EQUIPA DA ADF
No amanhecer do dia 22 de Julho, duas viaturas equipadas com explosivos explodiram, num ataque mortal na maior base militar do Mali, em Kati, a apenas 15 quilómetros a noroeste da capital Bamako.
Militantes islamitas entraram no acampamento, incendiaram viaturas parqueadas e roubaram duas viaturas do exército. Tiroteios pesados foram ouvidos durante uma hora antes de helicópteros sobrevoarem a base.
O Coronel Assimi Goïta, o líder da junta militar do Mali que geralmente fica em sua casa, na base, alegadamente foi levado depressa numa coluna que se dirigiu para Bamako.
Nunca antes em toda uma década de insurgência da al-Qaeda e dos militantes ligados ao Estado Islâmico tinha havido um ataque rebelde tão próximo da sede de poder no Mali.
Especialistas, como o pesquisador sénior, Héni Nsaibia, do Projecto de Localização de Conflitos Armados e Dados de Evento, observam que a insurgência está a aumentar apesar das promessas da junta de destruí-la.
Os recentes ataques demonstram “como o afiliado da al-Qaeda, Jamaát Nursat al-Islam wal-Muslimin (JNIM), continua a expandir as suas operações fora das suas fortalezas tradicionais no norte e no centro do Mali,” disse ao The Associated Press.
“Assim como em outros países do Sahel, como o Burquina Faso e o Níger… as grandes cidades, incluindo as capitais em si, estão cada vez mais a ser cercadas pelo firme alastramento da militância islamita que representa um cada vez mais crescente risco e desafio para o ambiente de segurança.”
A mais descarada dos pelo menos 15 ataques de Junho e Julho, a cena de Kati ainda ilustrou que os esforços de combate ao terrorismo da junta não foram capazes de fazer recuar a ameaça extremista.
Num comunicado emitido no final do dia do ataque de Kati, o exército procurou “garantir à população que a situação está sob controlo e que as pessoas podem voltar às suas actividades normais.”
Mas a normalidade e as actividades comerciais habituais deixaram de existir em Bamako.
O exército do Mali reforçou a segurança na capital e encerrou as principais estradas “para combater esta ameaça terrorista tanto em Kati como em Bamako.”
“Algumas estradas que levam ao acampamento militar ou à residência temporária do presidente também foram encerradas,” o porta-voz do exército, Coronel Souleymane Dembele, disse á AP. “Todos os dias prendemos terroristas em Bamako ou nas proximidades.”
Em Junho, um líder do JNIM fez ameaças, afirmando que a capital seria atacada em breve. Desde essa altura, os cidadãos sentiram o fardo do aumento da insegurança e das ameaças.
Os rebeldes recentemente emitiram um alerta ameaçador tendo como alvo aqueles que cooperam com o exército. A mensagem em áudio causou pânico quando foi colocada em circulação no WhatsApp.
“Quando virem algum carro kamikaze [carro-bomba suicida] vindo de uma longa distância, tendo o cuidado de evitar bares, locais de concertos, estádios de futebol, mercados, para atacar apenas acampamentos militares, devem compreender que [o exército] é o nosso alvo,” refere a mensagem.
“Mas se mostrarem que vocês e o exército são a mesma coisa, por que nós nos preocuparemos em atacar apenas o acampamento militar?”
Os mais recentes desenvolvimentos são um claro retrocesso para a abordagem desarticulada da junta militar em relação ao terrorismo, de acordo com Rida Lyammouri, pesquisador sénior do Centro de Políticas para o Novo Sul, sediado no Marrocos.
“Se estes grupos podem infiltrar-se e atacar a base mais protegida do Mali, em Kati, então, eles podem fazer o mesmo contra localizações estratégicas em Bamako,” disse à AP.
A insegurança aumentou desde que Goïta, que se autonomeou presidente da transição, depois do segundo de dois golpes militares de 2020, ordenou que as tropas francesas e a força da União Europeia abandonassem o país.
A junta também limitou as operações da força de manutenção da paz das Nações Unidas, MINUSMA.
Em seu lugar, o Mali convidou o tenebroso grupo de mercenários russos, Grupo Wagner, para ajudar a combater os rebeldes. Contudo, em vez de fazer progresso, o exército e os mercenários russos foram acusados de massacrar civis.
Ao revindicar o ataque de Kati, o JNIM disse que foi em resposta às atrocidades do Grupo Wagner.
“Dizemos ao governo de Bamako: se vocês têm o direito de contratar mercenários para matar pessoas inocentes e indefesas, então, nós temos o direito de destruir-vos e atacar-vos,” lê-se no comunicado.
Lyammouri disse que o aumento da frequência e intensidade dos ataques colocou ainda mais em perigo a estratégia de combate ao terrorismo de Goïta.
“A retirada das forças francesas certamente deixou um vão, principalmente ao nível da inteligência,” disse. “Isso coloca Bamako e outras áreas do país numa posição mais vulnerável contra os grupos jihadistas. Através de experiências anteriores, a prevenção de uma infiltração e ataques é muito difícil.”