EQUIPA DA ADF
Quando uma multidão de mais de 1.000 pessoas se juntou na praça nacional de Ouagadougou depois do anúncio de um golpe de Estado militar, houve algo que era raro de se ver: bandeiras russas a serem acenadas em jeito de celebração.
O terceiro golpe de Estado da África Ocidental em oito meses despertou alarmes entre os especialistas que conseguem ver um padrão: onde há instabilidade, a Rússia aparece pronta para explorar.
“É apenas uma questão de tempo,” o jornalista nigeriano, Philip Obaji Jr., disse à ADF. “A partir daquilo que me foi dito por fontes do exército burquinabê, ainda não existe presença russa naquele país, mas isso pode mudar muito em breve.”
Os terroristas sahelianos afiliados ao al-Qaeda e ao grupo do Estado Islâmico entraram em Burkina Faso em 2015 e mataram milhares de burquinabês. A violência deixou mais de 1,4 milhões de pessoas deslocadas.
O presidente, Roch Marc Christian Kaboré, o primeiro líder eleito democraticamente naquele país, esteve sob uma pressão crescente enquanto os ataques aumentavam ao longo de vários meses antes da sua deposição.
Em Dezembro de 2021, ele promoveu o Tenente Coronel Paul-Henri Sandaogo Damiba, de 41 anos de idade, para fortalecer o apoio no exército e liderar o sector de segurança em Ouagadougou.
Em vez disso, Damiba liderou a junta que assumiu o controlo do país.
Obaji transmitiu a notícia de que Kaboré tinha sido deposto no dia 24 de Janeiro de 2022, depois de recusar duas vezes o apelo de Damiba naquele mês de lutar contra os terroristas, contratando o Grupo Wagner, uma empresa militar privada da Rússia.
Embora a Rússia não confirme ter uma ligação formal com o Grupo Wagner, os seus mercenários estiveram envolvidos com a junta do Mali e na República Centro-Africana (RCA), onde foram acusados de cometer atrocidades contra a população e de praticarem a extracção de recursos minerais.
Rumores e sinais de interesse da Rússia no Burkina Faso continuam a aumentar nestes últimos meses. O país, que adquiriu helicópteros e armamento russos no passado, viu uma barreira da propaganda pró-Rússia nas redes sociais.
Em Novembro de 2021, os protestantes de três cidades bloquearam uma coluna do exército francês quando se dirigia para o Níger. Alguns burquinabês empunhavam bandeiras russas e cantavam “abaixo a França.”
“Os russos estão a manobrar,” jornalista sénior do canal France 24, Cyril Payen, disse durante uma transmissão. “Estão a tentar preencher a lacuna dos franceses. Existe uma grande guerra de informação, utilizando as redes sociais. As pessoas estão muito vulneráveis a isso. É uma situação muito volátil neste momento.”
Quando o golpe de Estado burquinabê foi anunciado numa transmissão em directo, os seus líderes citaram a incapacidade do anterior governo de reprimir a insurgência como a justificação para assumir o poder.
Depois do golpe, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) e a União Africana suspenderam a categoria de membro do Burkina Faso, mas nenhum dos órgãos anunciou sanções, na esperança de negociar um período claro para que aquele país retorne a um governo civil.
O Ministro do Negócios Estrangeiros do Níger, Hassoumi Massoudou, descreveu a ironia de a junta recorrer ao Grupo Wagner para obter ajuda.
“Não compreendemos que os líderes militares, depois de terem fracassado no campo de batalha, assumem o poder político e chamam os mercenários para defender a integridade do seu território,” disse durante uma reunião virtual da CEDEAO, no dia 28 de Janeiro.
Especialistas alertaram que a imposição de sanções num país que historicamente teve dificuldades económicas e militares pode aproximar cada vez mais o Burkina Faso da Rússia.
Um dia depois do golpe, dois russos proeminentes aplaudiram a junta.
Yevgeny Prigozhin, que os especialistas acreditam ser o responsável pela gestão do Grupo Wagner e que é um associado próximo do presidente russo, Vladimir Putin, saudou o golpe de Estado como sendo “uma nova era da descolonização,” numa publicação da rede social russa VK, da sua empresa, Concord.
Alexander Ivanov, o representante oficial dos formadores do exército russo na RCA, emitiu um comunicado, oferecendo-se para treinar o exército burquinabê.
“Acredito que se os instrutores russos forem convidados para treinar o exército do Burkina Faso, podem fazê-lo de forma eficaz,” escreveu.
O Burkina Faso não respondeu oficialmente, fontes disseram a Obaji. Mas eles esperam que Damiba, que realizou uma cerimónia de investidura no dia 16 de Fevereiro, num esforço de legalizar o seu cargo como presidente do Burkina Faso, irá aceitar a oferta de Ivanov.
“Os russos estão à espera de descobrir que papel irão desempenhar quando o novo governo estiver totalmente constituído,” disse Obaji. “Neste momento, a junta quer concentrar-se em assuntos políticos e diplomáticos, incluindo ter deliberações razoáveis com a CEDEAO.
“O Burkina Faso precisa de ajuda do exterior para poder lidar com a crescente onda de violência. Mas as sanções irão privá-lo da ajuda militar que recebe do Ocidente e deixarão o Burkina Faso a mercê da Rússia, que está à espera para entrar.”