EQUIPA DA ADF
A sobrepesca descontrolada, motivada por demanda de farinha de peixe e da indústria de óleo de peixe a nível global, está a causar insegurança alimentar na África Ocidental.
Pescadores artesanais da região, chateados com a situação, denunciaram a presença de fábricas de produção de óleo de peixe e farinha de peixe, as quais eles culpam por dizimar as unidades populacionais de peixe, destruir os ecossistemas e reduzir as receitas do turismo. As fábricas, na sua maioria controladas e operadas por chineses, pressionam a sardinela, o Bonga e outras espécies, para extracção de óleo e esmagam-nos, transformando-os em pó para exportar e servirem de alimento para os seus animais de criação e para peixes da piscicultura em todo o mundo.
Parte do peixe da aquacultura e do camarão é posteriormente trazida de volta para África Ocidental como um produto importado dispendioso. As unidades populacionais de peixe esgotadas fizeram com que os preços do peixe a nível local disparassem.
Muitas das fábricas são abastecidas por arrastões industriais de pesca estrangeiros, que na sua maioria são provenientes da China. Aquele país possui a maior frota de pesca em águas longínquas do mundo e possui o pior registo de pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (INN) do mundo, de acordo com o Índice de Pesca INN.
Durante anos, as partes interessadas do sector pesqueiro da África Ocidental expressaram descontentamento contra a forma como os seus governos lidavam com a pesca INN e contra a proliferação de fábricas de produção de alimentos à base de peixe. Em Março de 2021, os protestantes contra as fábricas na Gâmbia incendiaram uma esquadra da polícia em Sanyang e atearam fogo na fábrica de farinha de peixe chinesa designada Nessim Fishing and Fish Processing Co.
“Os governos da África Ocidental criaram um modelo económico que beneficia os ricos e as economias desenvolvidas em vez de beneficiar o nosso próprio povo,” Aliou Ba, activista sénior para a área de oceanos na Greenpeace África, disse ao The Guardian. Os Estados da África Ocidental devem livrar-se destas indústrias destrutivas e assumir as suas responsabilidades de modo a preservar a segurança alimentar, os empregos e o bem-estar das populações.
Em 2021, projectava-se que 23,6 milhões de pessoas da África Ocidental enfrentariam uma insegurança alimentar de nível de crise, —um aumento de 40% dos níveis registados em 2020, de acordo com o Centro de Estudos Estratégicos de África (ACSS).
Embora o ACSS tenha observado que a COVID-19, os conflitos e a má gestão política contribuíram para a crise alimentar, as unidades populacionais de peixe da região estiveram em rápido declínio durante décadas, causando o desemprego e a fome entre as comunidades de pescadores que há muito dependiam dos mares para obtenção de alimento e de rendimento.
A proporção de pessoas que se considera estarem em insegurança alimentar na Gâmbia aumentou de 5% para 8% nos últimos cinco anos, em parte devido à flutuação da abundância de bonga que é o alvo das fábricas de alimentos feitos à base de peixe, de acordo com um relatório da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Cerca de 200.000 gambianos dependem da pesca e de trabalho relacionado para obtenção de rendimento.
Muitas áreas ao redor das fábricas ficaram tão poluídas que o turismo chegou a ficar paralisado.
No Gana, a primeira fábrica de alimentos à base de peixe foi aberta em 2011. Desde essa altura, pelo menos três outras fábricas emergiram, de acordo com o relatório da FAO. Os efeitos sobre as populações de peixe foram drásticos. Entre 2012 e 2017, a quantidade total de capturas anuais de pequenas espécies de peixe pelágico reduziu de 134.000 toneladas para 119.000 toneladas.
Uma espécie, a sardinela aurita, já entrou em colapso total. Nos últimos 15 anos, a média anual de rendimento por canoa artesanal baixou para até 40%, de acordo com a Fundação para a Justiça Ambiental.
Entre 2011 e 2018, sete novas fábricas de alimentos à base de peixe abriram no Senegal, enquanto a FAO comunicava que duas outras fábricas estavam a ser construídas.
Assim como em outras partes da região, as fábricas reduziram drasticamente o fornecimento de peixe que historicamente tem sido capturado, vendido e consumido pelos pescadores artesanais e suas comunidades.
“É necessário que haja uma abordagem holística ao avaliar as oportunidades de melhorar, optimizar ou reduzir o uso de fábricas de farinha de peixe e óleo de peixe para a produção [de alimentos à base de peixe],” refere o relatório da FAO. “A complexidade da situação deve ser compreendida de forma abrangente, especialmente em regiões subdesenvolvidas e terão de ser encontradas soluções adequadas a nível local em parceria com os actores relevantes.”