EQUIPA DA ADF
As empresas militares privadas (EMP) chinesas estão cada vez mais presentes em África, onde são frequentemente encarregues de proteger grandes projectos de infra-estruturas ligados à Iniciativa do Cinturão e Rota da China.
A China detém cerca de 10% do sector mundial da segurança privada. As seis a oito EMP chinesas que operam em África concentram os seus esforços sobretudo em países onde a China tem investimentos substanciais em infra-estruturas, como o Quénia. Apesar de se descreverem como privadas, todas as EMP chinesas são controladas pelo Estado e povoadas por antigos membros do Exército de Libertação Popular — uma extensão do princípio do Partido Comunista Chinês de que “o partido controla a arma.”
O líder chinês, Xi Jinping, sugeriu que a presença das EMP em África irá provavelmente aumentar nos próximos anos.
“Reforçaremos a nossa capacidade para garantir a segurança no estrangeiro e proteger os direitos e interesses legítimos dos cidadãos chineses e das entidades jurídicas no estrangeiro,” afirmou Xi no seu discurso no 20.º Congresso Nacional do Partido Comunista da China, em 2022.
Os ataques contra cidadãos chineses em África — nomeadamente o assassinato, ainda por resolver, de nove pessoas numa mina chinesa recém-inaugurada na República Centro-Africana em Março de 2023 — põem em evidência os riscos crescentes para os cidadãos chineses que vivem e trabalham em África.
“Desde o início de 2023, os interesses económicos chineses em África têm sido cada vez mais afectados pela incerteza e insegurança,” Alessandro Arduino, professor afiliado do Instituto Lau China, do King’s College London, disse num webinar organizado pela Universidade de Georgetown. “O número de ataques contra o pessoal e os investimentos chineses está a aumentar.”
Com 23 biliões de dólares investidos em tudo, desde barragens a caminhos-de-ferro e sistemas de água, entre 2007 e 2020, os líderes chineses estão mais propensos a recorrer à segurança para proteger esses investimentos de uma potencial instabilidade, segundo o analista Sergey Sukhankin.
“O crescente envolvimento da China em áreas instáveis e perigosas do ponto de vista da segurança — uma tendência que se tornou particularmente visível depois de Pequim ter lançado a ICR em 2013, que atravessa algumas das áreas mais perigosas do mundo — justifica o reforço da protecção dos bens materiais e dos cidadãos chineses nessas regiões,” Sukhankin escreveu recentemente num artigo para a Fundação Jamestown.
Os observadores afirmam que o esforço da China para expandir a sua rede de EMP em África vai decorrer numa zona cinzenta do ponto de vista jurídico. A legislação nacional chinesa não se aplica às EMP que trabalham no estrangeiro. O direito internacional pode ser difícil de aplicar, o que faz com que as EMP tenham de cumprir a legislação local, tal como ela existe, nos países onde operam.
Nalguns países, como a África do Sul, as leis restringem fortemente as EMP. Noutros locais, por exemplo, em países com golpes de Estado ou conflitos, as EMP operam com mais liberdade.
“As empresas de segurança chinesas em África estão a expandir-se sem um quadro regulamentar forte,” Habib al-Badawi, professor da Universidade Libanesa, escreveu recentemente no LinkedIn. “Esta situação acarreta riscos como a falta de transparência, a fragilidade dos controlos nacionais e a influência indevida sobre as elites do regime.”
De acordo com a legislação chinesa, a maioria das EMP está proibida de utilizar armas. Consequentemente, muitos empregam milícias ou empresas de segurança locais como armas de aluguer, um cenário que pode resultar em violações de direitos humanos.
Isso já aconteceu nos últimos anos, quando as EMP chinesas estiveram envolvidas em tiroteios e outros incidentes no Quénia, Uganda, Zâmbia e Zimbabwe.
À medida que a China expande as suas EMP em África, os especialistas dizem que enfrenta a questão de saber se deve mudar a forma como as EMP funcionam. Deverá, por exemplo, permitir que os seus membros andem armados ou trabalhem directamente com organizações como o Grupo Wagner da Rússia?
“No meio da violência crescente no estrangeiro e das perturbações industriais no país, será mais difícil para o sector chinês da segurança privada continuar a manter-se discreto,” Arduino escreveu recentemente para o War on the Rocks.
As EMP chinesas têm potencial para preencher as lacunas criadas pelo facto de a Rússia ter reequipado as operações africanas do Grupo Wagner após a morte de Yevgeny Prigozhin. Segundo al-Badawi, a expansão da presença militar da China em África pode potencialmente remodelar o panorama da segurança africana.
“As [empresas militares privadas] da China podem ter implicações significativas para o futuro das relações China-África, bem como para a dinâmica de segurança regional e global,” escreveram recentemente os investigadores do site Military Africa. “Resta saber se são uma ameaça crescente ou um parceiro estratégico.”