EQUIPA DA ADF
A guerra civil da Etiópia, na região norte de Tigré, já se arrastou por mais de seis meses.
O que o Primeiro-Ministro, Abiy Ahmed, inicialmente chamou de “uma operação de exigência do cumprimento da lei” contra à Frente de Libertação do Povo do Tigré (TPLF) acaba de transformar-se num caos marginal. O gabinete dos direitos humanos das Nações Unidas afirma que todas as partes envolvidas são acusadas de cometer crimes de guerra contra civis.
Não se vislumbra um fim à vista, e o conflito já motivou disputas violentas nas fronteiras dentro de Estados semiautónomos e etnicamente separados da Etiópia e com países vizinhos.
Quando Abiy se consolidou no poder, em 2019, através da dissolução do partido no poder, prometeu que iria realizar eleições livres e justas. Ele lançou-se como o candidato da unidade, com o seu recém-formado Partido da Prosperidade, prometendo democratização, harmonia, reconciliação e liberalização da economia dirigida ao nível federal.
Mas a Etiópia, que alguma vez já foi o bastão da estabilidade no Corno de África, nunca estive tão dividida.
Abiy culpa “a política e a violência baseada na identidade.”
“Lamento ter de reconhecer que ainda não vencemos a batalha contra os inimigos internos,” disse num discurso transmitido pela televisão, no dia 25 de Março de 2021. “Devemos revisitar as nossas tradições, autenticar a nossa amizade e renovar a nossa solidariedade que já passou pelo teste do tempo.”
A Etiópia é altamente diversa, com mais de 90 grupos étnicos entre os seus mais de 112 milhões de habitantes. Os mais numerosos são os Oromo, Amhara, Somali e Tigrés, que, em conjunto, constituem cerca de três quartos da população.
O país está a enfrentar uma crise que tem as suas raízes na sua Constituição de 1995, que estabelece o federalismo étnico com esperanças da criação de igualdade. Esse sistema de governação, que divide o país em 10 regiões étnicas, foi implementado por uma coligação governamental dirigida pela TPLF, depois de ter ajudado a libertar o país do regime comunista brutal Derg, em 1991.
Os Tigrés mantêm posições de poder no governo, no exército e na economia da Etiópia por aproximadamente três décadas. Durante esse tempo, o ressentimento e as divisões étnicas foram-se agravando.
Actualmente, Tigré é o epicentro de conflitos étnicos e internos abrangentes que alguns temem que podem destruir o segundo país mais populoso de África.
As forças federais fizeram o lançamento de uma operação militar contra a região nortenha, em Novembro último. Esta operação ocorreu depois de os administradores da TPLF terem desafiado o governo central, através da realização de eleições, e as forças de Tigré atacaram uma base militar.
Mais de seis meses depois, milhares de pessoas foram mortas e mais de 1,7 milhões fugiram para regiões próximas e para países vizinhos.
William Davison, um analista etíope que trabalha com o grupo de reflexão denominado Grupo Internacional da Crise, sediado na Bélgica, considera Tigré como o exemplo mais dramático de tensões étnicas e regionais que o país já enfrentou.
“Com a continuação do conflito em Tigré, e muitas pessoas naquele ponto do continente a apoiarem a resistência armada e mesmo a secessão, o desafio permanente para o Primeiro-Ministro é de manter o país em pé em vez de procurar unificá-lo ainda mais,” disse à Reuters.
As disputas étnicas em relação ao poder, à terra e aos recursos transformaram-se em violência pouco antes das eleições nacionais, que já tinham sido adiadas duas vezes.
Os civis de ambos os lados da fronteira, entre Amhara e Oromia, foram atacados, nestes últimos meses, enquanto milícias étnicos ligados aos partidos políticos regionais tentam expulsar outras etnias.
As autoridades afirmam que 36,24 milhões de etíopes já se recensearam para votar nas eleições agora marcadas para o dia 21 de Junho. Sem participar está a região problemática de Tigré, onde Abiy admitiu que o seu exército enfrenta uma luta difícil e cansativa contra os remanescentes da TPLF.
“A junta, que nós tínhamos eliminado em três semanas, agora transformou-se numa força de guerrilha, misturada com agricultores e começou a movimentar-se de um lugar para o outro,” disse num discurso no parlamento, em Abril.
Abiy também prevê uma luta nas eleições que se avizinham. Espera-se que questões de segurança em vários pontos de maior destaque causem atrasos, enquanto os líderes regionais e os homens fortes trabalham para organizar blocos de votação locais.
As eleições podem servir como um referendo para o federalismo étnico ou para a plataforma de unidade do Partido da Prosperidade, num país fracturado, onde rivalidades profundamente repressivas foram dramaticamente expostas.
“Não há dúvidas de que a Etiópia está numa encruzilhada agora,” Kassahun Berhanu, professor de ciências políticas, na Universidade de Adis Abeba, disse ao The Associated Press. “O federalismo étnico não é mau, mas deve ser implementado de uma forma que não exclua a necessidade de sentimento de nação. Porque estes dois não são mutuamente exclusivos.
Os direitos étnicos não podem existir em detrimento do sentimento essencial de pertença comum.”