EQUIPA DA ADF
Existem sinais de progresso na guerra civil de 19 meses que colocou a Etiópia num caos e deixou milhares de pessoas deslocadas. Foi essencialmente negociado um acordo de cessar-fogo, em Março, e colunas de ajuda humanitária estão a alcançar as zonas afectadas pela seca e fome. Em Maio, o enviado da União Africana, Olusegun Obasanjo, negociou a soltura de 4.200 prisioneiros de guerra no que foi designado de “exercício de criação de confiança.”
“Agora existe uma verdadeira oportunidade para resolução política e diplomática do conflito,” disse Obasanjo, no início deste ano.
Entretanto, ainda persistem grandes barreiras para uma paz duradoura. Especialistas afirmam que se a Etiópia pretende evitar um regresso à guerra, ela deve resolver os vários obstáculos. A ADF falou com o Dr. Bizuneh Getachew Yimenu, um especialista em matérias de federalismo etíope e professor de política na Universidade de Kent, sobre o perigoso caminho para a paz.
Armas e Milícias
Existem centenas de milícias étnicas, forças alinhadas regionalmente e outros grupos armados espalhados pelas zonas rurais da Etiópia. Essas forças não reconhecem o Estado de direito e foram acusadas de alguns dos piores crimes de guerra.
Os mesmos grupos representam uma ameaça constante para um regresso ao conflito armado.
Bizuneh afirma que a solução é envolver alguns dos principais grupos no processo de paz se eles estiverem dispostos a renunciar à violência. “O diálogo político que se a vizinha deve inclui-los de modo a atender as insatisfações legítimas desses grupos rebeldes e trazê-los para a mesa de negociação,” recomendou. “Isso iria desencorajar o surgimento de outros grupos rebeldes. Mas quanto mais o governo reage aos grupos rebeldes com violência, maiores são as possibilidades de forças adicionais emergirem em todo o país.”
Outros grupos violentos, formados com base em etnias, que se recusarem a entregar as armas, poderão ser combatidos com força militar, disse Bizuneh. Há algumas evidências de que a Etiópia está a começar este processo. Em Maio, as forças governamentais prenderam mais de 4.000 pessoas afiliadas à milícia Fano, um grupo étnico Amara acusado de crimes de guerra.
Bizuneh observou que uma paz duradoura exigirá que o governo detenha o fluxo de tráfico de armas para o país. “O governo realizou muitas operações de modo a acabar com esta ameaça de armas ilegais, mas ela ainda continua,” considerou. “Isso constitui um campo fértil para os rebeldes em muitas partes do país.”
Animosidade Étnica
Na Etiópia, existem mais de 80 grupos étnicos com igual número de línguas faladas. Para equilibrar a representação política no país, a Etiópia adoptou o federalismo étnico, em 1991, que demarcou as regiões com base nos grupos étnicos. Contudo, nos últimos anos, esses limites foram transformados em linhas de fractura. Facções étnicas pegaram em armas contra o governo central e uns contra os outros. No Tigré ocidental, por exemplo, houve alegações credíveis de limpeza étnica, em que civis tigrenhos foram mortos e enterrados em valas comuns.
Bizuneh disse que esforços recentes para centralizar o poder no governo federal fazem com que os grupos étnicos, incluindo os Oromo, Somalis e vários grupos étnicos do sul, se sintam marginalizados. Disputas de terra transformam-se em conflitos sangrentos. “Não existe um mecanismo que mantenha ligadas as regiões e os grupos étnicos entre si,” disse.
O que é preciso ter, em primeiro lugar, é a paz e a segurança seguidos de uma ênfase renovada sobre a “democratização” para que todos os grupos sintam que têm voz. Para isso, a Etiópia pode olhar para outros sistemas multiétnico federais como Índia, Suíça e até Nigéria.
“O caminho a seguir, daqui em diante, deve ser democratização, revitalização do sistema federal e aumento da solidariedade inter-regional e étnica através de diferentes instituições,” disse.
Actores Externos
Para além das suas divisões internas, a Etiópia enfrenta hostilidades perpetradas por actores externos que podem desempenhar um papel desestabilizador. Existe uma disputa em curso com o Sudão, relacionada com a região conhecida como al-Fashaga. O Egipto expressou o sentimento de ira em relação ao enorme projecto hidroeléctrico da Etiópia sobre o rio Nilo, conhecido como a Grande Barragem do Renascimento Etíope. E, desde 2020, o vizinho do norte da Etiópia, a Eritreia, enviou forças para o Tigré, onde são acusadas de cometer crimes de guerra.
Disputas com qualquer um desses países podem colocar em perigo a frágil paz.
“Actualmente, todos os problemas locais deixam de ser locais por causa da globalização,” disse Bizuneh.
Contudo, ele acredita que a Etiópia deve olhar primeiro para dentro de si e posteriormente procurar lidar com as ameaças externas com uma voz unificada. “Se a Etiópia resolver os seus problemas internos pacificamente e reforçar a unidade, principalmente a unidade interétnica e inter-regional, é possível minimizar a pressão de forças externas,” disse.
O problema da Eritreia irá exigir um cuidado particular, uma vez que é uma parte do conflito e recentemente, em Maio, as suas forças estavam a bombardear a cidade etíope de Shiraro, na região fronteiriça. Por necessidade, elas estarão na mesa de negociação, disse Bizuneh. “O caso da Eritreia é muito importante e merece atenção especial,” disse. “O governo federal não pode apenas deixar de lado a Eritreia, tendo em consideração o papel que eles empenharam até agora.”