EQUIPA DA ADF
Mineiros sudaneses estão a culpar os famosos mercenários do Grupo Wagner, da Rússia, por massacres ao longo da fronteira porosa entre o Estado de Darfur do Sul e a República Centro-Africana (RCA).
Testemunhas afirmam que o Grupo Wagner, com ligações próximas ao Kremlin, lutou para pilhar as ricas minas de ouro da região nos últimos meses, e os mercenários russos matavam muitos dos mineiros em pelo menos três principais ataques.
Dois mineiros sudaneses que sobreviveram aos ataques, em Março, perpetrados por mercenários do Grupo Wagner, disseram que ficaram detidos durante dias e foram vítimas de tortura.
“Existem combatentes multinacionais na empresa de segurança russa,” uma das testemunhas disse ao site de notícias, Middle East Eye (MEE). “Vimos combatentes provenientes da Rússia, Síria e outros países africanos, incluindo a República Centro-Africana e outros.”
Num comunicado do dia 24 de Junho, a Ordem de Advogados de Darfur (OAD) disse que tem documentado o Grupo Wagner no Darfur do Sul, “deste o ano passado.”
A ordem afirma que tem fotografias de mercenários russos nas ruas e nas pastelarias de Um Dafuq, uma aldeia do Darfur do Sul próxima das minas de ouro artesanais tradicionais. A OAD registou testemunhos de familiares de pessoas do Darfur do Sul, que alegadamente foram mortas por mercenários do Grupo Wagner, na região próxima da fronteira com a RCA.
A OAD disse, num comunicado do dia 11 de Junho, que o embaixador da Rússia em Cartum negou que o Grupo Wagner opera no Sudão.
As autoridades sudanesas fizeram a mesma refutação repetidas vezes, mas especialistas e diplomatas de todo o mundo possuem uma perspectiva diferente.
“Foi o pior segredo guardado no Sudão que operativos do Grupo Wagner estavam a trabalhar aqui e a apoiar o exército,” Kholood Khair, gestor da Insight Strategy Partners, em Cartum, disse ao site de notícias Al-Monitor. “É apenas uma função de maior supervisão da comunidade internacional sobre quão próximo o exército sudanês está da Rússia e o que isso pode significar para a região.”
Pauline Bax, directora-adjunta do programa do Grupo Internacional de Crise, de África, disse que os recentes ataques parecem mais ser rusgas e pilhagens do que tomar as áreas e extrair recursos naturais.
“Há relatos regulares de atacantes que chegam de helicóptero, matando mineiros artesanais e rebeldes, levando tudo que podem e depois partindo,” disse ela ao jornal britânico The Guardian. “Por vezes, eles regressam depois de cerca de um mês e fazem a mesma coisa. Não tem nada a ver com garantir a segurança de um local de extracção mineira.”
A presença do Grupo Wagner em zonas de exploração mineira de ouro aumentou desde que os governos de todo o mundo aplicaram sanções massivas contra a Rússia, por causa da sua guerra na Ucrânia.
A OAD atacou a todos “que permitem que empresas explorem a riqueza dos residentes de uma área, sem a sua participação.”
Também lançou a culpa às Forças de Apoio Rápido (FAR), um grupo paramilitar sudanês dirigido pelo General Mahomed “Hemetti” Hamdan Dagalo.
Um dos principais líderes do golpe de Estado do Sudão, havido em Outubro de 2021, Hemetti também é vice-presidente do Concelho Soberano da junta e tornou-se um dos mais ricos no Sudão, depois de as FAR terem assumido o controlo das minas de ouro da região de Darfur, em Novembro de 2017.
Hemetti visitou a Rússia, no dia 23 de Fevereiro, na véspera da invasão da Rússia à Ucrânia.
De acordo com o analista político, Magdi El Gizouli, foi uma viagem “organizada pelos mercenários do Grupo Wagner, da Rússia, de modo a garantir a sua continuação no poder para que eles possam continuar a pilhar os recursos do país,” noticiou a rádio Dabanga, do Sudão.
Em Abril, o serviço de notícias da Bloomberg fez uma reportagem sobre uma grande operação de processamento de ouro ligada ao Grupo Wagner, através de uma empresa sancionada internacionalmente chamada Monroe Gold.
O Tesouro dos EUA descreveu aquelas ligações como sendo “uma integração entre as operações paramilitares da Rússia, o apoio para preservar os regimes autoritários e a exploração de recursos naturais.”
O investigador Eric Reeves, membro do Instituto do Vale do Rift, disse que o Grupo Wagner encontrou a sua “contraparte sudanesa perfeita” em Hemetti.
“O roubo da riqueza nacional sudanesa por Hemetti e a sua milícia FAR atingiu proporções alarmantes,” publicou no Twitter, no dia 27 de Junho. “Não devíamos ficar surpresos que [Vladimir] Putin, da Rússia, esteja a fazer tudo o que pode para ajudar a continuação de Hemetti na sua actual posição de poder e as actuais políticas favoráveis para com a Rússia.
“De forma perversa, a guerra de Putin contra a Ucrânia está a fazer com que os alimentos fiquem menos disponíveis para o Sudão, Darfur em particular, enquanto a fome espreita.”
Bax disse que os mineiros do Sudão e da RCA estão a pagar o mais alto preço pela necessidade de ouro do Grupo Wagner e de Putin.
“O Grupo Wagner tem sido um veículo conveniente, porque não é uma entidade legal e não precisa de seguir quaisquer normas,” disse ela ao MEE.“O governo [da RCA] não tem dinheiro para pagar ao Grupo Wagner pelos serviços. O Grupo Wagner, por conseguinte, precisa de pagar a si própria através dos rendimentos da mineração.
“Infelizmente, os mineiros artesanais são um dano colateral.”