EQUIPA DA ADF
Um dia depois de o exército russo ter invadido a Ucrânia, dezenas de pessoas protestaram do lado de fora da embaixada da Rússia na Cidade do Cabo, África do Sul.
Com a bandeira azul e amarelo do seu país enrolada à volta do seu corpo, Dzvinka Kachur juntou-se entoando cânticos de “Parem a Guerra, Parem o Putin” e falou à imprensa como porta-voz da Associação Ucraniana da África do Sul.
A sua voz soou com emoção enquanto apelava para um fim da agressão russa.
Kachur, uma investigadora do Centro de Transições para Sustentabilidade, da Universidade de Stellenbosch, da África do Sul, disse à ADF que a invasão da Rússia e os motivos que esta utilizou para justificar o ataque devem preocupar todos os países africanos.
“Eu penso que o continente africano ficará muito afectado por este conflito Rússia-Ucrânia,” disse. “Definitivamente que irá resultar em mais militarização. Irá causar um aumento nos preços dos combustíveis. Haverá falta de produtos alimentares. E os orçamentos militares pelo mundo irão aumentar, o que irá comprometer as despesas no desenvolvimento económico e no desenvolvimento social que é tão importante para África.
“É absolutamente devastador ver como os recursos estão a ser gastos neste momento na guerra da Rússia com a Ucrânia. Um valor significativo de ajuda humanitária e da ajuda para o desenvolvimento será desviado, não para os países africanos, mas sim para a Ucrânia. Por isso, penso que é interesse dos países africanos que este conflito termine o mais rapidamente possível.”
Especialistas estão preocupados com o facto de que o uso da agressão militar por parte da Rússia para procurar redesenhar os limites fronteiriços da Ucrânia possa criar precedentes perigosos em África, onde as fronteiras atravessam linhas étnicas e culturais.
No dia que antecedeu a invasão, o embaixador do Quénia nas Nações Unidas proferiu um discurso poderoso, condenando a “tendência das últimas décadas dos Estados poderosos, incluindo os membros do Conselho de Segurança, por violarem de forma flagrante as leis internacionais.”
O Embaixador Martin Kimani disse que a agressão militar russa evoca memórias da história colonial de África.
“O Quénia e quase todos os países africanos nasceram do fim do império,” disse durante uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU. “Na altura da independência, se tivéssemos escolhido criar Estados com base na homogeneidade étnica, racial e religiosa, ainda estaríamos a travar guerras sangrentas, mesmo depois de tantas décadas.
“Devemos concluir a nossa recuperação das cinzas de impérios mortos de uma forma que não volte a afundar-nos em novas formas de dominação e opressão. Rejeitamos o irredentismo e o expansionismo com qualquer que seja a base, incluído factores raciais, étnicos, religiosos ou culturais. Voltamos a rejeitar isso hoje.”
Uma semana depois, a ONU declarou que a Rússia estava a violar a carta da ONU numa votação em que 17 países africanos se abstiveram.
Seguiu-se uma onda de críticas.
Continuar a fazer negócios com a Rússia, que fornece equipamento militar aos países africanos e destacou mercenários para o continente, premeia e possibilita a agressão militar no mundo, afirmam os críticos.
“Não condenando abertamente a Rússia, os governos estão a contribuir para a violação das leis internacionais, mortes de civis e crises humanitárias,” disse a investigadora Kachur.
Kachur apelou a África do Sul, que se absteve da votação, para olhar para a sua própria história e estar do lado das pessoas que estão a ser oprimidas.
“É absolutamente imoral não condenar a invasão russa,” disse Kachur. “É contra a constituição da África do Sul e contra o espírito do movimento anti-apartheid.”
A embaixada dos EUA em Pretória apelou, no dia 3 de Março, para que a África do Sul assumisse uma postura mais forte contra a invasão russa.
Num comunicado de imprensa, a Secretária de Estado Adjunta para os Assuntos Africanos, Mary Catherine Phee, disse que a pandemia da COVID-19 demonstrou como uma crise na nossa região pode causar um impacto para o resto do mundo.
“Somos um mundo globalizado, e esta invasão afecta a todos nós,” disse. “Sejamos claros quanto àquilo que estamos a ver — estamos a ver um ataque injustificado da Rússia contra a Ucrânia, numa guerra contra a democracia, e isso pode acontecer com qualquer país. Fazer estes apelos agora garante que isso não aconteça numa outra região.”
Numa carta à Assembleia Geral da ONU, o embaixador sul-africano, Mathu Joyini, apelou para a “diplomacia e o diálogo,” mas não condenou especificamente a agressão da Rússia.
“Apelamos a todas as partes a abordarem esta situação num espírito de comprometimento, com todas as partes a respeitarem os direitos humanos e a manterem as suas obrigações nos termos das leis internacionais e leis humanitárias internacionais,” escreveu.