EQUIPA DA ADF
Otrabalho de fiscal no sector da fauna bravia foi tradicionalmente visto como uma actividade do clube exclusivo dos homens, na África Austral. Por isso, quando a organização sem fins lucrativos internacional, Fundação Internacional para o Combate à Caça Furtiva, criou a equipa de fiscais Akashinga, exclusivamente de mulheres, no Zimbabwe, em 2017, foi recebida com cepticismo.
A fundação é responsável pela gestão da área de conservação de Phundundu, no Zimbabwe, uma área de 30.000 hectares, que alguma vez já foi usada para a caça de troféus. Faz parte do ecossistema do Vale do Zambeze, que perdeu milhares de elefantes para os caçadores furtivos nos passados 20 anos. O Zimbabwe alberga cerca de 85.000 elefantes.
As Akashinga, ou “as corajosas” em Shona, fazem a patrulha de Phundundu, que faz fronteira com 29 comunidades, de acordo com a National Geographic.
Contratar fiscais do sexo feminino foi a ideia do australiano Damien Mander, que vem treinando os fiscais florestais do Zimbabwe há vários anos. Ele concluiu que a preservação dos animais não pode acontecer sem o apoio das comunidades locais. Os fiscais, disse ele, tinham de ser residentes locais.
Mander também acreditava que as mulheres tinham habilidades únicas que fariam delas boas fiscais. Uma destas habilidades era a de serem pacificadoras, o que é de grande importância para acalmar situações violentas.
Mander disse à National Geographic que ele procurou por mulheres que tinham sofrido trauma, porque acredita que estas mulheres teriam mais simpatia e protegeriam mais os animais explorados. As mulheres que ele recrutou incluíam vítimas de violência doméstica, vítimas de abuso sexual, órfãs de SIDA e mulheres cujos maridos as tinham abandonado.
Ele seleccionou a sua primeira equipa, sujeitando as mulheres a três dias de exercícios de treino, enquanto resistiam a condições físicas difíceis. Elas treinavam quando estivessem com fome e cansadas. Começando com 37 recrutas, escolheu 16 para a formação de fiscais; três acabaram por desistir. As mulheres foram formadas em combate corpo a corpo e aprenderam a disparar espingardas.
Quando ele treinou homens sob circunstâncias semelhantes, quase todos desistiram no final do primeiro dia. As mulheres, descobriu ele, eram mais fortes e mais determinadas.
No trabalho, as Akashinga são estritamente vegetarianas, um show de respeito pelos animais que protegem.
No campo, as fiscais dormem em tendas. Quando não estão nas patrulhas e nas incursões, elas estão a treinar ou a praticar. Nas patrulhas, elas têm a obrigação de proteger elefantes, rinocerontes e leões de armas, armadilhas e cianeto.
Uma das mulheres, Petronella Chigumbura, uma mãe solteira, de dois filhos, juntou-se às Akashinga depois de divorciar-se, em 2016, e ter passado por dificuldades para alimentar a sua família. Agora ela é sargento e instrutora-adjunta.
“Como mulher, eu estava focalizada em utilizar as Akashinga como uma ferramenta para lutar pela melhoria das minhas condições de vida,” disse à ELLE.com. “Agora sou capaz de alimentar os meus filhos e pagar as suas propinas escolares. Fiz carta de condução, que é algo muito grande para uma mulher em África. Também estou a construir uma casa grande para os meus filhos. Agora tenho orgulho de ter o meu próprio futuro.”
Esta atitude de colocar a família em primeiro lugar é uma outra razão pela qual as mulheres se têm tornado boas fiscais. Estudos demonstraram que as mulheres trabalhadoras dos países em vias de desenvolvimento investem 90% do seu rendimento nas suas famílias, enquanto os homens investem apenas 35% na família.
“Antes, era comum aceitar que um fiscal fosse sempre um homem, mas depois da introdução do programa das Akashinga, eu queria provar que nenhum emprego é apenas designado para homens,” fiscal Nyaradzo Auxillia Hoto disse à ELLE.com. “A princípio, a minha comunidade não foi capaz de acreditar que uma mulher pudesse ser fiscal. Mas os céus são o limite e as mulheres também são capazes de ser fiscais.”
As mulheres fizeram mais de 200 apreensões nos primeiros três anos da operação, reduzindo a caça furtiva do elefante em 80% nas zonas Baixa e Média do Vale do Zambeze, no Zimbabwe. Se a pandemia da COVID-19 não interferir, Mander espera ter um programa maior para as mulheres. “O conceito já deu o seu arranque, e estamos no processo de formar mais 240 mulheres para cargos a tempo inteiro, enquanto avançamos para o número de 1.000 fiscais e um portfólio de 20 parques até 2025,” disse ao Mymodernmet.com.
EQUIPA LEOA
Uma equipa semelhante faz a patrulha de 147.000 hectares do Parque Nacional de Amboseli, no Quénia. A Equipa Leoa é composta por oito fiscais patrocinadas pelo Fundo Internacional para o Bem-Estar Animal (IFAW). A unidade de patrulha faz parte de um grupo maior, de 76 fiscais, todos provenientes da comunidade local de Maasai.
A sua missão é de acabar com a caça furtiva e o tráfico de carne de caça bem como prevenir o conflito homem-animal.
Em toda a África, a pandemia da COVID-19 paralisou o turismo e deixou muitos programas de conservação da vida selvagem, doados por financiadores, com dificuldades de sobrevivência. Na Tanzânia, muitos fiscais perderam os seus empregos como resultado disso. Isso fez com que houvesse pressão sobre a Equipa Leoa e sobre os outros fiscais da comunidade, porque têm de fazer a patrulha de áreas maiores. O resultado disso foi um maior nível de caça furtiva, quer para a obtenção de lucro assim como para servir de meio para a obtenção de comida.
A Equipa Leoa foi criada em princípios de 2019, depois de a líder da comunidade de Massai, Kiruyan Katamboi, também conhecida por “Mama Esther,” ter desafiado o IFAW a empregar mulheres da comunidade como fiscais, noticiou a CNN. Porque as comunidades Maasai são patriarcais, as mulheres normalmente são excluídas da liderança e do processo de tomada de decisões.
Diferentemente dos Serviços de Protecção da Vida Selvagem do Quénia, que também fazem a patrulha do parque, a Equipa Leoa não possui armas. A equipa tem de confiar na sua formação para lidar com animais perigosos e nas suas habilidades de negociação quando estiver a lidar com pessoas violentas. Os membros da equipa podem pedir apoio aos Serviços de Protecção da Vida Selvagem caso as coisas saiam do seu controlo.
Quando estão em patrulha, elas anotam as localizações e as actividades dos animais e falam com os membros da comunidade local para saberem se ocorreu qualquer actividade fora do comum. Elas procuram por armadilhas e outros sinais de caça furtiva e tiram coordenadas de GPS. Ajudam os animais que se encontram em sofrimento em caso de necessidade.
Uma patrulha típica leva a equipa a percorrer cerca de 20 km para visitar uma comunidade local. Não é incomum que os membros da equipa subam em árvores para evitar animais agressivos.
Todas as oito membros da Equipa Leoa possuem o equivalente a um diploma do ensino secundário geral. A abordagem do IFAW para a segurança da fauna bravia é chamada “tenBoma,” nome atribuído em homenagem a um dito popular da África Oriental, que refere que uma comunidade é mais segura quando 10 casas cuidam umas das outras. O IFAW faz parceria com as equipas de fiscais, os membros da comunidade, a Interpol e outras organizações não-governamentais para reunir e analisar os dados e as informações locais. Os membros da Equipa Leoa são particularmente habilitados para escrever relatórios que são essenciais para a abordagem tenBoma.
Quando a equipa foi formada, uma mulher de cada um dos oito clãs da comunidade foi seleccionada. Elas mesmas tinham algumas dúvidas.
“Antes eu pensava que não seria capaz,” disse Sharon Nankinyi à CNN. “Mas depois de estarmos a treinar, tornarmo-nos mulheres muito fortes. Provámos à comunidade que aquilo que um homem faz, uma mulher pode fazer melhor.”
As fiscais da Equipa Leoa tipicamente ficam três semanas de serviço, momento em que fazem a rotação pelos seis acampamentos do parque e da unidade móvel, e têm uma semana de folga. Os dias de trabalho começam às 5:00 horas da manhã, com uma reunião de informe e uma patrulha matinal que dura cerca de quatro horas em grupos de dois. O resto do dia geralmente é passado na base, atendendo às chamadas de emergência. Para além de ter dormitórios e casas de banho separados, as membros da Equipa Leoa fazem os mesmos trabalhos que os 68 da contraparte masculina.
Durante o confinamento obrigatório da COVID-19, as visitas aos familiares foram menos frequentes; elas passaram quatro meses num determinado ponto sem saírem para casa. Durante uma semana, quando o risco de caçadores furtivos pareceu particularmente grave, a Equipa Leoa subiu para três patrulhas por dia, cobrindo colectivamente mais de 56 quilómetros a pé. O contacto próximo com os aldeões parou por um determinado tempo.
Os confinamentos obrigatórios trouxeram os seus próprios problemas. Assim como disse uma membro da equipa ao The Guardian, “as pessoas estão sentadas, sem nada a fazer, em casa, porque não há emprego, então, podem envolver-se na caça furtiva para obter algo para comer e podem vender a carne de caça para poderem ter dinheiro para comprar alimentos ou satisfazer outras necessidades básicas.”