EQUIPA DA ADF
Nos últimos meses, o namoro da Rússia com o Burquina Faso incluiu 25.000 toneladas de trigo grátis, um acordo para a construção de uma central nuclear, um destacamento de segurança pessoal para o líder da junta, o Capitão Ibrahim Traoré, e agora 100 combatentes paramilitares.
Mas os peritos alertam para o facto de o antigo grupo mercenário, Grupo Wagner, agora conhecido como Africa Corps, ter um historial de assassínio indiscriminado de civis e de pilhagem de recursos naturais dos países que o acolhem.
“Os russos estão a perseguir e a defender os seus próprios interesses nacionais,” Louis Gitinywa, analista político do Ruanda, disse à Agência Anadolu. “Não importa o que eles estão a pôr em cima da mesa. … O continente africano não pode depender de potências estrangeiras para manter a segurança nacional.”
O contingente de militares russos chegou com armas e equipamento à capital, Ouagadougou, a 24 de Janeiro. O destacamento foi anunciado no canal do Africa Corps do aplicativo de mensagens Telegram, que afirma estar afiliado ao Ministério da Defesa da Rússia.
“Um contingente russo de 100 pessoas irá garantir a segurança do líder do país, Ibrahim Traoré, e do povo burquinabê contra ataques terroristas,” lê-se no comunicado. “Num futuro próximo, as unidades serão reabastecidas com mais 200 militares da Rússia.”
Os “especialistas militares” irão treinar as forças burquinabês e patrulhar as zonas perigosas, de acordo com uma declaração no Telegram da The Africa Initiative, uma agência de notícias pró-Rússia.
O Africa Corps é uma reedição do infame Grupo Wagner, que tem sido perseguido por acusações e provas credíveis de massacres, violações, torturas, roubos e contrabando em todo o continente.
A revista Foreign Policy informou que o Ministério da Defesa da Rússia “tem estado, desde há alguns meses, a subsumir as operações do Grupo Wagner no Mali, na Líbia e, em menor grau, na República Centro-Africana.”
“A mudança de Grupo Wagner para Africa Corps marca também uma nova fase na exportação russa de segurança para África,” referiu a revista a 7 de Fevereiro. “O Africa Corps distingue-se do Grupo Wagner principalmente pelo seu estatuto oficial de governo.
“Com esta mudança, as intervenções da Rússia no continente estão a sair das sombras da iniciativa privada e a passar para a ribalta do projecto oficial do Estado.”
Desde que a junta do Burquina Faso assumiu o poder em Setembro de 2022, não conseguiu restaurar a segurança dos civis que enfrentam uma insurgência sangrenta de vários grupos de militantes extremistas que controlam grandes áreas do país.
Traoré e o seu governo de transição têm tentado reforçar as forças armadas burquinabês, recrutando civis para a controversa milícia Voluntários para a Defesa da Pátria, por vezes, através de recrutamento forçado.
Necessitando da sua própria protecção, Traoré voltou-se para a Rússia desde a detenção, em Setembro de 2023, de vários militares burquinabês acusados de conspirar um golpe de Estado.
“Desde este incidente, eles estão muito preocupados com a sua segurança e estão convencidos de que o seu aparelho de segurança precisa de ser reforçado,” disse uma fonte regional altamente colocada à revista The Africa Report.
“Foi criada uma pequena equipa no palácio para proteger o presidente, liderada pelo seu irmão e conselheiro especial, Inoussa Traoré,” acrescentou uma fonte de segurança. “Eles desconfiam de todos.”
Durante décadas, a França, antiga potência colonial, forneceu formação e assistência em matéria de segurança ao Burquina Faso. Tal como no Mali e no Níger, as campanhas de propaganda russas ajudaram a persuadir os líderes da junta a expulsar as forças francesas. Essas funções de segurança estão agora a ser desempenhadas por uma potência neocolonial, a Rússia.
“As intervenções dos serviços russos, seja no Níger, no Mali ou no Burquina Faso, têm como objectivo principal a protecção dos regimes e, em menor grau, a luta contra os jihadistas,” o analista militar francês, General Dominique Trinquand, disse à Deutsche Welle.
Freddie Egesa, um analista de segurança baseado na capital do Uganda, Kampala, disse que, tal como o Grupo Wagner antes dele, os interesses do Africa Corps no continente são financeiros e políticos.
“A Rússia está interessada em manter a influência estrangeira através de intervenções militares, o que também serve para salvaguardar os seus interesses comerciais,” disse à Agência Anadolu.
Entre 2018 e 2022, 40% das importações de armas de África foram provenientes da Rússia, de acordo com o Instituto Internacional de Investigação da Paz de Estocolmo. Um relatório de 2022 do grupo de reflexão Rand Corp. afirma que “as vendas e transferências de armas russas para países africanos nos últimos anos aumentaram de aproximadamente 500 milhões de dólares para mais de 2 bilhões de dólares por ano.”
Gitinywa não acredita que a Rússia se importe verdadeiramente com África.
“Seria ingénuo pensar que a Rússia tem uma preocupação muito legítima com África, com o seu povo ou com o seu desenvolvimento,” afirmou. “A única parceria fiável é a de países africanos a tentar caminhar de mãos dadas para promover os nossos interesses nacionais.”