EQUIPA DA ADF
Moçambique eclipsou outros países africanos como o principal fornecedor de pau-rosa à China, um material cobiçado pela sua utilização em mobiliário caro.
Moçambique enviou 20.000 toneladas métricas de madeira protegida internacionalmente para a China só em 2023, apesar de uma proibição de longa data de exportação de toros. Ao fazê-lo, Moçambique ultrapassou Madagáscar, Nigéria e Senegal como a principal fonte de pau-rosa da China. De acordo com os especialistas, esses países viram as suas reservas de pau-rosa nativo serem destruídas ou esgotadas pelas empresas madeireiras chinesas ou começaram a aplicar de forma mais rigorosa as proibições existentes em relação ao pau-rosa.
Grande parte dos madeireiros moçambicanos, tanto legais como ilícitos, fazem a colheita na província de Cabo Delgado, que continua a ser atacada pelos insurgentes da Ahlu Sunnah Wal Jamaah, que têm ligações com o grupo Estado Islâmico. Os insurgentes beneficiam financeiramente da exploração madeireira ilegal, de acordo com um relatório recente da Agência de Investigação Ambiental (EIA).
A EIA concluiu recentemente uma investigação de quatro anos sobre o contrabando de pau-rosa em Moçambique e descobriu que cerca de 30% do pau-rosa do país cresce em florestas controladas por insurgentes.
A extracção ilícita de pau-rosa contribuiu para a perda de mais de 4 milhões de hectares de cobertura florestal em Moçambique nos últimos 20 anos. O país continua a perder o equivalente a 1.000 campos de futebol de cobertura florestal todos os dias, de acordo com a Global Forest Watch.
“A hemorragia tem de parar,” Alex Bloom, da EIA, disse à Voz da América. “Moçambique tem uma proibição de exportação de toros desde 2017, mas podemos ver claramente que a China — o importador de mais de 90% da madeira de Moçambique — continuou com um volume maciço de importações de toros.”
Os investigadores da EIA rastrearam cerca de 300 contentores de um tipo de pau-rosa conhecido como pau-preto do porto da Beira para a China, entre Outubro de 2023 e Março de 2024. No total, os carregamentos totalizaram 10.000 toneladas métricas de pau-rosa no valor de mais de 18 milhões de dólares. Alguns dos carregamentos incluíam troncos não processados, o que violava a proibição de Moçambique de exportar qualquer tipo de toros.
A investigação da EIA concluiu que o contrabando de pau-rosa entre Moçambique e a China era impulsionado por três factores: má gestão das concessões florestais, abate ilegal de árvores e corrupção entre os funcionários portuários. Em conjunto, estes factores permitiram que a exploração madeireira ilegal crescesse sem controlo nas zonas controladas pelos insurgentes.
O pau-rosa é um termo genérico para várias espécies de árvores que produzem madeira de um vermelho intenso. A madeira é apreciada na China, onde é conhecida como “hongmu,” para fazer reproduções caras de mobiliário da Dinastia Ming. O pau-rosa é o produto da vida selvagem mais traficado do mundo, representando mais de um terço de todas as espécies contrabandeadas.
As árvores estão protegidas pela Convenção das Nações Unidas sobre o Comércio Internacional das Espécies Ameaçadas de Extinção (CITES), que limita a quantidade de troncos que um país pode extrair e exportar, garantindo simultaneamente a sobrevivência das espécies. A CITES atribui aos países receptores o ónus de detectar as violações da CITES.
A China proibiu a colheita do seu pau-rosa nativo em 1998, depois de o abate descontrolado ter devastado as reservas locais. As empresas madeireiras chinesas voltaram-se rapidamente para África, começando pela Gâmbia em 2001. No espaço de uma década, o pau-rosa da Gâmbia foi declarado extinto. Apesar disso, a Gâmbia continuou a exportar o pau-rosa, grande parte do qual colhido ilegalmente no Senegal.
Em 2017, o então Ministro do Ambiente de Moçambique, Celso Correia, afirmou que a exploração madeireira ilegal custava ao seu país meio bilhão de dólares por ano em receitas perdidas. Uma acção de fiscalização em 120 parques de madeiras detectou operações ilegais em mais de metade deles.
Moçambique tem trabalhado para acabar com a exploração madeireira insustentável e ilícita, impondo várias proibições de corte e exportação de toros há mais de 20 anos.
“Apesar destas múltiplas camadas de protecção, a pilhagem da floresta continua, uma vez que os comerciantes de madeira traficam a madeira explorando a instabilidade crónica e a corrupção em Cabo Delgado,” escreveram os investigadores da EIA no seu relatório intitulado “Shipping the Forest.”
Os comerciantes chineses contornam as proibições de exportação, em parte, misturando o pau-rosa comprado em Cabo Delgado com outros troncos legais em contentores de transporte, de acordo com a EIA. Também rotulam incorrectamente o conteúdo dos contentores de transporte para esconder os carregamentos de pau-rosa.
Se forem devidamente aplicadas, as proibições de exportação de madeira são fundamentais para proteger as florestas e sustentar os meios de subsistência, de acordo com Raphael Edou, director do programa de África na EIA.
“Moçambique deve reforçar as suas protecções florestais através da aplicação dos seus próprios regulamentos, e a China e as companhias transportadoras globais devem respeitar as leis moçambicanas e investigar os maus actores que as violam sistematicamente.”