EQUIPA DA ADF
No final de 2021, as autoridades do Estado de Borno, na Nigéria, começaram a registar “multidões” de desertores de dois grupos extremistas concorrentes. Os desertores pertenciam ao Boko Haram e à Província da África Ocidental do Estado Islâmico, também conhecida como ISWAP.
“Vários intervenientes no Estado de Borno concordaram em aceitar e perdoar os primeiros 3.900 combatentes do Boko Haram arrependidos que se renderam às tropas,” noticiou o jornal nigeriano Blueprint. Um brigadeiro-general reformado, Abdullah Sabi Ishaq, disse que as deserções foram resultado da utilização do “Modelo de Borno,” que começa com “o recurso ao diálogo” para persuadir os combatentes do Boko Haram e da ISWAP “a fim de deporem as armas às tropas nos vários centros de recepção e a abraçarem a paz.” As autoridades dizem que o modelo se baseia fortemente em técnicas de reabilitação, reconciliação e reintegração.
Actualmente, as autoridades da Nigéria e da Bacia do Lago Chade estão a utilizar técnicas adicionais para promover as deserções, incluindo a desmobilização dos apoiantes do terrorismo e o reforço da protecção das vítimas.
A ISWAP remonta a 2002, altura em que Muhammed Yusuf fundou o Boko Haram, um movimento islâmico no nordeste da Nigéria. Tomás F. Husted, analista de assuntos africanos, afirma que, nos últimos anos, a ISWAP, um ramo afiliado ao EI, “estabeleceu-se como a facção mais forte e um dos afiliados mais activos do EI a nível mundial.” O conflito na Bacia do Lago Chade matou dezenas de milhares de pessoas, deslocou milhões e “alimentou uma vasta crise humanitária,” segundo Husted.
Actualmente, a ISWAP luta contra um grupo extremista rival, o Jama’tu Ahlis Sunna Lidda’awati wal-Jihad, ou JAS, tanto como contra as forças governamentais. O Grupo Internacional de Crise informou em Março que, desde 2021, os antigos membros de ambas as facções perderam mais efectivos em combates entre si do que em confrontos com as forças armadas do Estado.
Embora fazer com que os combatentes desertem seja uma ferramenta fundamental para erradicar o extremismo violento, um estudo de 2020 publicado pela revista Frontiers in Psychology observou que “existe um consenso de que a erradicação do extremismo violento requer um investimento a longo prazo em intervenções estruturais, complexas e multifacetadas, desde a educação ao desenvolvimento social e económico.” O estudo refere que são também necessárias estratégias a curto prazo para ajudar a prevenir ou combater o extremismo violento “em períodos de tempo mais imediatos.” Essas estratégias incluem a utilização de contranarrativas que desafiem a propaganda dos grupos extremistas.
As contranarrativas podem centrar-se nas atrocidades cometidas por esses grupos e realçar os verdadeiros ensinamentos do Islão, que promove a paz e a compaixão. Os melhores transmissores de tais mensagens são os líderes religiosos locais e os antigos extremistas; ambos os grupos são amplamente considerados credíveis. Os especialistas dizem, no entanto, que essas contranarrativas devem cumprir “padrões rigorosos” em termos de exactidão e de provas. O estudo da revista de 2020 observou que as contranarrativas inexactas correm o risco de “sair pela culatra e acelerar uma maior radicalização.”
Desertar de um grupo extremista é sempre perigoso; as deserções da ISWAP são especialmente perigosas. O Instituto de Estudos de Segurança informou que, quando os combatentes da ISWAP desertam para “o lado do governo,” quase não há regresso à ISWAP “porque correm o risco de serem executados sob acusação de espionagem.”
“As abordagens do governo devem continuar a encorajar a deserção,” informou o instituto. “Mas também devem ir além da dependência de comandantes e combatentes descontentes. São necessárias estratégias que combatam o grupo em várias frentes, incluindo a interrupção do seu financiamento, o bloqueio das vias utilizadas para o recrutamento e a circulação e um plano claro e prático que possa ser apoiado por aqueles que desertam da ISWAP.”
O portal de informação humanitária ReliefWeb afirma que, durante este período crítico na Bacia do Lago Chade, as autoridades devem “melhorar e expandir os programas de apoio aos desertores.” Mas o grupo afirmou que as autoridades regionais e os parceiros externos devem continuar a tomar medidas para ajudar também os civis: “Devem alargar a assistência humanitária, em vez de a eliminarem gradualmente, desenvolvendo, ao mesmo tempo, melhores protocolos de selecção de alvos para evitar vítimas civis em ataques aéreos.”