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Um Acordo Político Estrutural, assinado no dia 5 de Dezembro, entre a junta militar no poder no Sudão e um conjunto de grupos políticos civis, foi elogiado como sendo o primeiro passo no caminho para a democracia. Contudo, observadores receiam que as ligações próximas entre o membro da junta, o General Mohamed Hamdan Dagalo, e Moscovo podem fazer descarrilar a transição e manter o Sudão sob o controlo do exército.
Em Fevereiro de 2022, Dagalo, também conhecido como Hemedti, visitou Moscovo como parte de uma relação de longa data entre as suas Forças de Apoio Rápido (RSF) e apoiantes russos — com destaque para os mercenários do Grupo Wagner. Os mercenários do Grupo Wagner treinaram os membros das RSF, e os dois grupos operam conjuntamente a empresa de mineração do ouro através da qual o Grupo Wagner contrabandeia centenas de toneladas de ouro para fora do país.
“A viagem de Hemedti para fora do país … reforçou o seu perfil internacional e deu à Rússia acesso a uma figura fundamental do Sudão, com a qual ela não tinha entrado em contacto de uma forma significativa,” Sam Ramani, um antigo professor de Política e Relações Internacionais, da Universidade de Oxford, escreveu numa análise a ser publicada pelo Instituto do Oriente Médio.
Hemedti regressou da viagem comprometendo-se em aprofundar ligações com a Rússia e em aumentar a possibilidade de a Rússia abrir uma base naval na costa do Mar Vermelho, do Sudão.
Especialistas afirmam que a Rússia está a trabalhar para garantir que o Sudão permaneça nas mãos de governantes militares.
“O Kremlin sempre preferiu que o Sudão tivesse um governo autoritário que possa fazer acordos sem supervisão civil nem transparência,” Amgad Fareid Eltayeb, um analista e antigo vice-chefe do Estado-maior, em 2020 e 2021, no governo do então Primeiro-Ministro, Abdalla Hamdok, escreveu para o Conselho Europeu de Relações Exteriores.
Ao longo do ano de 2022, Hemedti e o líder do golpe, General Abdel Fattah al-Burhan, líder das Forças Armadas do Sudão, fizeram parte das negociações que tinham em vista uma mudança do Sudão para o governo democrático. A primeira fase daquele processo terminou com a assinatura, em Dezembro, de um Acordo Político Estrutural (FPA) que preconizava um governo dirigido totalmente por civis, sem o envolvimento do exército. A proposta do FPA é um abandono do Conselho de Soberania conjunto civil-militar, que governou depois da deposição do ditador Omar al-Bashir — e finalmente terminou com um golpe de Estado quando os civis se preparavam para assumir o controlo.
Os críticos observaram que o Acordo Político Estrutural faz pouco para restringir os líderes militares do Sudão. O exército está profundamente envolvido na economia do país, desde os campos agrários, passando pelas minas de ouro até ao equipamento militar.
“O doce acordo de Burhan tem em vista garantir que este sistema perdure,” o analista e defensor dos direitos humanos, Edward Thomas, escreveu para o Centro Carnegie do Oriente Médio.
Numa entrevista com o canal televisivo da Arábia Saudita, Al-Hadath TV, depois da assinatura do Acordo Estrutural, al-Burhan disse que o comandante em chefe civil do exército “concorda e ratifica” qualquer que seja a proposta do exército.
“Quando muito, o acordo podia entregar o poder burocrático aos civis enquanto mantém o poder político nas mãos de uma constelação de actores de segurança, essencialmente os próprios golpistas,” Kholood Khair, fundador do grupo de reflexão, sediado em Cartum, Confluence Advisory, escreveu para o Centro Carnegie do Oriente Médio.
O Acordo Estrutural eleva Hemedti de adjunto de al-Burhan para passar a ser seu homólogo, fazendo com que ambos sejam nominalmente responsáveis perante um presidente civil — um plano que “vê o Sudão dar um passo adiante, cada vez mais distante do governo civil e mais próximo de uma potencial guerra civil,” observa Khair.
Embora a Estrutura tenha ganho alguns elogios internacionais, ela foi assinada com a expectativa de que as suas condições seriam colocadas em vigor dentro de poucas semanas. Este prazo foi ultrapassado sem acção. A próxima fase do processo continua incerta.
“As perspectivas de que a Fase II ganhe legitimidade pública parecem pouco prováveis,” escreveu Khair.
As negociações pouco fizeram para reduzir o número e a escala dos protestos contra os golpes de Estado nas ruas de Cartum. A falta de uma reforma significativa está a fazer com que o público perca a fé no processo, de acordo com Khair.
A recente exposição do contrabando de ouro da Rússia também fez com que o sentimento do público mudasse contra a presença do Grupo Wagner, de acordo com Ramani.
Contudo, a combinação das ligações do Grupo Wagner com Hemedti, as RSF e os interesses empresariais lucrativos dos militares significam que é provável que pouca coisa mude no Sudão, afirmam os analistas.
“Embora o acordo pudesse potencialmente preparar a chegada de um governo civil, de nenhum modo equivaleria dizer que o Sudão está a tornar-se um Estado governado por civis,” Amal Hamdan, um especialista em eleições, que trabalha na transição do Sudão, escreveu para o Centro Carnegie do Oriente Médio.