou o governo para iniciar conversações de paz em Agosto. Outras facções da CPC e cerca de uma dezena de outros grupos rebeldes continuam a atacar civis.
Os peritos afirmam que o levantamento do embargo de armas à RCA poderá conduzir a uma maior insegurança, aumentando o fluxo de armas através das fronteiras, nomeadamente para o Sudão.
As Forças de Apoio Rápido do Sudão controlam o posto fronteiriço de Am Dafok com a RCA e utilizam essa capacidade para trazer armas e combatentes da RCA.
“Este quadro sombrio mostra que, para além dos apelos ao desarmamento e dos anúncios do levantamento do embargo, a República Centro-Africana está ainda longe da paz e da estabilidade,” escrevem os redactores do Corbeau. “A violência continua a assolar o país, exacerbada pelas forças que deveriam combatê-la.”