EQUIPA DA ADF
Os caças modernos são maravilhas de potência e complexidade. Armados com mísseis ar-ar, podem atingir velocidades de 1.600 quilómetros por hora. São também incrivelmente caros. A actual geração de caças começa em cerca de 100 milhões de dólares cada, e estima-se que cada avião custará 1 bilhão de dólares em despesas operacionais e de manutenção ao longo da sua vida útil ideal.
Há também a questão da utilidade. Em tudo o que não seja combate aéreo e ataques com mísseis, um caça a jacto é um exagero. Desde o fim da Guerra Fria, as forças aéreas raramente voam em espaços aéreos muito disputados e são extremamente raros os casos em que enfrentam rivais militares avançados com sistemas de defesa e aviónicos sofisticados.
Actualmente, a guerra é, em grande parte, assimétrica e travada contra insurgentes e terroristas. É o caso, nomeadamente, de várias regiões de África. Não há combate ar-ar. Para este tipo de guerra, são necessárias aeronaves mais pequenas e mais manobráveis. Estas aeronaves de contra-insurgência, ou COIN, foram, muitas vezes, concebidas para servirem de treino para os pilotos. Custam apenas uma fracção do preço de um caça e a sua manutenção é muito mais fácil e menos dispendiosa. Podem ser adaptadas a novas utilizações em ataque ligeiro, reconhecimento e como “carrinhas do céu” utilitárias.
A página da internet sobre aviação, Key Aero, afirma que os aviões de ataque ligeiro são uma “fonte de poder aéreo barata e pronta a utilizar” para países preocupados com os custos e que enfrentam insurgência. O custo de funcionamento por hora destas aeronaves é normalmente de cerca de 2.000 dólares, ou seja, 2% a 4% do custo dos caças avançados. O custo inicial também é mais baixo, observou a Key Aero, com um caça COIN de base a partir de cerca de 10 milhões de dólares.
A Nigéria, com uma das maiores forças aéreas da África Subsaariana, foi uma das primeiras a reconhecer a utilidade dos aviões mais pequenos.
“Com a sua vasta experiência de combate, primeiro na Libéria, como parte da força de manutenção da paz do grupo de monitorização da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental, e depois na longa guerra contra o Boko Haram, a Força Aérea Nigeriana rapidamente descobriu que os seus caças rápidos de linha de frente eram muito menos úteis para apoio aéreo próximo do que os seus aviões de treino avançados Aero L-39 e Dassault Alpha Jet,” reportou o site de notícias Times Aerospace. “Estes últimos constituíram a espinha dorsal da campanha aérea da Nigéria contra o grupo insurgente islâmico, enquanto o tipo também foi utilizado operacionalmente por Camarões, Egipto, Marrocos e Togo.”
Alec Smith, analista de inteligência e defesa da Grey Dynamics, observou que os Estados Unidos consideraram a possibilidade de reduzir o seu programa de drones com o objectivo de utilizar aeronaves de COIN tripuladas.
“À medida que a guerra entre países se torna menos prevalecente e as insurgências localizadas se tornam mais problemáticas e difíceis de gerir, as aeronaves de COIN desempenharão um papel importante na mitigação e limitação do âmbito das operações de insurgências no futuro,” escreveu.
Estes aviões de COIN nem sempre se baseiam em aviões de treino. Em 2022, a Força Aérea dos EUA anunciou que tinha escolhido o AT-802U Sky Warden, produzido pela L3Harris Technologies e pelo fabricante de aeronaves agrícolas, Air Tractor, para assumir a sua missão Armed Overwatch, conduzindo operações de combate ao terrorismo e guerra irregular em locais como África. A revista Forbes informou que o Sky Warden é baseado num avião agrícola de propulsão única.
O Sky Warden foi escolhido devido à sua grande carga útil; à sua capacidade de disparar mísseis, drones e pequenas munições; e à sua capacidade de transportar vários sensores e até sete rádios tácticos em linha de vista e fora da linha de vista, referiu a Forbes.
As aeronaves de COIN não são apenas aviões tripulados de asa fixa; drones e helicópteros também têm sido utilizados na guerra assimétrica. No entanto, os helicópteros têm vulnerabilidades óbvias ao fogo em terra e os drones tendem a ser limitados por questões de linha de visão.
Smith observa que os helicópteros têm sido muito utilizados como aeronaves de COIN, mas têm limitações.
“Apesar das aparências, os rotores são, na verdade, incrivelmente frágeis,” disse à ADF num e-mail. “O fogo de armas ligeiras pode ser fatal para um helicóptero e, como os helicópteros tendem a voar mais baixo e mais devagar do que as aeronaves de asa fixa, estão mais expostos a este fogo terrestre potencialmente fatal. Os helicópteros desempenham certamente um papel importante nas operações de COIN, como a melhoria da mobilidade aérea e a evacuação de vítimas, mas só são úteis na medida em que as circunstâncias o permitam.”
OS PRIMÓRDIOS DE AERONAVES DE COIN
A utilização de aeronaves no combate à insurgência remonta quase aos primórdios da aviação. Porém, os historiadores dizem que as aeronaves de COIN modernas datam do início da década de 1950, quando os EUA começaram a fazer experiências com aviões de treino na Coreia e, anos mais tarde, no Vietname.
“Na Coreia, aviadores americanos voaram em versões armadas dos aviões de treino norte-americanos T-6 Texan com motor a pistão, apelidados de ‘Mosquitos,’ principalmente para a detecção de artilharia e controlo aéreo avançado,” escreveu Robert Dorr para The Year in Defense: Aerospace Edition, em 2010.
Ao longo dos anos, os peritos militares enumeraram as normas aceites para o êxito das aeronaves de COIN. São elas:
A aeronave deve ser durável, capaz de suportar longos períodos de utilização sem manutenção do motor ou dos aviónicos. A sua aquisição e manutenção devem ser economicamente viáveis.
Devem ser capazes de voar rapidamente em caso de emergência.
Devem ser suficientemente resistentes para sobreviver a aterragens bruscas em terrenos difíceis e não pavimentados. Idealmente, devem ser capazes de executar descolagens e aterragens curtas em pistas improvisadas.
Devem ser simples de pilotar. Os procedimentos operacionais simples facilitam a formação dos pilotos. A simplicidade de operação também facilita a manutenção da aeronave — um ponto crítico para manter uma frota aérea operacional.
Estas aeronaves devem ter a capacidade de atingir velocidades baixas de “espera,” combinadas com uma boa autonomia e um bom consumo de combustível.
Devem ser capazes de aceder rapidamente a zonas remotas, apoiando simultaneamente as tropas com reforços e abastecimentos.
Os programas de COIN tornaram-se cada vez mais importantes no final do século XX, quando as guerras assimétricas passaram a ser a norma. Alguns peritos afirmam que os drones poderão, no futuro, substituir as aeronaves de COIN tripuladas.
Key Aero diz que é demasiado cedo para assumir que os drones acabarão por substituir os aviões de COIN: “Por um lado, os drones não são necessariamente a ‘opção mais barata,’ como geralmente se supõe. Um relatório recente do … Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais observou que, a longo prazo, os drones podem custar tanto como os aviões tripulados. Os custos anuais de pessoal para um [drone] ISR MQ-9 Reaper, por exemplo, rondam os 3 milhões de dólares.”
Doug Barrie, do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, disse a Key Aero que as comparações de custos entre drones e aeronaves de COIN tripuladas podem ser enganadoras.
Inicialmente, disse, um avião tripulado de COIN vai ser mais caro. “Mas isso não tem em conta a formação, os satélites necessários a manter em órbita para que um [drone] funcione ou o apoio de retaguarda para a operação e exploração.” E, segundo ele, com um drone, “a não ser que se tenha uma ligação por satélite, estamos limitados a uma ligação de dados em linha directa de visão. É preciso investir numa capacidade de satélite ou pedir a alguém que o faça por nós.”
Smith disse à ADF que é “quase certo” que os drones vão dominar o domínio aéreo das operações de contra-insurgência no futuro, mas ainda há necessidade de aeronaves ligeiras de ataque.
“Isso não significa necessariamente que as aeronaves ligeiras e tripuladas não terão lugar no futuro; significa apenas que a sua prevalência será significativamente menor,” afirmou. “As aeronaves tripuladas continuarão a ser a principal ferramenta para operações em espaços aéreos contestados. As aeronaves tripuladas são úteis quando é necessário um certo grau de intervenção humana imediata no processo de tomada de decisões. As aeronaves tripuladas tendem a ser mais rápidas, por isso, quando é necessária uma resposta rápida a uma situação em desenvolvimento, os drones não são realmente a melhor opção.”
Empresa Sul-Africana Produz Nova Aeronave De Coin
EQUIPA DA ADF
O primeiro avião de vigilância e ataque de precisão Mwari, originalmente conhecido como AHRLAC, foi avistado em Moçambique, com marcas moçambicanas.
Em Março de 2023, a DefenceWeb informou que o avião, que pode ser utilizado em operações de contra‑insurgência ou COIN, foi visto na província de Cabo Delgado. Os dados de localização do voo mostraram-no a voar em torno de Nacala, no final de Janeiro de 2023.
AHRLAC é a abreviatura de advanced high performance reconnaissance light aircraft (avião ligeiro de reconhecimento avançado de alto desempenho, em Inglês). Segundo a DefenceWeb, este é o terceiro AHRLAC construído, depois de dois protótipos, e é uma das duas aeronaves de pré-produção. Voou pela primeira vez em Abril de 2022.
As aeronaves estão a ser produzidas pela Paramount Aerospace Industries, da África do Sul. Em Setembro de 2022, a Paramount declarou que quatro aeronaves estavam na linha de produção na fábrica do aeroporto de Wonderboom, perto de Pretória, e que havia encomendas de nove aeronaves a dois clientes. O avião foi concebido para competir com outras pequenas aeronaves a hélice, nomeadamente o bem-sucedido Embraer A-29 Super Tucano, fabricado no Brasil. Existem mais de 260 Super Tucanos em serviço em todo o mundo, incluindo na Mauritânia e na Nigéria.
O Mwari está a ser desenvolvido há mais de uma década. É o primeiro avião militar tripulado recentemente concebido na África do Sul desde que o helicóptero de ataque Rooivalk entrou em serviço em 1999. A produção foi adiada em Fevereiro de 2019 na sequência de problemas que incluíam disputas contratuais, de propriedade intelectual e de financiamento. Foi desenvolvido um plano de recuperação e a produção foi retomada em Setembro de 2022.
O Mwari é comercializado como uma alternativa relativamente barata aos aviões militares de topo de gama para vigilância, patrulha marítima e operações de contra-insurgência. Também pode ser utilizado para treinos. Tem um tecto de serviço de até 9,5 quilómetros e oferece uma velocidade máxima de cruzeiro de 460 quilómetros por hora, um alcance de missão de mais de 1.000 quilómetros com munições e um tempo de voo total de até 6,5 horas.
Os funcionários da empresa afirmam que a aeronave também oferece uma capacidade de descolagem e aterragem curta, com trem de aterragem retráctil optimizado para pistas de aterragem ou locais semi-preparados e não preparados. A aeronave apresenta uma configuração invulgar de motor de dupla lança, de um só propulsor e de asa alta montada para a frente. A empresa anunciou planos para vender os aviões por cerca de 10 milhões de dólares cada, o que é comparável a aeronaves de COIN semelhantes vendidas noutras partes do mundo.
A página da internet The National Interest noticiou que o Mwari está a ser comercializado especificamente para os países africanos. O site citou a empresa dizendo: “Os tipos de ameaças que os países de todo o mundo enfrentam mudaram significativamente nos últimos anos. Muitas das ameaças que enfrentam não justificam o custo operacional de caças rápidos.”
A empresa também tem planos para construir uma segunda aeronave, o Bronco II, que foi concebido para ser rapidamente desmontado, transportado e remontado no terreno por uma pequena equipa. A empresa planeia construir o Bronco II em Crestview, Florida, nos Estados Unidos.