EQUIPA DA ADF
Cerca de 75% das embarcações de pesca industrial do mundo não são rastreadas publicamente, sendo que muitas delas escondem as suas posições no mar, desligando os seus sistemas de identificação automática (AIS).
A prática, conhecida como “desligamento,” concentra-se sobretudo na África Ocidental e do Norte e no Sul da Ásia, de acordo com um novo relatório da revista Nature. Os investigadores determinaram este facto utilizando inteligência artificial, recolhendo dados dos AIS e analisando 2 milhões de gigabytes de dados de satélite da
Agência Espacial Europeia, entre 2017 e 2021.
A Global Fishing Watch liderou o estudo da Nature.
“Estas embarcações, anteriormente invisíveis, mudaram radicalmente o nosso conhecimento sobre a escala, o âmbito e a localização da actividade pesqueira,” Jennifer Raynor, autora do estudo e economista de recursos naturais da Universidade de Wisconsin-Madison, escreveu no The Conversation.
As embarcações desligam habitualmente para ocultar crimes, como a entrada em zonas proibidas, a realização de transbordos ilegais no mar e a utilização de explosivos para capturar grandes quantidades de peixe.
De acordo com a Financial Transparency Coalition (FTC), África perde anualmente cerca de 11,5 bilhões de dólares com a pesca ilegal, de longe o maior valor de qualquer região do mundo. A pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (INN) dizima as unidades populacionais de peixe e ameaça os meios de subsistência dos cerca de 5,2 milhões de pessoas que trabalham na pesca artesanal no continente.
O flagelo é perpetrado sobretudo pela frota de pesca em águas longínquas (DWF) da China, o pior violador mundial da pesca INN.
A China pescou ilegalmente nas zonas económicas exclusivas (ZEE) de mais de 80 países com mais de 10 milhões de horas de pesca entre 2019 e 2021, de acordo com um novo relatório da Investigative Journalism Reportika (Ij-Reportika).
A frota da DWF da China começou a aventurar-se muito para além da sua própria ZEE depois de ter esgotado as suas próprias unidades populacionais de peixe. De acordo com o Índice de Pesca INN, mais de 60% das suas embarcações estão envolvidas na pesca INN em todo o mundo. A pesca ilegal também está ligada a outros crimes marítimos, como a pirataria, o tráfico de seres humanos e o contrabando de droga.
A ameaça da pesca INN é mais grave na África Ocidental. Considerada o epicentro mundial da pesca INN, a região perde cerca de 2,3 a 9,4 bilhões de dólares por ano para a pesca INN, de acordo com a FTC.
Cerca de 20% do peixe capturado ilegalmente em todo o mundo provém de águas próximas da Gâmbia, Guiné, Guiné-Bissau, Mauritânia, Senegal e Serra Leoa, segundo a Ij-Reportika.
No final de 2023, os países da África Ocidental começaram a criar uma rede conjunta para combater a pesca INN com a mesma cooperação subjacente que reduziu a pirataria no Golfo da Guiné. A ideia do esforço combinado, conhecido como “África Azul,” surgiu na primeira Cimeira das Forças Marítimas Africanas, realizada em Cabo Verde, em Março de 2023.
O objectivo é reforçar a capacidade de aplicação da lei marítima na região, melhorar o conhecimento do domínio marítimo, estabelecer um quadro jurídico para processar as violações da ZEE e estabelecer quadros interagências para ligar os países, de acordo com o Instituto Naval dos Estados Unidos, que está a ajudar a coordenar o esforço.
O relatório da Nature também revelou extensas áreas de pesca anteriormente não mapeadas no Norte de África, particularmente nas águas de Marrocos e da Tunísia. O relatório revelou também que 21% a 30% da actividade dos navios de transporte e energia não constam dos sistemas públicos de rastreio.
“Tínhamos a ideia de que estávamos a perder uma grande parte da actividade que ocorre no oceano, mas não sabíamos quanto,” Fernando Paolo, um dos principais autores do estudo e engenheiro de aprendizagem automática na Global Fishing Watch, disse à New Scientist. “E descobrimos que é muito mais do que imaginávamos.”