EQUIPA DA ADF
Ahmed estava a atravessar o Mali numa tentativa de chegar à Europa quando foi apanhado por extremistas e obrigado a trabalhar numa das minas de ouro artesanais do país.
“Estamos aqui há um ano,” disse à Al Jazeera. “O meu irmão está cá há seis meses. Temos segurança e protecção desde que façamos o trabalho.”
A trabalhar ao lado de Ahmed e do seu irmão estão outros adultos e muitas crianças.
O ouro desempenha um papel importante nas economias dos países do Sahel, financiando tanto os governos como os extremistas. Como se tornou associado à corrupção, ao extremismo e à violência, o ouro extraído no Mali e noutros locais ganhou a alcunha de “ouro de sangue.”
O ouro representa mais de 96% das exportações do Mali. Com a sua principal exportação a enfrentar a resistência dos mercados internacionais, os líderes da junta anunciaram recentemente planos para desenvolver uma refinaria de ouro na capital, Bamako, com a ajuda da Rússia.
Os líderes do golpe afirmaram que a refinaria proposta, que poderá processar até 200 toneladas métricas por ano, dará ao Mali um maior controlo sobre a sua produção de ouro e as receitas que produz. Pouco antes de assinar o acordo com a Rússia, a junta aumentou a possível participação do governo no sector mineiro do Mali de 20% para 35%.
O acordo vem na sequência da adesão do Mali aos mercenários russos do Grupo Wagner, no âmbito da luta contra as actividades extremistas nas regiões do norte do país.
O Grupo Wagner chegou ao Mali há dois anos. Desde então, o Grupo Wagner trouxe as suas empresas mineiras associadas para extrair o ouro do país, tanto para si próprio como para apoiar a invasão da Ucrânia pelo Presidente da Rússia, Vladimir Putin. Segundo algumas estimativas, o Grupo Wagner custa ao Mali 10 milhões de dólares por mês.
Os combatentes do Grupo Wagner têm sido associados a execuções sumárias e a outras violações de direitos humanos no Mali, nomeadamente o massacre de centenas de civis durante três dias na comunidade de Moura, em 2022.
O Grupo Wagner e as forças malianas tomaram recentemente o controlo de Kidal, no norte do Mali, um importante centro de extracção de ouro. As forças de manutenção da paz das Nações Unidas deixaram Kidal a 31 de Outubro, depois de a junta no poder ter exigido que a ONU encerrasse a sua missão de manutenção da paz MINUSMA, que durava há uma década.
“Na região de Kidal, o controlo dos campos de ouro desempenha um papel significativo no financiamento dos conflitos e na dinâmica do poder,” os investigadores da Iniciativa Global contra o Crime Transnacional escreveram numa análise de 2022 sobre a exploração do “ouro de sangue” na África Ocidental.
Sendo um dos maiores produtores de ouro de África, o Mali exporta cerca de 9 bilhões de dólares em ouro por ano, sendo que cerca de metade desse valor vai para os Emirados Árabes Unidos (EAU) para ser refinado. Cerca de 15% do ouro do Mali vai para a Suíça, que também refina ouro dos Emirados Árabes Unidos e de outras fontes. O restante das exportações de ouro do Mali está repartido por outros países, incluindo a Austrália, a China e a Turquia, segundo o Observatório da Complexidade Económica.
As agências internacionais começaram a avisar os países e as empresas envolvidas na extracção e refinação do ouro do Mali para fazerem mais para rejeitar o “ouro de sangue” associado ao conflito e ao extremismo.
“As multinacionais que refinam o ouro na Suíça sabem perfeitamente de onde vêm as suas matérias-primas. Estas simplesmente não o dizem,” Marc Ummel, responsável pela política de desenvolvimento no sector das matérias-primas na Swissaid, disse ao site de notícias Swissinfo.