EQUIPA DA ADF
As batalhas entre os líderes militares rivais do Sudão estenderam-se de Cartum, a capital do país, para Darfur, no final de Abril, provocando preocupações de que um conflito com décadas na região desértica ocidental possa reacender-se.
Darfur atraiu a atenção mundial por volta de 2003, quando um grupo rebelde enfrentou o governo sudanês, alegando que este discriminava os não-árabes.
Liderado pelo então presidente Omar al-Bashir, o governo respondeu, apoiando um grupo de milícias conhecido como Janjaweed, que saqueou e queimou aldeias, poluiu fontes de água e assassinou, torturou e violou civis. O conflito em Darfur causou mais de 300.000 mortos.
Moradores dos arredores de Darfur relataram recentemente confrontos entre as Forças Armadas do Sudão (SAF), lideradas pelo General Abdel Fattah al-Burhan, o governante de facto do Sudão, e as Forças de Apoio Rápido (RSF), lideradas pelo General Mohamed Hamdan Dagalo, conhecido como Hemedti.
Al-Burhan e Hemedti estão ambos ligados ao Darfur. Al-Burhan subiu na hierarquia militar como soldado na região, enquanto Hemedti liderou uma milícia que travou grande parte dos combates do governo durante a guerra de Darfur.
“Seja qual for o rumo da actual batalha por Cartum, esperamos um conflito mais sangrento na região de Darfur — mais grupos armados, mais armas, inimizades mais profundas,” Will Carter, director do Conselho Norueguês para os Refugiados no Sudão, disse à Reuters.
A situação também preocupou Toby Harward, coordenador principal da situação no Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), em Darfur, onde 1,5 milhões de pessoas vivem em campos de refugiados.
“[O ACNUR] está extremamente preocupado com o facto de, se os combates não terminarem imediatamente, poderem desencadear conflitos comunitários que terão um efeito absolutamente devastador no frágil tecido social de Darfur e correm o risco de repetir os conflitos anteriores,” afirmou Harward ao The Guardian.
Os combates entre as SAF e as RSF eclodiram na cidade de El Geneina, no Darfur Ocidental, a 24 de Abril. Segundo testemunhas, combatentes de dois outros grupos rebeldes juntaram-se rapidamente à luta. Durante o dia de violência, os combatentes mataram mais de 70 pessoas, atacaram e saquearam o Hospital Universitário de El Geneina — o principal hospital de referência na região — e destruíram casas e escolas.
“Havia fumo e fogo por todo o lado,” um residente de 39 anos que fugiu da cidade disse à Human Rights Watch.
Alguns observadores receiam que a violência em Darfur possa também atrair combatentes e armas da República Centro-Africana (RCA), do Chade e da Líbia.
O primo de Hemedti, Bichara Issa Djadallah, é conselheiro do Presidente do Chade, Mahmat Idriss Deby, e chefe da força de intervenção conjunta Chade-Sudão que vigia a fronteira de Darfur.
Os residentes do Chade disseram à Al Jazeera que as SAF e as RSF estão a pressionar os não-árabes e os árabes a alinharem com elas, respectivamente.
“Nos próximos dias, dependendo da evolução da situação, poderemos ter mais pessoas no Chade a posicionarem-se num campo ou no outro [em Darfur], independentemente da posição do Estado [chadiano],” Remadji Hoinathy, especialista em assuntos do Chade, no Instituto de Estudos de Segurança, disse à Al Jazeera no início de Maio.
O comandante líbio, General Khalifa Haftar, também tem interesses alinhados com as RSF, segundo Jalel Harchaoui, especialista do Instituto Clingendael, um grupo de reflexão holandês.
Grupos com ligações directas à família de Haftar ganharam controlo sobre as lucrativas rotas de contrabando de drogas, veículos e pessoas na cidade líbia de Kufra, que faz fronteira com Darfur, tornando as RSF um dos principais parceiros comerciais do Exército Nacional Líbio. Isso poderia persuadir Haftar a apoiar Hemedti, disse Harchaoui à Al Jazeera.
“Se fores um bandido e fizeres negócios durante anos e anos com outro bandido, então, vais querer que esse bandido sobreviva, porque queres que o teu negócio sobreviva,” disse Harchaoui.
Embora a RCA tenha mantido a neutralidade durante toda a crise sudanesa, vários grupos armados do país acumularam armas e recrutas de Darfur no passado, de acordo com John Lechner, um perito em assuntos do Grupo Wagner da Rússia de mercenários e grupos rebeldes no Sahel.
“Penso que os grupos armados [da RCA] ficarão, em grande parte, fora do combate efectivo [entre as RSF e as SAF]. Mas, se algumas das comunidades [de Darfur] de onde estes grupos armados da RCA recrutam se envolverem no conflito, então, poderemos ver pessoas a voltar a combater — não necessariamente em nome dos grupos armados — mas de forma individual,” disse Lechner à Al Jazeera.