EQUIPA DA ADF
A detenção de um agente político obscuro no Chade está a lançar luz sobre os esforços da Rússia para interferir nos assuntos internos dos países africanos.
No dia 19 de Setembro de 2024, Maxim Shugaley foi detido no aeroporto de N’Djamena, juntamente com dois colegas russos e um bielorrusso. Shugaley é uma figura notória e global cuja organização, “Fundação para a Defesa dos Valores Nacionais,” tem laços estreitos com o Grupo Wagner de mercenários russos e o seu falecido fundador, Yevgeny Prigozhin. Foi liberto pelas autoridades chadianas ao fim de seis dias e regressou agora à Rússia.
Nos últimos anos, Shugaley foi visto em países como República Centro-Africana (RCA), Madagáscar, Mali, Sudão e Líbia, onde passou 18 meses na prisão. Anteriormente, fez parte da “troll farm” russa conhecida como Internet Research Agency e viajou muito, espalhando propaganda pró-russa, oferecendo subornos a funcionários públicos e tentando interferir nas eleições em nome dos candidatos preferidos da Rússia.
Identifica-se como sociólogo, mas os observadores dizem que o seu verdadeiro objectivo é alargar a influência russa. O site de notícias da RCA, Corbeau News, relata que ele tende a aparecer nos países por altura das eleições sob o pretexto de ser um observador eleitoral ou de realizar sondagens de opinião, mas mal esconde a sua agenda pró-Rússia.
“A presença de Shugaley no Chade faz parte de uma estratégia mais vasta de influência russa em África, através das actividades do Grupo Wagner,” Alain Nzilo, editor do Corbeau, disse à ADF. “Na verdade, há vários anos que a Rússia tenta estabelecer a sua influência no Chade, mas o país continua a hesitar em envolver-se formalmente.”
A sua história em África é duvidosa. Em 2018, terá oferecido dinheiro a pelo menos seis candidatos a cargos públicos em Madagáscar, incluindo um suborno de 2 milhões de dólares a um antigo primeiro-ministro. Em 2019, foi para a Líbia e trabalhou para Saif al-Islam Kadhafi, o filho do falecido ditador Muammar Kadhafi, na sua tentativa de conquistar o poder. Shugaley e o seu tradutor foram detidos por interferência eleitoral. Em 2021, chegou à RCA e divulgou sondagens que mostravam um apoio esmagador à Rússia e ao presidente da RCA. Exibiu um filme, “Touriste,” que glorificava as acções do Grupo Wagner e amplificava as mensagens anti-Ocidente. O próprio Shugaley é objecto de um filme de propaganda em duas partes que o retrata como uma figura do tipo James Bond.
Os observadores dizem que o seu padrão é familiar.
“As suas operações de comunicação em África utilizam tácticas semelhantes,” refere o Corbeau. “A partilha repetida de histórias russas em plataformas online, a apropriação de questões sociais e culturais locais, a utilização de vozes locais, a criação artificial de divisões políticas, a amplificação de conspirações e o financiamento de organizações não-governamentais parceiras que transmitem esta comunicação.”
Antes da sua detenção, Shugaley fez duas viagens ao Chade por altura das eleições de 6 de Maio de 2024 e foi fotografado com um chapéu de campanha com uma fotografia do Presidente Mahamat Deby Itno. Não se sabe como é que ele entrou em conflito com as autoridades na terceira viagem, durante a qual estava prevista a sua participação num evento na Russia House, um centro cultural que apoia os interesses russos.
O Chade é um dos poucos países do Sahel que não autorizou a actuação de mercenários russos no seu território.
“O interesse particular dos russos pelo Chade explica-se pela sua posição estratégica,” afirmou Nzilo. “É uma grande potência militar em África, mas também um país produtor de petróleo. Uma aproximação do Chade à Rússia teria repercussões importantes no equilíbrio militar regional. No entanto, as tentativas de aproximação foram em vão até à data e o Chade mantém a sua posição independente.”
Alguns acreditam que a detenção de Shugaley é um sinal de que as nações africanas estão a ficar cansadas da ingerência russa.
“As acções do Chade assinalam uma potencial mudança na forma como as nações africanas encaram e respondem à presença de grupos paramilitares como o Grupo Wagner,” noticiou o The Rio Times. “O caso [Shugaley] pode marcar um ponto de viragem nas operações africanas do Grupo Wagner. Pode levar a um maior escrutínio das actividades do grupo e a uma reavaliação do seu papel na definição do panorama político e económico do continente.”