A crescente presença do Grupo Wagner da Rússia, em África, destacou os esforços contínuos do Kremlin de exercer a sua influência sobre o continente em 2021.
O assombroso grupo de empresas militares privadas ganhou destaque internacional — e causou uma reacção global — em Setembro, quando o governo de transição militar do Mali procurou chegar a um acordo que iria trazer 1.000 combatentes e instrutores militares russos para o país, a um custo de 10,8 milhões de dólares por mês. O governo russo nega ter ligações com o grupo.
Observadores estavam preocupados quanto ao desenvolvimento, observando que o Grupo Wagner tinha deixado um rastro de instabilidade pelo continente.
“Já sabemos como isso será [no Mali],” Joseph Siegle, director de pesquisa no Centro de Estudos Estratégicos de África, disse à revista Foreign Policy. “Eles ganharam influência sem precedentes [na República Centro-Africana (RCA)] e, em última instância, o Grupo Wagner ficou implicado em violações de direitos humanos, mortes extrajudiciais, violações sexuais e tortura.”
Siegle acrescentou que o grupo provavelmente terá acesso às minas de ouro, urânio e bauxite no Mali se o acordo for assinado.
Os mercenários do Grupo Wagner encontram-se na RCA desde 2017. Os militares russos agora servem como guarda-costas do presidente da RCA, Faustine-Archange Touadéra, e Valery Zakharov, um antigo oficial de inteligência militar russa, é conselheiro de segurança de Touadéra.
A presença do Grupo Wagner na RCA foi marcada por tácticas pesadas, violência indiscriminada e uma falta de sensibilidade linguística e cultural. Esses factores contribuíram para o aumento da oposição ao governo e aos mercenários em vez de contribuir para a sua redução.
“Pensamos que tinham vindo para cá para restaurar a paz ao nosso país. Agora gostaria que nunca tivessem vindo,” uma mulher chamada Fátima disse ao Financial Times. Fátima disse que a sua aldeia celebrou quando as forças russas reprimiram os rebeldes. Mas depois eles levaram o seu irmão e violaram-na repetidamente numa base militar, contou ela.
Na Líbia, o grupo violou o frágil cessar-fogo daquele país quando as suas forças sobrevoaram a cidade de Sirte numa aeronave militar, em Abril, de acordo com o The Libya Observer. O acto de sobrevoar foi uma outra acção feita pelos combatentes do Grupo Wagner para pôr em risco as tentativas de resolver as divisões da Líbia. Este acto viola o cessar-fogo negociado pela Comissão da Junta Militar 5+5, que representa o internacionalmente reconhecido antigo Governo do Acordo Nacional, baseado em Trípoli, e os seus oponentes, baseados em Tobruk.
Os combatentes do Grupo Wagner são leais aKhalifa Haftar, o general que fez uma tentativa de golpe de Estado em 2014 e tentou assumir o controlo de Trípoli, em 2019. Quando os combatentes do Grupo Wagner se retiravam dos arredores de Trípoli, em finais de 2020, plantaram minas terrestres em bairros civis.
No Sudão, onde o general Abdel Fattah al-Burhan assumiu o controlo do governo num golpe militar, em Outubro de 2021, existem crescentes ligações informais entre o Grupo Wagner e a Força de Apoio Rápido do Sudão. A Rússia, que está a negociar um acordo para a construção de uma base naval no Sudão, também já liderou uma campanha de informação — que resultou em três medidas de interrupção do serviço do Facebook — com intenção de criar dúvidas entre os jovens sudaneses sobre a eficácia de um governo civil, de acordo com um relatório do Conselho Atlântico.
O grupo esteve activo no Sudão desde a altura em que o antigo presidente Omar al-Bashir os convidou para treinar o exército daquele país, em 2017. As empresas mineiras ligadas ao Grupo Wagner vieram depois e ganharam acesso às minas de ouro como parte do acordo. Agora os observadores acreditam que a Rússia quer que o exército sudanês mantenha o poder para que ela possa continuar a ter acesso aos recursos naturais daquele país.
“A maior parte dos membros da comunidade internacional apoia uma transição democrática no Sudão, mas alguns quebraram o consenso. A Rússia emergiu como um dos facilitadores mais corajosos dos militares sudaneses, escreveu Mattia Caniglia, do Conselho Europeu de Relações Exteriores.
Os mercenários do Grupo Wagner também foram alegadamente enviados para Angola, Guiné, Guiné-Bissau, Madagáscar e Zimbabwe, de acordo um artigo da Bloomberg, publicado em Maio.
Em Dezembro, a União Europeia impôs sanções contra o Grupo Wagner, acusando-o de cometer violações de direitos humanos, incluindo tortura, execuções não autorizadas e realização de operações clandestinas a favor da Rússia, noticiou a Al-Jazeera. As sanções incluem proibições de viagem e congelamento de bens e foram concebidas para impedir que os governos trabalhem com este grupo.