EQUIPA DA ADF
Dezenas de milhares de residentes fugiram de Bunagana, no leste da República Democrática do Congo (RDC), quando os rebeldes do M23 tomaram a cidade, em Junho.
“Eles estão em todo o lado, as ruas estão cheias, outros foram para as igrejas, estão debaixo das árvores, em toda a parte,” comissário de distrito ugandês, Shaffiq Sekandi, disse à Reuters, referindo-se aos refugiados. “É realmente uma situação de desespero.”
Bunagana, um grande centro comercial na fronteira com o Uganda, continua nas mãos do M23, meses depois.
Os rebeldes, cujo nome foi atribuído depois do fracasso da assinatura de um acordo de paz, no dia 23 de Março de 2009, surgiram dos grupos rebeldes congoleses que se formaram na década de 1990, quando refugiados e perpetradores do genocídio do Ruanda atravessaram a fronteira e causaram conflitos regionais na RDC.
Depois de permanecer no silêncio por aproximadamente uma década, o reaparecimento do M23 constitui apenas a mais recente crise nas províncias do leste da RDC, que já registaram conflitos constantes durante décadas.
A nova ofensiva começou quando as forças congolesas e ugandesas colaboraram em centenas de quilómetros a norte, para repelir o grupo terrorista das Forças Democráticas Aliadas, que possui ligações com o grupo do Estado Islâmico.
Com aqueles militares tomados, o M23 refugiou-se num vazio de segurança, na região montanhosa de florestas densas e onde convergem as fronteiras da RDC, Uganda e Ruanda.
Especialistas acreditam que o M23 espera forçar negociações para entrar no novo programa de desarmamento, desmobilização e reintegração (DDR) do governo, que foi oferecido a dezenas de milícias que desestabilizam a região há anos.
Contudo, a RDC excluiu o M23 e as Forças Democráticas Aliadas do programa de DDR, designando ambos de grupos terroristas.
“Quando um novo programa de DDR foi anunciado, era uma oportunidade para o M23 fazer pressão para a sua agenda,” Director do Grupo de Pesquisa do Congo, Jason Stearns, disse à The New Humanitarian.
Stearns disse que os relatórios do campo e as análises do poder de fogo dos rebeldes “sugerem que é muito provável” que o Ruanda esteja a apoiar a ofensiva do M23.
No fim de Junho, a enviada especial das Nações Unidas para a RDC, Bintou Keita, disse ao Conselho de Segurança que “durante as mais recentes hostilidades, o M23 comportou-se cada vez mais como um exército convencional do que um grupo armado.”
Cidadãos ruandeses trajados de uniformes militares foram vistos entre as fileiras do M23.
“O M23 possui armamento e equipamento cada vez mais sofisticado, especificamente em termos de capacidade de tiro de longo alcance, morteiros e metralhadoras assim como armas de precisão contra aeronaves,” referiu.
“A ameaça que isso representa para os civis e para a MONUSCO [a missão de manutenção da Paz da ONU na RDC], que tem um mandato de os proteger, é evidente.”
A ONU acusou o Ruanda e o Uganda de apoiar o M23. Ambos países recusaram várias vezes o seu envolvimento com o grupo rebelde.
Desde 1998, mais de 5,4 milhões de pessoas na região morreram como resultado das numerosas guerras e conflitos. Actualmente, existem aproximadamente 6 milhões de deslocados internos na RDC, de acordo com a ONU.
O leste da RDC está repleto de riquezas minerais que as milícias, os grupos rebeldes e os países vizinhos procuram extrair.
Mas no centro da violência estão as tensões étnicas explosivas.
Um analista político independente do Ruanda, Gatete Nyiringabo Ruhumuliza, disse que o povo conhecido como os “Banyarwanda” encontra-se no centro do conflito no leste da RDC por aproximadamente três décadas.
A palavra Banyarwanda significa “povo de Ruanda” e, muitas vezes, refere-se aos ruandeses que emigraram para a província do Kivu do Norte da RDC, entre os finais da Primeira Guerra Mundial e 1960.
“Os do Kivu do Sul são habitualmente conhecidos como Banyamulenge,” Ruhumuliza escreveu no artigo de Agosto de 2022, no jornal queniano The East African. “‘Banya’ que significa ‘povo de,’ eles simplesmente assumiram os nomes das suas localidades.
“Enquanto a maioria dos Banya nestes lugares se identifica como Hutu, os que se identificam como Tutsi — a minoria — tiveram dificuldades de ser aceites. Como resultado, ‘Banyarwanda,’ muitas vezes, é usado para excluir os Tutsi.”
Ambas etnias encontram-se no leste da RDC há mais de um século, mas por vezes foram perseguidas e entendidas como forasteiras.
Mais de 1 milhão de refugiados fugiram do genocídio de Ruanda em 1994, incluindo centenas de milhares de Hutus. Muitos assassinos genocidas estiveram entre eles.
Actualmente, as batalhas étnicas continuam no leste da RDC.
O M23 é composto principalmente por Tutsis, embora muitos deles se oponham ao grupo rebelde na região.
Quer os membros do M23 operem como um representante de interesses estrangeiros ou simplemente procurem cidadania e amnistia na RDC, os rebeldes insistem que não se irão embora.
“Iremos continuar e esperar pela implementação de um acordo que fizemos com o governo,” Willy Ngoma, porta-voz do grupo, disse à BBC, no dia 18 de Agosto. “Se desejarem reiniciar as conversações, estamos prontos.
“Mas se nos atacarem de novo, iremos nos defender.”