EQUIPA DA ADF
Minutos depois de deixar a sua filha na escola, no dia 23 de Agosto de 2021, Babita Deokaran regressou à sua casa, no sul de Joanesburgo, onde foi morta numa chuva de balas disparadas por assassinos profissionais.
A morte da directora financeira do Departamento de Saúde de Gauteng estava relacionada com a corrupção da COVID-19. Ela tinha sido uma denunciante que trabalhava como testemunha com as agências da lei na investigação de um escândalo relacionado com equipamento de protecção individual (EPI), avaliado em 20 milhões de dólares.
“Ela analisou as empresas que faziam negócios com o hospital e descobriu que havia centenas de empresas anónimas sem qualquer presença pública, que facturavam enormes somas para o departamento,” disse o jornalista Jeff Wicks, um dos membros da equipa de investigação da News24, da África do Sul.
O assassinato de Deokaran é simbólico da profundidade e do âmbito da corrupção estatal que tem assolado o continente. O flagelo da corrupção apareceu durante a pandemia, exacerbando os já devastadores efeitos da COVID-19 sobre as economias africanas. Mais de 100.000 sul-africanos morreram desde que a pandemia começou.
“A corrupção é a traição criminosa, imoral e máxima da confiança pública,” disse o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, em Outubro de 2020. “A resposta ao vírus está a criar novas oportunidades para explorar a fraca supervisão e transparência inadequada, desviando os fundos das pessoas na hora da sua maior necessidade.”
Em combinação com o Dia Africano de Combate à Corrupção, 11 de Julho, o Conselho Consultivo da União Africana Sobre a Corrupção (AUABC) e o Centro para Democracia e Desenvolvimento (CDD) apelaram os líderes africanos para melhorarem a gestão dos fundos da COVID-19 e evitarem a corrupção através de maior transparência.
“A corrupção e os fluxos financeiros ilícitos são males gémeos que impedem o progresso e o desenvolvimento de África. Lamentavelmente, a utilização dos fundos da COVID-19 também se tornou uma fonte de dilemas da corrupção em África,” disse o CCD.
“Infelizmente, os fundos e recursos da COVID-19 em muitos países são cercados de obscuridade e mau uso, complicado a situação da corrupção que já se encontra alarmente em África.”
A corrupção tem sido um grande problema em toda a África durante gerações.
Aquando da eclosão da pandemia, grandes somas de dinheiro fluíram a partir de agências doadoras para África. O Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional concederam cerca de 57 bilhões de dólares.
Christopher Stone, professor de práticas de integridade pública, na Universidade de Oxford, Inglaterra, disse que a COVID-19 foi um teste de resistência extremo para as instituições de combate à corrupção do continente.
“A corrupção gosta de uma crise, quanto maior, melhor,” escreveu numa publicação de um blog de Dezembro de 2021. “O motivo é óbvio, grandes crises levam os governos a gastarem grandes somas de dinheiro e rapidamente suspenderem os regulamentos e as verificações que procuram, em tempos normais, bloquear os caminhos da corrupção.”
Em toda a África, as políticas de responsabilização que faziam a monitoria do uso de fundos do governo foram relaxadas para acelerar as aquisições de bens e serviços essenciais e de EPI. Muitos países operaram sob um estado de emergência.
A corrupção cresceu:
- Dezenas de milhares de dólares de contratos irregulares levaram a África do Sul a suspender o seu ministro de saúde. A suspeita inflação de contratos do governo para aquisição de materiais médicos, avaliados em 900 milhões de dólares, também despertou indignação pública.
- A Comissão de Ética e Combate à Corrupção do Quénia acusou a Autoridade de Fornecimento de Material Médico do Quénia, gerida pelo Estado, de roubar cerca de 400 milhões de dólares destinados à aquisição de equipamento médico. O relatório do Auditor-Geral sobre as despesas da COVID-19 revelou o mau uso de mais de 69 milhões de dólares.
- O Ministro de Saúde do Zimbabwe foi demitido e enfrenta acusações de corrupção por adjudicar ilegalmente um contrato de milhares de dólares.
- Cerca de 333 milhões de dólares destinados à resposta dos Camarões à COVID-19, em 2020, foram mal utilizados, de acordo com uma auditoria de 2021.
- As autoridades governamentais malawianas, em articulação com entidades do sector privado, fizeram uso de 1,3 milhões de dólares em fundos destinados à pandemia.
Enoch Randy Aikins, um investigador do Instituto de Estudos de Segurança, sediado na África do Sul, disse que a maior parte das despesas da COVID-19 em África não foram auditadas.
“O continente não registou um verdadeiro progresso na detecção de corrupção através de auditorias adequadas para as despesas da COVID-19 por parte de governos e suas agências,” escreveu. “Estas auditorias são vitais e devem ser seguidas por investigações e por processos judiciais que possibilitem a recuperação do dinheiro do Estado.”
O AUABC e o CDD recomendaram o uso da tecnologia nos esforços.
“A tecnologia é uma ferramenta muito importante que deve ser aproveitada para melhorar a transferência e ajudar a reduzir oportunidades para corrupção,” declarou o AUABC no encontro do Dia de Combate à Corrupção. “Sistemas de aquisição electrónica e orçamentos digitalizados são uma grande vantagem na criação da confiança dos cidadãos.”
O Vice-Presidente da Transparência Internacional, Rúben Lifuka, apelou a UA e os seus membros a tomarem fortes medidas de combate à corrupção.
“Este é um momento crucial para a região africana e os seus povos,” referiu num comunicado. “Se não se abordar a questão da corrupção de forma urgente, ela irá bloquear os esforços para a construção depois da devastadora pandemia e as esperanças da região de criação de um caminho para um futuro mais forte.
“A gestão justa e transparente dos fundos de recuperação da COVID-19 de grande escala e a prevenção da saída ilegal de bilhões de dólares da região através de meios ilícitos deviam ser questões fundamentais para todos os líderes.”