EQUIPA DA ADF
Devia ser simples. Um médico receita um medicamento – um antibiótico para uma infecção ou talvez um antimalárico – e um farmacêutico de confiança distribui o medicamento ao doente. O paciente confia no produto e toma-o conforme indicado.
Mas a prevalência de medicamentos falsificados e de baixa qualidade em África e a correspondente falta de salvaguardas regulamentares e processuais implicam que, muitas vezes, os remédios não curam, ou até prejudicam, aqueles que os tomam. Nalguns casos, estes medicamentos falsos são dispensados nas ruas ou em farmácias não licenciadas, sem autorização médica.
O impacto económico dos medicamentos falsificados também é profundo. A Organização Mundial de Saúde diz que custa entre 12 milhões e 44,7 milhões de dólares por ano tratar doentes com malária que utilizaram medicamentos falsos ou de baixa qualidade na África Subsariana. Só entre Janeiro de 2017 e Dezembro de 2021, as autoridades apreenderam 605 toneladas de produtos suspeitos na África Ocidental. Algumas contrafacções chegam da China, da Índia e da Europa.
Um estudo recente da Universidade de Bahir Dar, na Etiópia, indica que mais de um quinto de todos os medicamentos em África podem ser falsos ou de baixa qualidade. A ONU estima que cerca de 500.000 pessoas morrem todos os anos na África Subsariana devido a estes medicamentos falsos.
“Nos últimos anos, os hospitais da Nigéria internaram mais de mil vítimas de reacções adversas a medicamentos, tais como erupções cutâneas, dores, dificuldade em respirar e até morte, devido ao uso de medicamentos falsos,” o Dr. Michael Omoke, da Nigéria, disse ao Organized Crime and Corruption Reporting Project, em Agosto.
Entre os medicamentos contrafeitos mais comuns contam-se os antibióticos e os antimaláricos. Em Agosto, a Agência Nacional da Administração e Controlo de Alimentos e Medicamentos (NAFDAC) da Nigéria emitiu um alerta público sobre uma contrafacção do antimalárico Lonart Suspension, um líquido que mistura dois medicamentos. O produto apresentava um número de registo de um medicamento diferente que tinha expirado há cinco anos.
Em 2022, a mesma agência alertou os consumidores para os falsos comprimidos do antibiótico Augmentin. Augmentin é um medicamento comum utilizado para tratar pneumonia bacteriana e infecções dos seios nasais, ouvidos, pulmões, pele e trato urinário.
Em Junho, a NAFDAC anunciou a destruição de 985 milhões de nairas (625.000 dólares) em produtos falsificados que incluíam medicamentos de qualidade inferior, falsos e falsamente rotulados, tais como psicoactivos, antibióticos, antimaláricos, analgésicos, remédios à base de plantas e comprimidos para a tensão arterial, de acordo com o site de notícias nigeriano Nairametrics.
“Não são meros produtos de qualidade inferior; são potenciais instrumentos de dano que podem devastar famílias e fazer descarrilar o progresso da nossa nação,” afirmou o Professor Mojisola Adeyeye, director-geral da Agência Nacional da Administração e Controlo de Alimentos e Medicamentos da Nigéria. “Ao destruirmos estes objectos, enviamos uma mensagem clara: não há lugar para produtos contrafeitos e não seguros na Nigéria.”
O problema é especialmente prevalecente no Sahel. Os produtos médicos são importados através dos portos marítimos do Golfo da Guiné antes de serem transportados para o interior de países como o Burquina Faso, o Chade, o Mali, a Mauritânia e o Níger. As elevadas taxas de doenças infecciosas, combinadas com a falta de disponibilidade de cuidados de saúde a preços acessíveis, significam que os pedidos são frequentemente satisfeitos fora dos canais formais e regulamentados. Isso cria espaço para os sindicatos do crime organizado transportarem a droga pelas rotas de tráfico estabelecidas.
Inovações como a tecnologia blockchain que rastreia a distribuição de medicamentos mostraram-se promissoras, mas os falsificadores tornaram-se adeptos da clonagem de rótulos raspados e outras medidas de segurança de embalagens, de acordo com o The Africa Report. Por vezes, os consumidores não verificam os rótulos para confirmar se se trata de um produto legítimo.
As autoridades de todo o continente reconhecem a importância de reforçar a regulamentação dos produtos médicos. Em Fevereiro de 2019, a Assembleia da União Africana criou a Agência Africana de Medicamentos (AMA) para melhorar o acesso do público a medicamentos e produtos médicos seguros e eficazes no continente. A proposta foi ratificada por 15 Estados-membros. Até à data, 28 já o fizeram.
Entre outras coisas, a AMA tem como objectivo apoiar o crescimento da produção farmacêutica local e avaliar produtos médicos para o tratamento de doenças prioritárias, tal como determinado pela UA. Também inspecciona, coordena e partilha informações sobre produtos autorizados para comercialização.
A AMA está encarregue de coordenar as inspecções conjuntas dos locais de fabrico e de trabalhar com as comunidades económicas regionais e as autoridades reguladoras nacionais para identificar produtos médicos de qualidade inferior e falsificados e ajudar a partilhar informações sobre os mesmos entre os países.