EQUIPA DA ADF
Enquanto os países africanos recebem milhares de doses de vacina para lutar contra a pandemia da COVID-19, eles enfrentam um novo desafio: fazer com que os cidadãos arregacem as mangas.
Uma combinação de falta de confiança e desinformação está a causar uma desaceleração nos esforços do continente de acabar com a pandemia, afirmam os especialistas em saúde pública. Enquanto o governo luta para convencer os seus cidadãos que a pandemia é real e que as vacinas são eficazes, os maus actores, incluindo alguns que têm o apoio da China e da Rússia, atacam os africanos com campanhas de desinformação destinadas a descredibilizar as vacinas mais eficazes.
Na confusão que disso resulta, os países estão a preparar-se para uma terceira vaga de infecções, mesmo numa altura em que estão a destruir doses de vacinas não utilizadas.
O Malawi e a África do Sul disseram que terão de destruir algumas doses de vacinas. O ministro de saúde da Serra Leoa, Austin Demby, disse que um terço das 96.000 doses do seu país irão expirar antes de poderem ser utilizadas porque as pessoas consideram a COVID-19 uma ameaça menos relevante do que o Ébola.
Na Nigéria, o sentimento do público é de que a COVID-19 é uma fraude e que o governo não é de confiança.
“Os nigerianos estão preocupados com como e onde estas vacinas contra a COVID trazidas para a Nigéria foram obtidas/adquiridas,” Ifeoluwa Asekun-Olarinmoye, professor de saúde pública e epidemiologista na Universidade de Babcock, Nigéria, disse à ADF. “A maior parte dos cidadãos possui uma desconfiança inerente do governo nigeriano e na sua habilidade de desenvolver e disponibilizar vacinas eficazes.”
Suspeitas semelhantes circulam na África do Sul — o país com o maior número de casos de COVID-19 no continente — sobre a credibilidade do governo e a fiabilidade do sistema de saúde.
Numa pesquisa feita em 15 países africanos, em Dezembro de 2020, a maior parte das pessoas disse ao Centro Africano de Controlo e Prevenção de Doenças (Africa CDC) que estaria disposta a receber a vacina contra a COVID-19 caso esta fosse segura e eficaz. Contudo, desde que as vacinas começaram a chegar no continente, em Fevereiro de 2021, o entusiasmo pela vacinação tem sido fraco.
Seis semanas depois de receber 500.000 doses da vacina da facilidade internacional COVAX, a Costa do Marfim distribuiu menos de 18% delas. A desinformação que se propaga naquele país apresenta a COVID-19 como uma crise fabricada por estrangeiros.
“Existe muito medo e suspeita à volta das vacinas,” enfermeiro Solomon Sadia Koui disse ao serviço de notícias Bloomberg, enquanto esperava por pessoas que viessem ao centro de vacinações em Abidjan. “As mulheres perguntam se as vacinas farão com que elas fiquem estéreis.”
Na Somália, o al-Shabaab está a dizer falsamente às pessoas que estão a ser utilizadas como cobaias dos fabricantes de medicamentos. Nos Camarões, algumas pessoas estão a ser ditas que as vacinas são uma forma de as empesas tirarem proveito dos africanos.
A Ministra de Saúde do Uganda, Jane Ruth Aceng, enfrenta acusações de ter fingido receber uma vacina, o que fez com que ela publicasse um vídeo no Twitter a mostrar o momento em que recebia a vacina e a apelar: “Por favor, parem de espalhar notícias falsas!”
No meio de tudo isto, a sucursal da Rede Global de Televisão da China (CGTN), sediada no Quénia, e quatro sítios da internet ligados aos serviços de inteligência russa publicaram reportagens que criticavam as vacinas do Ocidente, como uma forma de promover as vacinas dos seus próprios países.
O Zimbabwe adoptou as vacinas chinesas, que ainda não ganharam a aprovação da Organização Mundial de Saúde. Até então, menos de 20% dos zimbabweanos receberam a vacina.
O Director do Africa CDC, John Nkengasong, espera que o sentimento do público mude a favor das vacinações, numa altura em que o continente avança com um plano para vacinar 60% dos seus 1,3 bilhões de residentes, até finais de 2022.
Durante uma actualização semanal sobre a COVID-19, Nkengasong reconheceu a hesitação generalizada em relação à ideia de receber a vacina.
“Enquanto as pessoas recebem as suas vacinas, isto irá mudar,” disse ele. “Quando virem pessoas que conhecem a receberem as vacinas, isso irá, com certeza, fazer com que haja um aumento de pessoas dispostas a receber a vacina.”